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Urariano Mota: Tchekhov em palavras de Gorki 

Anton Tchehkov foi um dos principais escritores russos da segunda metade do século 19. Na passagem do 150º aniversário do seu nascimento (29 de janeiro de 1860), o Prosa Poesia e Arte publica o conto Angústia, de sua autoria, e Tchehkov em palavras de Gorki, de Urariano Mota.

- Reprodução
Anton Pavlovitch Tchekhov nasceu em 29 de janeiro de 1860 em Taganrog, na costa do mar de Azov, na Rússia. Estudou medicina na Universidade de Moscou, na primeira metade da década de 1880, quando começou também a escrever para várias revistas contos, fábulas e peças humorísticas.

Seus contos e mais tarde sua dramaturgia, o tornaram reconhecido como uma das glórias literárias nacionais da Rússia, tal como Dostoievski, Tolstoi e Gorki. Sua obra influenciou muitos escritores russos e europeus. Bernard Shaw posicionou a obra de Tchehkov como dramaturgo ao lado da de Ibsen.

Seu primeiro conto, “Carta de um proprietário a um sábio vizinho” aparece em março de 1880 em “A Cigarra”, semanário satírico de São Peterburgo. Sentindo-se responsável pelo sustento da família após a falência de seu pai, um pequeno comerciante que quase foi preso por dívidas,instala-se em Moscou, onde tenta aumentar sua renda publicando contos em diversos jornais e sob diversos pseudônimos, alcançando rápido sucesso.
Ainda jovem adoece de tuberculose, o que o obrigará a fazer diversos deslocamentos na busca de um clima mais ameno que o de Moscou.

Tchekhov era refratário a qualquer tipo de engajamento político, mas tinha extrema sensibilidade social e aguda visão crítica quanto às mazelas da Rússia da segunda metade do século 19, que caracterizou com realismo. Durante toda a sua vida dedicou-se a ações de beneficência (construção de escolas, doação de livros a bibliotecas, exercício gratuito da medicina etc).

Dentre as suas principais obras destacamos: “A Estepe”, “O Duelo”, “Os Camponeses” e as peças teatrais “A Gaivota” , “Tio Vânia”, “As Três Irmãs” e “O Jardim das Cerejeiras”.
Após muitas tentativas de cura, Anton Tchekhov morre em 2 de julho de 1904, em Badenweiler, Alemanha. Minutos antes do último suspiro, diz serenamente ao médico, em alemão “Ich sterbe” (Estou morrendo). Tendo recusado o oxigênio, dão-lhe champanhe. Segundo Virgil Tanase, suas últimas palavras são: “Faz muito tempo que não bebo champanhe”. Depois de tomar uma taça, deita-se de lado e morre. Foi enterrado uma semana depois, no dia 9 de julho, no cemitério de Novodevitchi, em Moscou.

Confira o texto de Urariano, publicado originalmente no Comunique-se:

Hoje, por me sentir mais estúpido e indolente que em outros dias, recolho-me à minha insignificância para melhor presentear os leitores. O presente é Máximo Górki, no livro Três Russos, em que ele narra encontros que teve com Tolstói, Tchekhov e Andreev. Mas antes que alguns levantem o nariz, lembro que esse livro de Górki recebeu leitura crítica e entusiasmada de Thomas Mann.

Por Urariano Mota*  

Os trechos a seguir são cópia de linhas referentes a Tchekhov.
 
“Um dia, recebeu a visita de três senhoras suntuosamente vestidas. Depois de terem enchido a sala com o ruído de suas saias de seda e com o odor de perfumes capitosos, sentaram-se com cerimônia em frente ao dono da casa, e, afetando grande interesse por assuntos políticos, passaram a fazer ‘perguntas inteligentes’:
 
– Antonio Pavlovitch! Por qual modo terminará a guerra?
 
Antonio Pavlovitch tossiu ligeiramente, refletiu e respondeu com doçura, em um tom sério e afável:
 
– Provavelmente pela paz …
 
– Naturalmente!… Mas quem será o vencedor? Os gregos ou os turcos?
 
– Parece-me que serão vencedores os mais fortes.
 
– E na sua opinião, quais são os mais fortes? – perguntavam com insistência as senhoras.
 
– Os mais bem nutridos e os mais instruídos.
 
– Oh, como é espirituoso! – exclamou uma das visitantes.
 
– E de quem gosta mais, dos gregos ou dos turcos? – perguntou uma das outras senhoras.
 
Antonio Pavlovitch mirou-a gentilmente e respondeu com um amável e doce sorriso:
 
– Gosto de torta de frutas … a senhora gosta?
 
– Muito! –  exclamou vivamente a dama.
 
– Vem um perfume tão bom dessas tortas! – confirmou enfaticamente uma outra das visitantes.
 
E todas três se puseram a falar com animação, dando provas, nessa questão de torta de frutas, de uma admirável erudição e de um perfeito conhecimento do assunto. Estavam evidentemente encantadas por não terem mais de puxar pela inteligência e de fingir interesse por turcos e gregos, nos quais, até antes do encontro com Tchekhov, sem dúvida nunca haviam pensado. 
 
E ao partirem, prometeram com alegria a Antonio Pavlovitch:
 
– Nós lhe mandaremos uma torta de frutas.
 
– Linda conversação!.. –  disse eu, quando partiram.
 
Antonio Pavlovitch riu docemente e acrescentou:
 
– É necessário que cada um fale a sua língua…”.
 
E aqui chegamos ao fim, da citação. De agora em diante, desconfiamos, mais de um leitor pedirá presentes semelhantes nas próximas semanas. Sem necessidade dos parágrafos fora da cópia, para maior alegria.
*Urariano Mota é escritor, jornalista, colaborador do Observatório da Imprensa, membro da redação de La Insignia, na Espanha. Publicou o romance “Os Corações Futuristas”, cuja paisagem é a ditadura Médici. Tem inédito “O Caso Dom Vital”, uma sátira ao ensino em colégios brasileiros.

Da redação, com Comunique-se e agências