Para que o Brasil nunca mais se envergonhe de si mesmo
Em decisão tomada em 24 de novembro último e divulgada ontem (14), a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) condenou o Estado brasileiro por não ter investigado crimes cometidos pela ditadura militar (1964-1985) no combate à Guerrilha do Araguaia. A sentença se baseia na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (também chamado de Pacto de San José, do qual o Brasil é signatário).
Por José Reinaldo Carvalho*
Publicado 15/12/2010 15:50
A Corte da OEA disse o que o movimento democrático e pelos direitos humanos no Brasil tem dito exaustivamente desde os tempos da luta pela anistia, nos longínquos anos 1970: que a ditadura cometeu crimes bárbaros contra os direitos humanos e, destarte, crimes imperdoáveis e imprescritíveis.
- Lungaretti: Anistia não beneficiou torturadores, decide OEA
- Jobim não admite punição para torturadores
Como sempre, serão ouvidas vozes altissonantes falando em juridiquês tentando provar que no Brasil as coisas se passaram de modo diferente dos países vizinhos, que nestas plagas, em agosto de 1979, foi aprovada uma Lei de Anistia que perdoou os dois lados. Até o senso comum sabe que não é assim
Faz um quarto de século que a ditadura militar acabou. O processo tramitou na Corte da OEA ao longo de década e meia. Houve tempo suficiente para que os governos do período democrático, de Sarney a Lula, saldassem o débito histórico, repusessem totalmente a verdade e fizessem justiça. Nenhum teve coragem suficiente para tomar em suas mãos com frontalidade a solução do problema. O resultado da pusilanimidade é o vexame, a desonra e a condenação do país por um órgão supranacional. A vitória dos direitos humanos e a afirmação da justa concepção condenatória à tortura e aos torturadores podia muito bem ter sido resultado da inteligência, da compreensão e da decisão interna.
Os generais fascistas deixaram mais esta herança. Legaram à geração posterior o pagamento dos seus crimes. Não há argumento que sustente a recalcitrância das Forças Armadas. Ou fazem uma declaração formal de sua culpabilidade, pedem desculpas e pagam pelo que cometeram, ou as feridas do período em que se impuseram ao país pela força e o arbítrio continuarão abertas, agora sob o risco de penalidade internacional. Os fatos históricos deixam à mostra a falsidade do patriotismo dos anteparos e cultores da famigerada ditadura. É hora de, em nome da democracia, dos direitos humanos e do verdadeiro patriotismo, fazer justiça para que o Brasil nunca mais sinta vergonha de si mesmo.
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!..
Em manto impuro de bacante fria!…
Que impudente na gávea tripudia?!…
Que o pavilhão se lave no teu pranto…
Que a brisa do Brasil beija e balança,
E as promessas divinas da esperança…
Foste hasteado dos heróis na lança,
Que servires a um povo de mortalha!…