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Wagner Gomes: A classe trabalhadora e o desenvolvimento nacional

“Os trabalhadores e a economia” foi tema, nesta quinta-feira (25), de uma oficina da Conferência sobre Desenvolvimento (Code), que está sendo promovida pelo Ipea em Brasília. O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Wagner Gomes, foi um dos expositores no evento, que contou com a participação de dirigentes da CUT, Força Sindical, UGT e CGTB e a moderação do Dieese.

Na opinião do presidente da CTB, a classe trabalhadora tem muita autoridade para falar sobre desenvolvimento, já que é o trabalho é a fonte do valor e do crescimento da economia. Leia abaixo a íntegra da intervenção de Wagner Gomes na conferência.

Sobre a importância do tema

1- O debate sobre desenvolvimento tem uma importância extraordinária para a sociedade. Precisamos despertar a consciência da classe trabalhadora e do próprio movimento sindical sobre o tema, que não é exclusivo da academia. Esta conferência pode contribuir muito neste sentido.

2- Nosso norte é a frase de Celso Furtado que o Ipea destacou na convocação desta conferência: "…que nunca é demais repetir e insistir que o desenvolvimento se faz para o homem". Com efeito, o desenvolvimento, em última instância, é o desenvolvimento do ser humano; é o resultado histórico da evolução da consciência, da capacidade, das habilidades e potencialidades humanas.

3- Compreendemos que o desenvolvimento se fará para o ser humano, homem e mulher, conforme imaginava Celso Furtado, na medida em que beneficiar o conjunto da sociedade e não uma minoria de ricaços; contemplar o povo trabalhador e não uma pequena oligarquia financeira; servir os explorados, não os exploradores.

O papel do trabalho na produção

4- A classe trabalhadora tem autoridade para falar sobre desenvolvimento. O trabalho é a fonte do valor gerado ou agregado na economia, a fonte da riqueza social. A classe trabalhadora é a principal força motriz da produção e do desenvolvimento.

5- A experiência nos ensina que quando todos têm um emprego e nenhum trabalhador está involuntariamente ocioso, a produção avança e podemos afirmar que a economia está em desenvolvimento. Também sabemos que a principal manifestação da crise, da falta de desenvolvimento, é o desemprego. Os Estados Unidos, hoje, são uma demonstração viva desta verdade. O desenvolvimento econômico depende do trabalho, é o produto do trabalho.

6- Todavia, nem sempre a classe trabalhadora é beneficiada pelo desenvolvimento da economia.

7- Durante anos prevaleceu no Brasil a idéia de que é necessário depreciar a força de trabalho para promover o desenvolvimento, fazer o bolo crescer, aumentar os lucros capitalistas e a competitividade das empresas. O neoliberalismo, que orientou os governos de Collor e FHC, foi a expressão política mais radical deste pensamento. Direitos sociais foram flexibilizados, vivenciamos a precarização crescente das relações e condições de trabalho, a taxa de desemprego triplicou, os salários foram arrochados, principalmente no setor público, estatais foram privatizadas e a desnacionalização da economia cresceu.

8- Mas o neoliberalismo fracassou na promessa de desenvolvimento econômico. O país estagnou e retrocedeu no mundo. O mercado interno encolheu.

9- Os trabalhadores perderam e a nação também. O Brasil ficou mais vulnerável e dependente. A política econômica foi ditada e monitorada pelo FMI.

10- O povo brasileiro derrotou o neoliberalismo e abriu uma nova fase na história do Brasil com a eleição de Lula em 2002. Originário do movimento operário, o presidente Lula inaugurou um novo relacionamento com o movimento sindical, que o apoiou massivamente no segundo turno da eleição.

11- Uma das primeiras decisões de Lula foi arquivar a proposta de reforma trabalhista de FHC. O projeto, aprovado na Câmara dos Deputados, ameaçava direitos fundamentais da classe trabalhadora, arrancados na luta e consagrados na CLT e na Constituição, inclusive 13º salário e férias, ao estabelecer a prevalência do negociado sobre o legislado. Felizmente, o retrocesso neoliberal foi interrompido.

Legalização e unidade das centrais

12- As centrais sindicais foram legalizadas e passaram a ser consultadas pelo governo em temas associados mais diretamente aos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras. O risco de criminalização dos movimentos sociais, alto no governo anterior, foi afastado.

13- Destaca-se como resultado deste relacionamento mais democrático entre o governo e os movimentos sociais a política de valorização do salário mínimo.

14- As centrais avançaram no sentido da unidade e isto é muito significativo. Em 1º de junho deste ano realizamos uma Conferência Nacional da Classe Trabalhadora. Aprovamos ali um manifesto e uma agenda da classe trabalhadora que defendem o desenvolvimento nacional associado a três valores fundamentais: a democracia, a soberania e a valorização do trabalho. As propostas são detalhadas e descritas em seis eixos principais: 1) Crescimento com distribuição de renda e fortalecimento do mercado interno; 2) Valorização do Trabalho com Igualdade e Inclusão Social; 3) Estado como promotor do desenvolvimento socioeconômico e ambiental; 4) Democracia com efetiva participação popular; 5) Soberania e Integração Nacional; 6) Direitos Sindicais e Negociação Coletiva.

Valorização do trabalho

15- Ao contrário do que sustentam os neoliberais, a valorização do trabalho é uma fonte do crescimento econômico. A recuperação do valor dos salários e do emprego formal ao longo dos últimos anos, com o destaque do salário mínimo, é uma prova disto. O fortalecimento do mercado interno, decorrente de uma melhor distribuição de renda, foi fundamental para sustentar a demanda interna e impedir que a depressão do comércio exterior redundasse numa recessão mais grave no Brasil.

16- As reivindicações da classe trabalhadora estão em harmonia com os interesses nacionais. As bandeiras do trabalho são bandeiras desenvolvimentistas. Conforme sugeriu Celso Furtado, mais do que um resultado desejável do desenvolvimento a distribuição mais justa da renda é uma condição para o pleno desenvolvimento das forças produtivas no Brasil.

17- A valorização do trabalho é, para as centrais, um fomento essencial do mercado interno e um objetivo primordial. As centrais lutam pela redução da jornada de trabalho sem redução de salários conscientes de que a medida gera emprego, incentiva o consumo e a produção, além de beneficiar o trabalhador; pela ratificação da Convenção 158 da OIT e contra a alta rotatividade do emprego; pela valorização dos servidores públicos e pela regulamentação da Convenção 151 da OIT; pelo fim das discriminações e o respeito à igualdade no mercado de trabalho; pela completa formalização das relações trabalhistas; pela manutenção e ampliação dos direitos trabalhistas, que traduzem a progressiva humanização das relações sociais. Lutaremos com toda a energia contra as tentativas de retrocesso neste capítulo.

Soberania nacional e integração econômica

18- A defesa da soberania também tem uma importância cardeal para o desenvolvimento nacional. Não vivemos isolados. No mundo de hoje, a cada dia mais globalizado, é impossível ser indiferente ao que ocorre lá fora.

19- Se o governo brasileiro tivesse assinado a Alca proposta pelos Estados Unidos, ao invés de rejeitá-la como reclamavam os movimentos sociais, a economia estaria paralisada pela dependência do mercado estadunidense, que entrou em colapso. Provavelmente ainda não teríamos saído da crise, que afetou fortemente nossa indústria no segundo semestre de 2008.

20- A recuperação veio através do dinamismo do mercado interno, também estimulado pelas políticas anticíclicas do governo, e da diversificação das nossas exportações, com destaque para a China, que se transformou na maior parceira comercial do Brasil em 2009, superando os EUA, e manteve em alta o preço das chamadas commodities.

21- Em unidade com as demais centrais, a CTB apoia o processo de integração econômica e política das nações latino-americanas e luta para imprimir um caráter social mais avançado e popular a esta união.

Superação do déficit social, mudanças na política econômica e reformas estruturais

22- É inegável que sob o governo Lula o país caminhou positivamente no combate à fome, na melhor distribuição de renda e valorização do trabalho, bem como na defesa da soberania e da democracia, impedindo a criminalização do MST e das lutas sociais. No entanto, como assinala a agenda por um novo projeto nacional de desenvolvimento aprovada pelas centrais, “ainda há um enorme déficit social a ser superado”. É preciso avançar bem mais e o documento das centrais alinha um conjunto de propostas e idéias nesta direção.

23- Defendemos mudanças na política macroeconômica, que em nossa opinião ainda mantém um forte viés neoliberal. Devemos romper de vez com o neoliberalismo neste terreno. Em primeiro lugar, cabe reduzir as taxas de juros e o spread bancário, que são fonte de especulação, contribuem para a instabilidade cambial, reduzem a capacidade de investimentos do Estado e configuram uma escandalosa transferência de recursos públicos para os rentistas.

24- Juros menores devem se refletir também na diminuição ou mesmo fim do superávit primário, de modo que o dinheiro que o Estado economiza para pagar juros seja investido em infraestrutura, saúde, educação, criação de novas estatais.

25- A chamada guerra cambial evidencia a necessidade de mudar a política cambial, pondo fim ao dogma neoliberal do câmbio flutuante, e impor um controle mais rigoroso sobre o fluxo de capitais estrangeiros. O déficit em conta corrente deve ser combatido e a taxação das remessas de lucros das multinacionais é uma medida necessária neste sentido.

26- Um novo projeto de desenvolvimento, fundado na valorização do trabalho, requer reformas estruturais:

– Reforma política, que consagre o financiamento público das campanhas e restrinja a influência do poder econômico e a corrupção nas campanhas eleitorais.

– Reforma agrária, bandeira histórica do nosso povo que ainda não foi devidamente contemplada e deve ser acompanhada pelo fortalecimento da agricultura familiar.

– Reforma urbana, com foco na eliminação do déficit habitacional. – Reforma educacional, de forma a universalizar o acesso a um ensino público e gratuito de qualidade.

– Reforma tributária, para estabelecer um sistema tributário progressivo, desonerar o trabalho, reduzir os impostos indiretos e ampliar os diretos, taxando as grandes fortunas, o sistema financeiro e as grandes propriedades.

– Reforma dos meios de comunicação, contra o monopólio e pela democratização da mídia, hoje hegemonizada por uma meia dúzia de famílias reacionárias.

Educação
27- Temos consciência da crescente importância da educação para o desenvolvimento nacional, a inserção do país na divisão internacional do trabalho, a produção e distribuição da renda e o futuro da nossa classe trabalhadora. É notório o atraso do Brasil nesta área. O nível médio de escolaridade não alcança o ensino fundamental e a taxa de analfabetos permanece relativamente alta.

28- É imperativo ampliar os investimentos em educação, valorizar os profissionais do ramo, garantir o ensino público e gratuito de qualidade acessível a todos. A União deve dedicar parte dos lucros do pré-sal a esta finalidade.

29- Uma proposta das centrais sindicais que merece maior atenção neste sentido é a destinação de uma parte da jornada de trabalho (remunerada) ao estudo, visando a elevação do nível de escolaridade e educação da classe trabalhadora.

Desenvolvimento socioambiental

30- Queremos um desenvolvimento sustentável do ponto de vista ambiental e social, pautado pelo respeito à natureza e aos direitos do povo.
Papel do Estado e luta pelo socialismo
31- O Estado, que deve estar a serviço da maioria, tem um papel fundamental no novo projeto de nação que defendemos. O desenvolvimento que almejamos não virá sem luta.

32- E digo mais! A crise da sociedade capitalista e da ordem mundial imperialista, remanescente da 2º Guerra, recoloca para a classe trabalhadora e a humanidade a necessidade de reavivar a luta pelo fim do capitalismo e pelo socialismo. Acreditamos que no socialismo poderemos superar as crises e harmonizar o desenvolvimento com os interesses e os ideais mais elevados do ser humano.