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China compra empresa argentina e expande sua influência na AL

Em um negócio que marca o maior investimento já feito pela China na América do Sul, a BP vendeu o controle da petrolífera argentina Pan American Energy (PAE) aos seus dois sócios na empresa, a estatal chinesa CNOOC e a família Bulgheroni. A transação foi fechada por US$ 7 bilhões.

A aquisição é emblemática da expansão da influência econômica da China na América Latina, que ocorre em contraposição à decadência da liderança dos Estados Unidos, e no caso também do velho imperialismo britânico, na região.

Dona da segunda maior economia do mundo, a próspera nação asiática deslocou os norte-americanos da condição de maiores parceiros comerciais do Brasil em 2009 e ampliou de forma extraordinária os investimentos diretos na América Latina. Isto sinaliza uma realocação da sua gigantesca reserva (estimada em cerca de 2,5 trilhões de dólares) após a emergência da crise mundial do capitalismo.

Realocação das reservas

Antes, os recursos das reservas – derivados do superávit comercial e em conta corrente, obtido graças ao saldo do comércio com os EUA e aos investimentos estrangeiros no país – eram aplicados principalmente na compra de títulos emitidos pela Casa Branca e outros ativos financeiros estadunidenses.

Agora, o aumento dos investimentos diretos no exterior, em detrimento das aplicações financeiras (em papéis que Karl Marx classificava de capital fictício), sugere que o governo chinês decidiu substituir os investimentos em títulos por ativos reais, tangíveis, menos voláteis e sujeitos a bruscas desvalorizações, como os papéis do governo (que desvalorizam quando o dólar cai) e os títulos hipotecários.

Inflação do dólar

Esta realocação dos investimentos da China provavelmente reduziu a demanda por títulos públicos dos EUA no exterior e estimulou a decisão do Federal Reserve (FED, o banco central estadunidense) de imprimir e emitir dólares para comprar papéis do gênero que estão em mãos dos bancos.

Os polêmicos 600 bilhões que o FED promete derramar no sistema financeiro foram interpretados como uma ofensiva do império para depreciar o dólar e reanimar sua decadente indústria e despertaram uma indignação generalizada no “resto do mundo”, comprometendo ainda mais a já combalida saúde do padrão dólar.

Contradições

A inflação do dólar exacerba os desequilíbrios do comércio internacional, agrega novos elementos de instabilidade e volatilidade nas relações de troca entre as nações e desata o que o ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, caracterizou de guerra cambial. Tudo isto reforça a necessidade objetiva de substituir o dólar como moeda mundial, muito embora isto não seja uma coisa simples e fácil de operar.

A expansão da China não é isenta de contradições e nem sempre ocorre em harmonia com os interesses das nações latino-americanas, mas constitui um óbvio contraponto à hegemonia imperialista que os Estados Unidos exercem há mais de um século na região e, neste sentido, corrobora a rebeldia de alguns governos latino-americanos, contribuindo decisivamente no processo de mudança do cenário político e na conformação do novo arranjo econômico e político que está em curso no continente.

Britânicos perdem espaço

A PAE é a segunda maior produtora de petróleo e gás da Argentina, só atrás da YPF, privatizada nos anos 90 e hoje sob controle da espanhola Repsol. Seus 110 mil barris de petróleo e 18,3 milhões de metros cúbicos de gás extraídos por dia equivalem a 18% da produção total do país.

Até agora, o capital da PAE era formado pela BP (60%) e pelo grupo Bridas (40%), dos irmãos Bulgheroni. Em março, os chineses já haviam feito a primeira ofensiva sobre a empresa, comprando metade da Bridas, por US$ 3,1 bilhões. Agora, dividiram com seus sócios locais o investimento de US$ 7 bilhões para assumir o controle da PAE.

Enquanto os britânicos da BP tentam fazer caixa para recompor as perdas sofridas com o recente vazamento no Golfo do México, a China avança na incorporação de empresas que exploram recursos naturais, principalmente na África e na América do Sul. No Brasil, os chineses já desembolsaram bilhões de dólares na aquisição de ativos como jazidas de minério de ferro e participação em blocos petrolíferos na Bacia de Campos, além de terem fechado uma parceria com o empresário Eike Batista para construir uma siderúrgica no Porto do Açu (RJ). Também adquiriram sete empreendimentos de transmissão de energia.

Controle local

Especialistas argentinos receberam bem a notícia de que os chineses aumentaram sua fatia na PAE. Mas o economista Daniel Montamat, ex-presidente da YPF e ex-secretário de Energia, ressaltou o fato de que a gestão continuará nas mãos dos sócios locais.

"Bem-vindos os chineses, mas o fato de que seguem os Bulgheroni é um compromisso com a geologia argentina. Se somente a CNOOC tivesse comprado, teríamos que esperar um longo tempo de adaptação até que tivessem know-how. Provavelmente estariam ordenhando a vaca, mas sem exploração de risco. A permanência do sócio argentino aumenta as possibilidades de uma aposta pela Argentina, já que os Bulgheroni são de apostas de longo prazo."

Para o consultor Daniel Gerold, a aquisição do controle da PAE pelo grupo Bridas marca "o provável início de um novo ciclo petrolífero" no país. A produção de petróleo cai há oito anos seguidos. No caso do gás natural, as reservas comprovadas caíram quase 50% em uma década e durariam só oito anos mais, se mantido o ritmo de exploração atual.

Gerold afirma que o negócio "revaloriza fortemente os ativos e as perspectivas do setor" e "implica um forte sinal de confiança em uma melhoria significativa da atividade de exploração e produção" na Argentina.

A PAE explora o campo Cerro Dragón, na Província de Chubut (sul do país), que gera individualmente a maior produção nacional. Detém a concessão do campo até 2027. Também demonstra disposição, segundo os analistas, de juntar-se à YPF para iniciar explorações marítimas.

O principal entrave para atividades de risco no setor é a política tributária do governo, com base nas retenções. O barril de petróleo só pode ser vendido a US$ 45, mesmo que esteja valendo o dobro ou mais no mercado internacional. Além disso, os principais jazimentos petrolíferos da Argentina são considerados "maduros" e em fase de declínio. É o que ocorre com os campos explorados pela Petrobras na Província de Neuquén.

Da redação, com informações do Valor