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Afinal, onde é que se exibem filmes brasileiros?

A concorrência com filmes estrangeiros continua causando prejuízos ao cinema nacional. Essa é a avaliação do conselheiro da Associação Brasileira de Cineastas (Abraci), Roberto Farias. “O problema não é distribuição. O problema é espaço na exibição."

Para Farias, a solução passa pela criação de um adicional de renda para os filmes brasileiros exibidos no país, retomando um sistema que havia na década de 1960 no Rio de Janeiro para complementar a receita do produtor. “O adicional de renda atrai o investidor privado, porque ele tem a renda do filme mais um adicional."

Essa seria a forma de capitalizar os produtores de filmes médios. O adicional de renda obedeceria ao limite de espectadores de um filme médio, podendo, inclusive, ser extensivo ao exibidor. Farias acredita que com essa medida não faltariam distribuidores brasileiros e estrangeiros para os filmes nacionais.

Segundo o cineasta, o adicional de renda seria um incentivo fiscal mais sadio, porque seria concedido após a realização do filme. "Quer dizer, ele aumentaria o mercado, atrairia investidor privado. E é um incentivo dado depois do investimento privado. Diferentemente do que é hoje, que tem um investimento subsidiado antes."

Os recursos para isso viriam do Fundo Setorial do Audiovisual. “O fundo setorial tem R$ 80 milhões, mais ou menos, que estão parados, que as pessoas não conseguem atingir por causa da burocracia. Com metade disso dá para fazer um adicional de renda substancial para o cinema brasileiro."

A revisão da cota de tela (número de dias para exibição obrigatória de filmes nacionais nas salas de cinema) seria outra possibilidade na busca de solução para o problema. “É preciso uma reforma no mercado, mais incentivos para a exibição”, sugeriu Farias. "Se o exibidor tem uma disponibilidade de filmes estrangeiros com maior força no mercado que os filmes brasileiros, como ele é um comerciante vai procurar os filmes que lhe dão mais."

O império do blockbuster

Farias explicou que os filmes médios brasileiros têm pouca oportunidade no mercado. “O mercado é tão difícil para o cinema brasileiro que obriga o cineasta nacional a só fazer blockbuster (filmes de grande bilheteria). Quando tem blockbuster, não há nenhuma dificuldade de explorar o filme."

Ele avaliou, no entanto, que a indústria cinematográfica não é feita só de blockbuster, mas engloba filmes médios, de arte e de renovação, por exemplo. Farias disse que não existe problema de distribuição para os filmes nacionais de grande público. “Mas, há para os filmes médios e pouco abaixo da média, que não têm proteção alguma."

Como os filmes estrangeiros são os maiores clientes das salas exibidoras, eles têm maior poder comercial e de competição “ainda que o cinema brasileiro faça filmes de grande êxito e bilheteria”, disse o cineasta. Segundo ele, os filmes nacionais estão dispersos e não têm, por isso, o poder de enfrentar um filme internacional de forma mais vigorosa.

Farias acredita que a existência de algumas distribuidoras privadas, que detivessem um número expressivo de filmes, tornaria mais fácil a abertura de mais espaço exibidor para as produções nacionais. De acordo com o cineasta, esse problema remonta ao século passado. “O cinema estrangeiro é muito mais poderoso que o nosso e, consequentemente, tem um domínio sobre o mercado muito maior que o filme brasileiro."

O gargalo da distribuição

Já na opinião da cineasta Lúcia Murat, membro do conselho consultivo da Associação Brasileira de Cineastas (Abraci), o impasse do cinema brasileiro é a distribuição. “A gente não tem nenhum controle sobre esse mercado, que é dominado por filmes do tipo blockbuster.”

Dos 14% que o cinema nacional possui atualmente do mercado, 13% são blockbuster. O restante fica restrito ao circuito de arte e não tem tela para ser exibido. “São filmes brasileiros que, teoricamente, deveriam ter uma identidade com o povo brasileiro. A gente não tem esse mercado."

Lúcia analisa que o problema exige uma política mais abrangente do que a simples revisão da cota de tela. Para ela, essa política passa pelo estímulo à criação de distribuidores e exibidores brasileiros, por exemplo. “Tem que ser uma coisa mais complexa, inclusive com educação também. Sem você educar, colocar o cinema brasileiro e outros cinemas que não sejam o dominante nas escolas e sem formar o público não tem como. Acho que tem que atuar de diversas maneiras."

Para a cineasta, além de aumentar a cota de tela é preciso formar público e rediscutir toda a política cinematográfica. Essas e outras questões estão sendo discutidas no Conselho Superior de Cinema com os diversos segmentos do setor. As conclusões serão apresentadas à ministra da Cultura, Ana de Hollanda, e encaminhadas posteriormente à Presidência da República.

BNDES

Mais investimentos é outra demanda do setor. Os desembolsos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para o cinema brasileiro nos últimos cinco anos somam mais de R$ 165 milhões, segundo a gerente do Departamento de Cultura, Entretenimento e Turismo do banco (Decult), Patrícia Vieira. O banco cobre todos os elos da cadeia cinematográfica, desde a produção até a exibição.

O BNDES apoia o cinema nacional desde 1995 por meio do Edital de Cinema. No ano seguinte, criou um departamento específico para setores da economia da cultura, mudando o enfoque. “Deixou-se um pouco de lado a lógica do patrocínio para um apoio focado no desenvolvimento das cadeias produtivas da economia da cultura", explica a gerente.

Um dos objetivos do Decult é a criação de instrumentos financeiros para o setor audiovisual. Além da linha de empréstimos normal, existem instrumentos de renda variável por meio do aporte direto às empresas e de participações acionárias pela subsidiária BNDES Participações (BNDESPar) e, também, por meio dos fundos de investimentos (Funcines). Outro mecanismo são os recursos não reembolsáveis para o setor.

Em 2007, o banco criou o Programa para o Desenvolvimento da Economia da Cultura (Procult) que, até novembro de 2009, era dedicado exclusivamente à cadeia produtiva do audiovisual. A partir dessa data, o programa se expandiu para diferentes segmentos da economia da cultura. O Procult abrange todos os segmentos relacionados ao cinema, como salas exibidoras, distribuição, produção audiovisual e empresas prestadoras de serviços e de infraestrutura.

Estímulo à criação de salas

Patrícia Vieira afirmou que não há restrição orçamentária para apoio ao cinema nacional pelo BNDES. O orçamento do Procult até 2012 é de R$ 1 bilhão. Para o apoio à produção no Edital de Cinema os recursos são de R$ 12 milhões por ano. No caso dos Funcines, os recursos chegam a R$ 50 milhões por ano. No ano passado, a linha de financiamento do Procult teve desembolsos de R$ 20 milhões.

Em parceria com a Agência Nacional do Cinema (Ancine), o banco estruturou em 2010 o programa Cinema Perto de Você. “É um programa que tem condições financeiras muito favoráveis e está voltado para estimular a criação de salas de cinemas em cidades carentes de salas de exibição."

O Procult já financiava a abertura de salas de cinema desde 2006, mas segundo Patricia Vieira o novo programa veio se somar a ele, com foco na descentralização e expansão do parque exibidor. O Cinema Perto de Você tem até o momento dois projetos aprovados no Rio de Janeiro.

Outros cinco projetos estão em diferentes estágios no banco, envolvendo a abertura de salas de cinema também em São Paulo e no Sul do país. A expectativa, entretanto, é que o programa se estenda para as regiões Norte e Nordeste para atender as comunidades carentes.

Da Redação, com informações da Agência Brasil