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Marília Gonçalves: O Enem fracassou?

No início deste mês, mais de 3 milhões de pessoas realizaram, em todo o Brasil, as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). O Exame, que existe desde 1998, não é obrigatório, mas muitos alunos decidem fazer a prova porque ela substitui o vestibular – no todo ou em parte – em cerca de 500 universidades em todo o Brasil.

Por Marília Gonçalves no Observatório da Favela

O Ministério da Educação (MEC) incentiva que as universidades façam essa substituição, com o objetivo de ampliar a realização da prova unificada. Essa política fez o Exame crescer significativamente na última década. Em 2000, foram 390.180 inscritos, enquanto este ano o número de pessoas cresceu para 3.568.592.

Apesar disso, o Enem tem sido acusado de ser um grande fracasso. As últimas críticas se basearam em falhas na aplicação das últimas provas que, segundo informações do MEC até o momento, atingiram não mais do que dois mil alunos, ou seja, um percentual de 0,06% dos candidatos. “Dez vezes mais urnas foram anuladas nas últimas eleições e a mídia não falou nada sobre isso”, afirma o professor Idelber Avelar.

Idelber, que leciona na Universidade de Tulane, nos Estados Unidos, acusa a mídia, principal fonte de críticas ao Exame até então, de estar alinhada aos interesses do que chama de “máfia dos vestibulares”. “É muito comum existir lobby dos cursinhos e editoras sobre que livros adotar no vestibular, este tipo de coisa”, explica. Para o professor, a “máfia” é facilitada pelos vestibulares institucionais, em que cada universidade isoladamente é responsável pela aplicação das suas provas.

Na última semana, jornais noticiaram manifestações de estudantes que se sentiram prejudicados com os erros nas provas. Para Faber Paganoto, professor de ensino médio no Rio de Janeiro, a revolta dos alunos é motivada pelo que é noticiado sobre o Enem. “A reação inicial dos alunos é a de indignação, mas uma breve conversa é suficiente pra perceber que muito dessa indignação é influência da mídia, que tem politizado a discussão sobre o Enem. Em conversas com eles tentei mostrar que as falhas não são do exame, mas de sua logística e que prejuízos maiores eles teriam se o Enem fosse anulado”, afirma o professor.

O Exame Nacional e as políticas de acesso

Em um país com dimensões continentais como o Brasil, realizar um exame nacional requer uma organização minuciosa. O professor Idelber acredita que a prova uniforme é um instrumento que garante o “mínimo de coesão” entre o ensino básico em todo o país, que ainda é muito desigual. “Mas tem de se começar de algum lugar”, afirma.

Para Faber, o Enem é importante para democratizar o acesso à universidade, mas poderia ser aplicado em dimensão estadual, para evitar erros de logística que nacionalmente são inevitáveis. “Acho que a proposta de uma prova única de seleção, com foco em habilidades e competências, perfil menos conteudista e de inscrição gratuita é válida, importante e contribui pra democratização do acesso a universidade. Assim, gosto da essência do Enem. Mas não vejo como evitar problemas como os que têm se repetido numa prova única nacional dessa dimensão”, conclui.