Nágyla Drumond: Carta para mulheres

 

Camaradas e Companheiras,

Antes de mais nada, sinto-me muito feliz em poder compartilhar mais um ano de lutas, dores e humores com todas vocês. As escolhas que fazemos são sempre as mais difíceis. Somos de tantos jeitos, de tantas cores, de tantas formas; mas, compartilhamos, de uma forma ou de outra, o fato de darmos nó em pingo d´água para reafirmarmos que lugar de mulher é em todo lugar e não mais, apenas, nos lugares reservados pelo machismo, pelo racismo, pelo homofobismo. É maravilhoso ser mulher! É fantástico nos organizarmos politicamente! É fantástico gerar filhas e filhos, se assim desejarmos! Mas, é também, necessário pensar sobre os lugares que ocupamos e como estamos ocupando. É necessário pensar e sistematizar as novas experiências que a nossa geração está vivenciando em relação ao corpo, ao trabalho, à casa, à família,à política, às religiões, ao desejo ou não de se tornarem mães, ao prazer afetivo-sexual. O que conquistamos? O que há de novo? O que não se repete e/ou retrocede ? O que já conseguimos abolir? O que ainda temos a garantir?

Para nós, emancipacionistas, sabemos de "có e salteado" que a emancipação de mulheres e homens não se dará nos marcos desta sociedade e que será numa outra sociedade, que aprendemos a chamar de socialismo, que iniciaremos os processos de transformação cultural, simbólica, econômica e social para que posssamos erradicar as mazelas que afetam a vida das mulheres e que fiquemos livres de todas as formas de violência; que possamos compartilhar com equidade no mundo do trabalho e das riquezas que são construídas coletivamente; que possamos dizer que temos o direito de nos relacionar com quem quisermos, amar quem quisermos, ter filhos na hora que quisermos; com a garantia de uma sociedade radicalmente democrática, avançada e solidária. Mas, também sabemos que o socialismo não é um lugar fixo, um paraíso a ser descoberto, "chegado", aportado. Precisa de muito trabalho e de muita dedicação, cotidiana, sem deixar que o cotidiano nos engula e nos contente. Pois o cotidiano, me perdoem, é entediante e anti-revolucionário; mas, é também o lugar que nos aponta as pistas, que apura o nosso faro para que no curso da história contrariemos esta lógica que nos empurra para acomodação seja econômica, intelectual, artística, afetiva, política e cultural.

As mulheres lutam desde sempre, coletiva ou individualmente. Foram e são perseguidas, agredidas/ torturadas, silenciadas/ mortas ao longo da (s) história (s) da humanidade. Falo do advento da propriedade privada, da divisão social e sexual do trabalho, do deslocamento/fixação das mulheres no mundo privado. Falo das que estão sofrendo vários tipos de violência e estão perto de nós; falo das que não conhecemos; falo das que estão do outro lado do mundo; das que estão nos rincões do nosso imenso e maravilhoso país; falo das que são transformadas em "melancias e jacas"; em "ladies, kates e peruas"; em "marias chuteira e gasolina"; nas que "dão o golpe da barriga", em "mulas" do tráfico, em escravas sexuais, em corpos traficados; bestilizadas, ignorantes e animalizadas.

Mas, de todo este brutal menospezo e achicalhamento histórico floresce resistência, luta, força, firmeza e delicadeza e um profundo amor pela transformação do mundo e de nossas vidas. Surgem, todas nós, distintas e iguais, analfabetas, intelectuais, agricultoras, cientistas, donas de casa, operárias, bailarinas, presidentas da associação de moradores e do país, ministras e sacoleiras, lavadeiras e engenheiras, freiras, mães de santo, pastoras, rezadeiras, prostitutas, atrizes, parlamentares e catadoras de lixo.

Talvez, minhas companheiras e camaradas, possamos estar vivendo uma nova onda do feminismo em nosso tempo histórico, que avança e retrocede; que fala de inclusão e questiona a necessidade de emancipação; que é uma espécie de feminismo no Estado e do Estado e que é tensionado para reforçar os esteriótipos que a sociedade construiu ao longo de sua história. Talvez, ainda, não tenhamos condições de sistematizar sobre as novas feministas e os novos feminismos, mas, de uma coisa tenhamos certeza: nossos desafios continuarão sendo por muito, muito, muito tempo de teorizar, organizar e politizar este debate, implementando uma agenda imediata, das necessidades do agora, do dia-a-dia, mas, fazendo disso, capital político e cultural para a radicalidade de nossa luta anticapitalista. Este é nosso leito. Esta é nossa contribuição para as gerações presentes e futuras.

Tenho certeza de que conseguiremos! Convidamos, convocamos, nossos companheiros de vida e de luta para construirmos uma nova história, protagonizadas por nós, e por todas nós, que somos milhares de marias, gilses, dilmas, micheles, janas, anitas, elzas, franciscas, elianas, martas, teresinhas, elianes, jamacis, geraldas, márcias, anas, iêdas, danieles, andreas, vivianes, fidelarinas, odisséias, carolinas, neides, ivinas, niaras, francileudas, terezas, auxiliadoras, vandas, helenas, noélias, neiles, gracietes, ruths, liéges, vanessas, tânias, saras, nazarés, cleides, dacianes, edites, ritas, larissas, regianes, marises, argentinas, neylas, jacquelines, cibeles, marílias, dulces, clarices, lúcias, adrianas, cristinas, camilas, sofias, cinthias, marcelas, cláudias, rafaelas, roses, manuelas, alices, nices, saletes, sâmias, ivetes, cilenes, ercílias, cleonices, ângelas, lucineides, mazés, margaridas, evas, ozaneides, isas, fabianas, thamyres, jaysas, brunas, pérolas, zizias, renatas, cristianes, alessandras, paulas, marianas, célias, climemes, flávias, antonias, socorrinhas, marlys, vanderleias, nilmas, nildas, ednas, olindas, valdicélias, luízas, mônicas, naras, claras, rebecas, beatrizes, mirnas, germanas, patrícias, rosas, luiziannes, veras, graças, thicianes, lourdes, julianas, gilces, mileides, alines, vitórias, clélias, rosângelas, tatianas, leilas, aylas, fátimas, emílias, augustas, jussaras, dianas, jandiras, gabrielas, vivians, midians, lenes, renas, ivanas, adelitas, adelaídes, lianas, loanas, creuzas, neuzas, arolizas, wilzas, elenitas, heleniras…..

Um grande 08 de março! Feliz dia Internacional da Mulher.

beijos,
Nágyla

Nágyla Drumond é comunista, feminista, mãe da Clarice e Secretária de Mulhares do PCdoB/CE

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