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Trabalho escravo se reproduz com a impunidade

Quase metade dos empregadores flagrados pelo Ministério do Trabalho entre 2003 e 2007 não responde pelo crime na Justiça. Ninguém cumpre pena por esse tipo de exploração no país.
Último país das Américas a abolir a escravatura, em 1888, o Brasil ainda se recusa a mandar para a cadeia quem mantém trabalhadores em condições análogas à de escravo em pleno século XXI.

Levantamento exclusivo feito pelo Congresso em Foco mostra que quase a metade dos 645 empregadores incluídos na chamada "lista suja" do trabalho escravo, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), entre 2003 e 2007, ainda não responde pelo crime na Justiça. Revela mais: mesmo quando o julgamento resulta em condenação, há sempre uma maneira de evitar a prisão. Resultado: ninguém cumpre pena por esse tipo de crime no país.

O número de processos sem conclusão poderia ser ainda bem maior. Os 343 empregadores flagrados pelo Ministério do Trabalho que viraram alvo da Justiça Federal no período pesquisado são acusados de manter 9.812 trabalhadores rurais em condições análogas às de escravo. Número inferior aos 12.035 libertados das mãos de 302 pessoas físicas e jurídicas notificadas pelo Grupo Móvel sobre as quais não há registro de qualquer denúncia. Em outras palavras, 46% dos empregadores incluídos na "lista suja" não responderam a qualquer processo penal pelo crime até agora.

Os indicadores da impunidade não param por aí. As informações levantadas pelo site foram confrontadas com balanço publicado em 2009 pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) sobre a atuação do Ministério Público Federal (MPF) em relação ao trabalho escravo.

Dois dados do levantamento chamam a atenção para a falta de controle e de comunicação entre as ações do Grupo Móvel e a atuação do MPF, encarregado de ajuizar ações criminais contra os empregadores flagrados explorando o trabalho escravo: não há informação sobre o andamento de qualquer medida em relação a 108 empregadores, e em outras 63 ocorrências não há sequer citação dos donos das fazendas ou empresas rurais no documento da PFDC.

No momento, 93 empregadores flagrados pela fiscalização do governo federal ainda estão sendo investigados por procedimentos administrativos no MPF, segundo a PFDC. Ainda de acordo com o órgão, 38 denúncias foram arquivadas por não ter sido caracterizada a prática de redução a condição análoga à de escravo.

Tendência à prescrição

A lentidão nos processos que já estão tramitando na Justiça e sobre os que ainda não foram propostos pelo MPF pode ser agravada e aumentar a tendência da prescrição. Pela segunda vez, o STF discute se a competência para julgar estes casos é da Justiça Federal ou da Justiça Estadual. Em nota enviada ao site, o MTE, pasta à qual o Grupo Móvel está subordinado, afirma que o "suposto conflito de competência com a Justiça Estadual sem dúvida atrasou muito a propositura das ações".

Fonte: Projeto de Combate ao Trabalho Escravo, escritório da OIT no Brasil