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Israel mantém decisão de deportar menores 

O governo do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, não se comove com os pedidos para que reverta a decisão de deportar centenas de crianças, descendentes de imigrantes.

Por Jerrold Kessel e Pierre Klochendler, na agência IPS 

Nesta terça-feira (31), vencia o prazo para que deixassem o país com seus pais, de forma voluntária. Milhares de israelenses protestaram, no dia 28, para que as autoridades revogassem a decisão.

“Devem ter o direito de ficar, é um imperativo moral”, disse o legislador Dov Henin, de esquerda, à multidão reunida. O governo de Netanyahu decidiu, no começo de agosto, que 800 menores poderiam ficar e 400 deveriam deixar o país. Israel está lidando com o mesmo problema que têm os países do Norte. Nascer em um Estado implica cidadania?

O direito a ser cidadão por ter nascido em um território remonta ao direito anglo-saxão do Século 17. Em muitos países ocidentais, com grandes minorias de imigrantes – com ou sem documento em ordem – os que colocam em prática a norma são atacados por nacionalistas que avivam o ódio e a intolerância em relação “ao outro”.

Desde o começo dos anos 90, quando a maioria dos palestinos foi proibida de trabalhar em Israel, os sucessivos governos incentivaram a imigração de trabalhadores da construção, agricultura e serviço doméstico. Alguns deles, procedentes da África e sudeste da Ásia, tiveram o visto vencido, mas continuaram trabalhando sem documentos em dia e formaram uma família no país.

São mais de 200 mil trabalhadores imigrantes em Israel, mais da metade sem documentos, segundo fontes do Ministério do Interior. Neste país, 1.200 crianças nasceram de pais estrangeiros. A sorte desses menores gerou acaloradas discussões no último ano. Há duas semanas, o governo anunciou que poderiam ficar 800 meninas e meninos que vivem há mais de cinco anos em Israel, falam hebreu e vão à escola.

As outras 400 crianças, a maioria menor de cinco anos, só poderiam ficar até o final de agosto, e depois partir com os pais de forma voluntária, do contrário seriam expulsos e repatriados aos países de origem dos mais velhos. “Por um lado, é um problema humanitário. Todos sentimos e compreendemos as crianças. Por outro, há considerações sionistas. Devemos garantir o caráter judeu do Estado de Israel”, disse Netanyahu aos membros do gabinete.

O primeiro-ministro os considera “ameaça demográfica”, e diz que “não queremos criar um incentivo para a chegada de centenas de milhares de trabalhadores sem documentos”. Vários atores inesperados criticam Netanyahu, como sua própria esposa, Sarah, a de seu antecessor, Aliza Olmert, e o presidente de Israel, Shimon Peres.

“Como mãe de dois filhos e psicóloga do serviço público, peço do mais fundo do meu coração que use sua autoridade para permitir que a maioria dos 400 menores permaneça em Israel”, escreveu Sarah Netanyahu em carta enviada do ministro do Interior, Eli Yishai, aliado fundamental na coalizão do primeiro-ministro e promotor da campanha de expulsão.

“Muito antes da decisão conversei com meu marido, o primeiro-ministro, e disse que o Estado de Israel deveria encontrar uma solução. Quero crer que de alguma forma serviu para que 800 crianças pudessem ficar”, disse. “Confio que no contexto da resolução do governo e de seus poderes como ministro possa encontrar uma solução criativa que não prejudique a política de imigração nem os interesses nacionais de Israel enquanto Estado judeu”, acrescentou.

Uma coalizão de organizações integradas por sobreviventes do Holocausto expressou repugnância pela decisão do governo. “O Estado de Israel se funda na consciência e no coração judeus. Nós que sobrevivemos ao Holocausto estamos agoniados por um sentimento de asfixia e vergonha”, diz a carta enviada ao primeiro-ministro.

O legislador esquerdista Ilan Gilon disse à multidão reunida no dia 28 para protestar contra a expulsão que, ocorrendo a deportação, estaria disposto a escondê-los das autoridades de imigração e de sua unidade especial Oz, que persegue os trabalhadores ilegais.

“Esta decisão é uma cicatriz moral em nossa sociedade”, disse Aliza Olmert em entrevista à rádio do Exército israelense. “Se o governo seguir adiante com isto, dará munição para os que na comunidade internacional aguardam para nos armar uma emboscada”, acrescentou. A esposa do ex-primeiro-ministro fez pouco do argumento de que a permanência dos menores incentivará a chegada de mais imigrantes e acelerará a transformação de Israel.

“Esses estrangeiros chegaram a Israel, alguns de forma ilegal, tiveram filhos ilegais”, disse Eli Yishai, membro do partido ultraortodoxo Shas. Em outra oportunidade acusou os imigrantes de usarem seus filhos como “escudos humanos” e de “trazerem doenças como tuberculose, hepatite e aids”. “Seus argumentos não passam de demagogia barata e satanização primitiva”, respondeu Aliza Olmert, ao ser consultada sobre o caráter racista das intenções de Eli Yishai.

“É impensável que 400 crianças nascidas em Israel, que se sentem israelenses e vivem como outros menores israelenses sejam expulsas”, disse, enérgico, Shimon Peres. O presidente pediu urgência ao governo e que reconsidere sua decisão porque “a deportação prejudicará Israel e a fibra moral do país”. Peres, prêmio Nobel da Paz, tem autoridade moral dentro e fora de Israel. Mas o governo israelense ignora seu pedido.

Os propósitos racistas de Eli Yishai não impressionam Maria, de oito anos, que nasceu em Tel Aviv. Sua mãe filipina veio para este país cuidar de um casal de idosos israelenses. “Fico aqui, este é meu lar”, disse em perfeito hebreu, segurando a mão da sua mãe, depois da manifestação de protesto.

Fonte: Envolverde