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Oriente Médio: Obama e Netanyahu não estão tão distantes

A frase “As fronteiras de Israel e da Palestina deveriam ser estabelecidas sobre as linhas de 1967 com intercâmbios aceitos por ambos Estados” foi uma das mais comentadas do último discurso do presidente norte-americano Barack Obama sobre Oriente Médio e Norte da África.

Por Pierre Klochendler, na agência IPS

O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu entrou imediatamente em cena, mesmo antes de sua chegada a Washington para sua bastante antecipada reunião com Obama, e descartou plenamente a proposta como algo “indefensável”.

Foram inúmeras as notícias na imprensa israelense sobre uma nova crise de confiança entre os dois líderes e sobre uma “furiosa” troca de telefonemas entre Netanyahu e a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, às vésperas da cúpula. A linguagem corporal de Netanyahu e Obama ao aparecerem publicamente na Casa Branca não mostrava indícios de cordialidade.

O ministro israelense da Defesa, Ehud Barak, tentou acalmar os temores quando afirmou, no dia 20, que a cúpula foi “muito menos dramática do que parecia”, e assegurou que as diferenças entre os dois líderes não eram tão grandes. “Creio que os norte-americanos conhecem as nuances de nossas posições”, acrescentou.

Entretanto, nem as declarações de Obama nem as do porta-voz do governo de Israel nos Estados Unidos, indicando que se tratava de “diferenças entre amigos”, tranquilizaram a opinião pública israelense. Com esses amigos, quem precisa de inimigos, disseram muitos comentaristas. Mas, afinal, quais seriam essas “nuances de posição” que provocaram a ira do primeiro-ministro israelense? Como afirmou um desconcertado funcionário do Departamento de Estado, o discurso de Obama foi “bom para Israel e certamente bom para a visão que Netanyahu tem de Israel”.

Diretamente, Obama rechaçou os esforços em marcha para que a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas reconheça a Palestina como Estado independente em sua sessão de setembro. Além disso, exigiu dos palestinos que expliquem o acordo de reconciliação alcançado semanas atrás entre o partido secular Fatah e o Hamás (Movimento de Resistência Islâmica), e cobrou uma “resposta crível” para as “dúvidas legítimas” que surgem diante da negativa de a organização muçulmana reconhecer o Estado de Israel.

Obama também adotou a doutrina de segurança de Netanyahu para uma Palestina “não militarizada” e a ideia de uma “uma retirada progressiva” dos territórios ocupados. Como se não bastasse, o que o presidente não disse foi bom para o líder israelense. Não exigiu um novo congelamento na construção de colônias judias na Cisjordânia, apesar de Israel acabar de aprovar oficialmente a construção de 1.500 novas unidades habitacionais em Jerusalém oriental.

Também, nem mesmo mencionou a Iniciativa de Paz Árabe de 2002, defendida especialmente pela esquerda israelense, que propõe a retirada de Israel de todos os territórios ocupados, o reconhecimento do Estado palestino independente com Jerusalém oriental como capital, e uma “justa solução” para a situação dos refugiados palestinos. Então, o que indignou tanto Netanyahu?, perguntam alguns israelenses, assustados pela possibilidade de um crescente afastamento de Washington.

O primeiro-ministro parece que quis criar uma disputa artificial, rechaçando totalmente o princípio de “intercâmbio de terras” e o conceito de “Estado judeu”, manejados por Obama. O presidente havia alertado que se o governo de Netanyahu continuasse expandindo suas colônias teria pela frente “milhões de árabes” e custaria a Israel continuar sendo um verdadeiro “Estado judeu, a menos que houvesse um acordo de paz”.

Mas, em última instância, fixar as fronteiras sobre as existentes antes da Guerra dos Seis Dias, de 1967, com um “intercâmbio de terras”, permitiria a Israel em um futuro acordo reter grandes áreas de assentamentos que ocupou na Cisjordânia nas últimas quatro décadas. E se Israel é reconhecido “Estado judeu e pátria do povo judeu”, significa que todos os palestinos em seu território teriam de se mudar para zonas palestinas, uma demanda-chave israelense. “Não creio que Obama dissesse ser necessário regressar às fronteiras de 1967, mas sim que devemos iniciar a discussão com base nesses limites”, disse Barak.

Na realidade, o verdadeiro problema de Netanyahu está na sincronização dos elementos de um eventual acordo de paz. Obama sugeriu que as futuras negociações deveriam lidar inicialmente com os temas de segurança e a dimensão territorial do conflito. Outros assuntos, como “o futuro de Jerusalém e o destino dos refugiados palestinos”, seriam tratados em uma etapa posterior. Os israelenses temem que esta ordem crie nos fatos um acordo interino que nunca resolva os pontos. Enrolado com a bandeira nacional e com a direita apoiando, Netanyahu tenta desarticular este enfoque de Obama, procurando demonstrar sua pouca efetividade.

Afirma-se que um bom ataque é a melhor defesa, e Netanyahu implementou este célebre ditado. Sua quase ofensiva conduta na Casa Branca teve o objetivo de neutralizar a ampla visão norte-americana do direito de autodeterminação dos povos no Oriente Médio, com a esperança de reduzir a aspiração palestina à sua independência.

Fonte: Envolverde