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Niko Schvarz: Irlanda, Grécia, Portugal, Otan

Nestes dias, aconteceram na Europa dois fatos de grande repercussão mundial: o estrondoso colapso econômico da Irlanda (que sucede o da Grécia, enquanto Portugal e Espanha estão às portas de outro) e a Cúpula da belicosa Aliança do Atlântico Norte, em Lisboa.

Por Niko Schvarz

O da Irlanda retumbou como um trovão em um céu sereno. O país era considerado um modelo nas mais diversas ordens. Pulou de níveis atrasados aos primeiros planos mediante uma exitosa orientação para a indústria de alta tecnologia, que o converteu no maior exportador de software depois dos EUA, ao hospedar a sede europeia da Microsoft e similares. Aderiu à União Europeia em outubro de 2002, ocupou sua presidência rotativa em janeiro de 2004 e, ao contrário da Grã-Bretanha, adotou o euro como moeda única.

De repente, vem o choque: o desemprego de 14,1% e um déficit fiscal para este ano de 32% do PIB, algo quase sem paralelo, que, em sua maior parte (20 dos 32 pontos), se destina ao resgate de bancos fundidos, que levam, em primeira instância, 45 bilhões de euros, dos 80 bilhões de euros que o Banco Central Europeu (BCE) destina à Irlanda, do total de 700 bilhões de euros gastos para a recuperação dos países da zona euro.

A respeito, o analista Dean Baker diz: "O governo irlandês era um modelo de probidade fiscal antes da catástrofe econômica. Havia produzido grandes superávits orçamentários fiscais antes do início da crise. O problema da Irlanda não consistia, certamente, em gastos fora do controle do governo, mas em um sistema bancário temerário, que alimentou uma imensa bolha imobiliária. Os magos econômicos do BCE e do FMI ou não puderam ver a bolha ou pensaram que não valia a pena mencioná-la".

E insiste: "Quando um bombeiro ou uma equipe médica realizam um resgate, o normal é que a pessoa fique melhor. Isso não está tão claro quando os socorristas são o Banco Central Europeu ou o FMI." O que vai acontecer agora? Pelas condições impostas para o salvamento (sempre de acordo com a mesma concepção fracassada), haverá mais cortes nos gastos do governo, um aumento de impostos para a população e um aumento o seguro da já elevadíssima taxa de desemprego.

O objetivo do plano é "impor uma austeridade extrema, que levará a que grande parte da força de trabalho da Irlanda sofra com o desemprego por anos, como resultado do fracasso de seus banqueiros e do BCE", o mesmo que acontece com os trabalhadores da Espanha, Portugal, Letônia e outros países. Ele diz que o FMI e o BCE vão insistir que não há outra maneira, mas o contrapõe a experiência da Argentina, que quebrou a paridade peso-dólar e sua dependência do FMI.

Um comunicado de 23 de novembro do PC irlandês assinala que "o governo, igual à economia irlandesa, foi torpedeado abaixo da linha d'água e está afundando; que as políticas impostas pelo FMI e a União Europeia não resolverão os problemas, mas só os agravarão; que países latino-americanos saíram na frente rejeitando as políticas do FMI e que têm sido nefastas, na Europa, as políticas aplicadas por Blair na Grã-Bretanha, Schröeder na Alemanha e Papandreu na Grécia".

Tudo isto nos trouxe à memória as páginas escritas por Marx sobre a luta do povo da Irlanda pela sua independência e, mais perto de nós, a heroica greve de fome de Bobby Sands e seus colegas do IRA contra a política repressiva de Thatcher.

Um conjunto de forças chamam à mobilizar-se na Irlanda contra os resultados desta política, em correspondência com o que aconteceu em grande escala na Grécia, também na França contra a política de Sarkozy com o mesmo conteúdo (aumento da idade de aposentadoria e medidas racistas concentradas), e, recentemente, em Portugal, com uma greve geral de 24 horas declaradas conjuntamente pela CGTP e a UGT e que tem como objetivo reverter os cortes de direitos dos trabalhadores, incluídos pelo governo de José Sócrates no orçamento de 2011.

O outro evento importante é a cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), dos dias 19 e 20 de novembro, com a participação dos agora 28 membros desta aliança agressiva criada para impulsionar os EUA em 1949.

A Aliança se declarou como um gendarme mundial equipado com armas nucleares, e disposto a intervir em qualquer parte do mundo (como fez no Kosovo, na Sérvia, e está fazendo no Iraque e Afeganistão). O conceito apresentado pelo secretário-geral da Otan, o dinamarquês Anders Fogh Rasmussen, e aceito, é a adoção de um novo conceito estratégico que contempla a criação de um "escudo" que protegerá seu território contra eventuais ataques de mísseis, a manutenção de suas forças nucleares e a atuação para além das suas fronteiras, alegando "a proteção da segurança dos seus países membros."

Neste quadro, se estabelece a possibilidade de intervenção em qualquer país, sem limites de qualquer tipo. Uma declaração do PC francês destaca que "a OTAN não é a solução, mas parte do problema; é um fator de agravamento das crises atuais, particularmente no Afeganistão", e solicita a retirada de tropas da Otan daquele país.

Um cálculo estabelece que 1,53 trilhões de dólares em armas é o recorde da Otan para 2010, enquanto 1 trilhão é o recorde de pessoas que sofrem de fome no mundo em 2010, segundo a FAO.

Fonte: La República