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João Paulo II foi corrupto e leniente com pedofilia, diz escritor

A beatificação de Karol Wojtyla, o Papa João Paulo II, seis anos após sua morte, só não foi mais rápida que a da Madre Teresa de Calcutá — que ocorreu cinco anos depois do falecimento da religiosa, em 1997. Qual o motivo de tanta pressa?

Yallop

Quem responde é o britânico David Yallop, crítico voraz da Igreja Católica. Ele é autor dos livros Em Nome de Deus — que trata da misteriosa morte do Papa João Paulo I, 33 dias após ser proclamado chefe da Igreja — e Poder e Glória, sobre o lado obscuro do papado do recém-beatificado Karol Wojtyla.

Defensor da tese de que João Paulo I foi assassinado porque queria acabar com a lavagem de dinheiro feita por meio do Banco do Vaticano, ao qual investigou em seu livro, Yallop acredita que Karol Wojtyla, o seu sucessor no comando da Santa Sé, era corrupto, leniente com a pedofilia e extremamente político.

Católico, o autor britânico ainda persiste em sua fé e, mesmo discordando do conservadorismo do Vaticano, afirma que até frequenta igrejas, por mais que nunca vá a missa. “É estranho, mas eu acredito no poder da reza”, conta o escritor nesta entrevista a Manuela Andreoni, do jornal O Globo.

O Globo: O que o senhor achou da beatificação de Karol Wojtyla?
David Yallop: Pelos próprios parâmetros do Vaticano, está havendo muita pressa no julgamento disso. De fato, é a primeira vez desde que ele morreu que uma pessoa recebeu o benefício da remoção do que eles costumavam chamar de “advogado do diabo”, ou seja, um clérigo sênior que era nomeado para tomar uma posição bem crítica em relação a todas as provas que fossem reunidas para que qualquer pessoa seja considerada para a beatificação.

Mas (essa posição) foi abolida, ironicamente por João Paulo II. Então, ele se beneficiou de sua própria decisão. Aliás, este é o homem que criou mais santos no curso de seu papado, de 1978 até 2005, que todos os papas antes dele juntos.

O Globo: Por que essa pressa?
DY: Do momento em que ele se tornou papa, as mentiras e as desinformações começaram. É dito que ele se comportou de forma corajosa durante a Segunda Guerra Mundial e que salvou as vidas de muitos judeus. Isso não é verdade. E dito que ele sofreu muito durante a guerra, trabalhando em condições de escravo. Isso não é verdade — ele tinha um trabalho assalariado, pago pelo Reich…

Acho que o Bento XVI foi obrigado a fazer isso pelas pessoas a seu redor. Você lembra quando o João Paulo II morreu, teve aquela grande erupção na Praça de São Pedro pedindo para beatificá-lo imediatamente. Então, com menos de dois meses depois de sua morte, eles já haviam começado o processos. Não se tem notícias sobre algo assim! Mas eu acho que o que eles temiam eram pessoas como eu e das coisas que nós descobrimos e tornamos públicas.

O Globo: Em seu livro o senhor denuncia a corrupção no Vaticano. O que lhe faz pensar que João Paulo II fazia parte dela?
DY: João Paulo I, Albino Luciani, deixou foi uma série de ações que ele ia começar a implementar. Ele ia tirar pessoas do Banco do Vaticano, tirar alguns padres e cardeais corruptos. E ele disse ao seu secretário de Estado, um homem chamado Cardeal Jean Villot, o que ele pretendia fazer e o cardeal ficou muito chateado com isso e ele (João Paulo I) disse que era o papa e podia fazer o que quisesse, e foi para a cama e morreu.

E, se ele tivesse vivido, aquelas coisas seriam postas em seus lugares na manhã seguinte. Quando Wojtyla tomou poder, mais ou menos um mês depois, foi falado a ele muito precisamente que mudanças eram essas que Luciani queria fazer, mas ele não queria saber de prosseguir aquele caminho. Então, isso te diz alguma coisa sobre sua reação à corrupção.

O Globo: Por que ele não mexeu nisso?
DY: Ele tinha uma visão de que a Igreja não lavaria o seu linho sujo em público. Ele dizia que tinha um quarto especial em cada casa, falando solidamente sobre a Igreja Católica, onde as pessoas deveriam ir para discutir esses assuntos e que eles não deveriam deixar aquele quarto, o quarto secreto, como ele chamava.

O Globo: Mas João Paulo II é aclamado pela comunidade internacional…
DY: Não estou dizendo que este homem não fez boas ações, mas ele também fez más ações. Ele encobriu escândalos de pedofilia na Igreja. Foi primeiro chamado à atenção dele em 1984 ou 1985 por três homens — dois deles padres e outro advogado — que estavam muito preocupados com a pedofilia nos Estados Unidos. Eles haviam criado um documento, de cem páginas, do qual eu tenho cópia, que era o caminho que a Igreja deveria tomar em relação a isso.

Este não era um documento que pregava tolerância zero sobre o abuso de crianças. Este era um documento para proteger a Igreja, dizendo “olha, se você não tomar essas providências para impedir os padres que abusam de crianças, você vai quebrar financeiramente”. Eles previram que custaria à Igreja algo como US$ 2 bilhões. Falando em número hoje, custou ao Vaticano US$ 10 bilhões, para pagar às vítimas.

O Globo: Por que a aclamação de seu papado, então?
DY: No momento em que ele morreu, ele era um dos homens mais populares do planeta. O que me deixa muito chocado é que, se você pedisse para as pessoas que o ouviram falar para citar qualquer coisa que ele tenha dito, ou como os afetou… Era como se ela tivessem ido a um show de pop. Elas gostavam do espetáculo e depois seguiam com a vida. Lembravam aquele momento porque ele era um homem muito carismático. Ele podia falar mais de 50 línguas — não muito bem, mas o suficiente para falar “feliz Natal” —, mas não escutava em nenhuma. Era um homem muito dogmático.

O Globo: E o que o senhor acha do papado de Bento XVI até agora?
DY: Acho que ele prova que há vida após a morte, porque é como o Papa João Paulo II novamente. Um homem que é rígido, um homem que é tão hostil à homossexualidade, tão hostil aos contraceptivos, hostil a tantas coisas que o senso comum diz… Você tem que voltar ao início de tudo e dar outra olhada. Porque a maioria das coisas que eles apoiam e pregam não tem nada a ver com as origens da fé. Você não achará nada no Novo Testamento que dirá que você não pode ter um relacionamento homossexual.

O Globo: E o senhor é católico ainda assim?
DY: Eu me descreveria como um católico pensante, representante de uma minoria. A maioria deles não é pensante. Eles estão seguindo porque são treinados, condicionados quando crianças. Existem pedaços da fé, como um estilo de vida, e não estou falando da doutrina e dos dogmas, mas do que Cristo nos ensinou, que são maravilhosos. Mas estamos longe disso agora. Se Jesus Cristo fosse para uma reza agora nos portões de Sant'anna, em Roma, ele não conseguiria passar, seria preso.

O Globo: E você acredita em milagres?
DY: É estranho, mas acredito no poder da reza. Já vi funcionar. Mas o negócio dessa mulher que supostamente foi curada por João Paulo II… Acho que é uma fantasia. Talvez ela não tenha sido diagnosticada direito para começar.

O Globo: E ele vai conseguir seu segundo milagre, necessário para a canonização?
DY: Nada é mais certo.

Fonte: O Globo