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Pré-sal: após tragédia no Golfo, Brasil faz plano de contingência

O vazamento de óleo no poço da British Petroleum (BP) no Golfo do México, nos Estados Unidos — que completou três meses até ser parcialmente contido — provocará mudanças profundas nos sistemas de segurança utilizados pela indústria de petróleo no mundo todo. No Brasil, segundo o diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima, as mudanças já começaram.

Haroldo Lima - Ricardo Tristão

Em parceria com o Ibama e a Marinha, a ANP começou a elaborar o primeiro plano nacional de contingência para conter vazamentos de petróleo em alto mar, como nos campos do pré-sal. A Petrobras tem como regra elaborar programas de contingência para cada uma das plataformas — mas agora o governo adotará um plano em nível nacional, com a atuação conjunta dos órgãos fiscalizadores e do meio ambiente.

Apesar de afirmar que os sistemas de segurança adotados no país, assim como sua fiscalização, estão entre os mais avançados do mundo, Haroldo afirma, em entrevista a O Globo, que esses sistemas certamente deverão ser aperfeiçoados devido ao vazamento no Golfo. Mas alerta que o Brasil deve acelerar os projetos de exploração de petróleo no pré-sal e também no pós-sal — com o risco de a matéria-prima perder valor no futuro próximo com o maior uso de fontes alternativas de energia, acelerado pelo acidente nos Estados Unidos.

Haroldo também se declarou um defensor não só da aceleração da produção de óleo no pré-sal, como no pós-sal e também nas bacias terrestres para permitir o desenvolvimento do país e ajudar na redução da pobreza e da desigualdade. “Temos que nos adiantar para evitar que a gente fique com um mico.”

O Globo: Devido ao acidente no Golfo do México, até países como o Brasil deverão realizar mudanças em seus sistemas de segurança?
Haroldo Lima: Sim. Mesmo países como o Brasil e a Noruega, que têm segurança operacional moderna, vão ter que se adaptar. Certamente será necessária a adoção de novas medidas de segurança, e a nossa fiscalização também vai aumentar.

O Globo: Como o senhor responde às acusações de que a ANP estaria sendo omissa no caso do acidente no Golfo do México?
Haroldo: Não é verdade. Pelo contrário. Nós tomamos iniciativas imediatas. No dia seguinte ao acidente da BP já começamos a fazer uma avaliação do ocorrido e solicitamos relatórios de operação de todas as empresas petrolíferas que atuam no Brasil.

O Globo: Devido ao megavazamento de óleo da BP , o que acabou levando algumas empresas a adiarem novos projetos de exploração, o senhor acredita que o petróleo poderá vir a perder espaço para outras fontes energéticas no mundo?
Haroldo: Com a decisão de suspender a exploração de petróleo na costa leste americana, os Estados Unidos estão se privando de explorar reservas de petróleo que variam entre 30 bilhões a 50 bilhões de barris de óleo. Para não se tornarem ainda mais dependentes da importação de petróleo, principalmente do Oriente Médio, acredito que os Estados Unidos vão acabar sendo obrigados a investir fortemente em combustíveis alternativos.

O Globo: O senhor acredita que o temor de novos acidentes poderia colocar em risco, aqui no Brasil, à exploração do petróleo na camada do pré-sal?
Haroldo: As energias alternativas podem tornar mais dispensável o petróleo que temos aqui. Por isso temos que correr um pouco atrás desse nosso petróleo. Temos que nos adiantar para evitar que a gente fique com um mico.

O Globo: Mas o Brasil não estaria indo na contramão do mundo, já que, lá fora, estão reduzindo o ritmo no lugar de acelerarem à exploração do petróleo?
Haroldo: Temos maior experiência do que eles. Temos o maior número de sondas de perfuração em operação. Não vamos nos igualar a todos que estão tendo dificuldades. Esse pessoal da Europa não tem a experiência que nós temos, com exceção da Noruega. No pré-sal, por exemplo, já perfuramos 80 poços e, em nenhum deles, ocorreu acidentes. Não vamos sentar nos louros. Temos que aumentar ainda mais nossa segurança, mas sem interromper à atividade de produção.

O Globo: O senhor acredito que o custo de exploração do petróleo vai aumentar?
Haroldo: É possível que sim, mas será um aumento pequeno se comparado com o potencial de ganhos.

O Globo: A ANP planeja aumentar à fiscalização na operação das plataformas?
Haroldo: Certamente. No ano passado, tivemos uma média de 80 semanas com nossos engenheiros embarcados em plataformas. E o trabalho vai aumentar com a participação da certificadora internacional Bureau Veritas.

O Globo: Como o Brasil não tem um programa para conter vazamentos em alto mar, nos campos do pré-sal, o que será feito em caso de um acidente?
Haroldo: A ANP, o Ibama e a Marinha estão estudando a criação de um Plano Nacional de Contingência nas atividades exploratórias de petróleo no mar. Atualmente, somente a Petrobras faz seus próprios planos de contingência, que são exigidos pela ANP como pré-requisito para conceder a autorização de operação das plataformas.

O Globo: Qual dos três órgãos será o coordenador do Plano Nacional de Contingência?
Haroldo: A gente acha que deveria ser a Marinha. O Ministério do Meio Ambiente está fazendo os estudos para ver como será feito o plano e quem vai coordenar.

O Globo: Então o Brasil não deve interromper a exploração de novos campos de petróleo por conta do vazamento no Golfo do México?
Haroldo: Nenhum país do mundo atingiu a área do pré-sal como o Brasil. Nós fizemos 80 poços no pré-sal. Temos que redobrar nossos cuidados e a fiscalização. E vamos tirar proveito de estarmos na frente. Não é porque os países lá fora estão passando por dificuldades, que nos, aqui no Brasil, temos que parar nossa produção.

O Globo: A exploração no pós-sal também deve ser acelerada no Brasil?
Haroldo: O Brasil não se resume ao pré-sal. Podemos estar correndo o risco de ficarmos um pouco ofuscados pelo brilho do pré-sal. O resto do Brasil não tem pré-sal, mas precisa se desenvolver áreas, como a margem equatorial brasileira, que incluí as regiões Norte e Nordeste.

Temos oportunidades nestas áreas de desenvolver pequenas e médias empresas de petróleo, como na Bacia do Parnaíba, por exemplo, na parte terrestre dos estados do Maranhão e Piauí). O Brasil precisa aproveitar essa riqueza para melhorar as condições de vida e reduzir a desigualdade social da população local.

Fonte: O Globo