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Maurício Dias: O desmonte da Infraero

Na terça-feira 31 de maio, a presidenta Dilma Rousseff anunciou a concessão de três aeroportos, Guarulhos, Viracopos (Campinas) e Brasília, que passarão ao controle societário da iniciativa privada, que, também, será responsável pela operação desses locais.

Por Maurício Dias*

Dois dias depois, foi anunciado que também serão privatizados os aeroportos do Galeão, no Rio de Janeiro, e Confins, em Belo Horizonte.

A presidenta Dilma Rousseff ignorou o documento elaborado pela Infraero e encaminhado às autoridades competentes pelo conselho de administração da empresa, que aniquila inteiramente o relatório da multinacional McKinsey, que, contratada pelo governo, elaborou o relatório Estudo do Setor do Transporte Aéreo no Brasil, que norteia as decisões tomadas agora.

Uma observação à parte: a iniciativa mostra um descaso absoluto com a engenharia nacional.

Se o governo supôs que os técnicos nacionais optariam pela manutenção do modelo (estatal) existente, deveria considerar que as empresas estrangeiras, como a McKinsey, estão inevitavelmente comprometidas com o processo de privatização.

O modelo da concessão prevê a entrega de 51% do controle dos aeroportos para os investidores privados. A Infraero ficará com 49%. Isso marca uma mudança de modelo que, na prática, significa a implosão da Infraero, uma das mais bem-sucedidas empresas aeroportuárias do mundo.

Criada na década de 1970, a Infraero administra hoje 67 aeroportos, 34 terminais logísticos de cargas, torres de controle e outros meios auxiliares de navegação aérea. Nesse estoque, formado também para atender a conveniências políticas, é possível notar que a empresa administra aeroportos pequenos como o Júlio César, em Belém (PA), com 30 mil passageiros por ano, e gigantes como Cumbica, em Guarulhos (SP), com 20 milhões.

A concessão muda radicalmente a lógica do sistema implantado no Brasil, que, na verdade, reflete o modelo de países de dimensões continentais, como o nosso, nos quais o serviço aéreo é um meio essencial para o transporte de pessoas e mercadorias. Isso significa que o estado não pode abrir mão do controle do sistema. É o que o Brasil está fazendo agora.

Curioso é que os nossos “patriotas”, que olham para os Estados Unidos com o sentimento de que admiram a sociedade perfeita, desconheçam que, lá, o poder público controla o sistema aeroportuário.

Todos os grandes aeroportos do mundo, excetuando Londres e Cingapura, são controlados e operados por empresas públicas. No Brasil, isso permite que os aeroportos lucrativos, como os do Rio e São Paulo, financiem aqueles de pequeno movimento, como Londrina (PR) e Cuiabá (MT), que, no entanto, são também essenciais para a economia nacional. Os lucrativos financiam os não lucrativos.

Pergunta: a iniciativa privada sustentará isso? Claro que não. E isso faz sentido. Mas será justo os empresários ficarem com o filé e o Estado com o osso?

O sistema federal que, a partir de agora, começa a ser desmontado em benefício das regras ortodoxas da privatização seguiu cegamente a seleção feita pela McKinsey, que se norteou somente pelos grupos interessados na privatização.

Tudo isso foi precedido pelas tentativas de sufocar a Infraero e provocar pequenos escândalos inspirados pelos interesses privados, em detrimento das necessidades dos usuários. Um exemplo: as tarifas portuárias nos custos operacionais das empresas aéreas, de 1,5%, estão bem abaixo da média internacional, de 3,8%.

*Maurício Dias é jornalista, editor especial e colunista da edição impressa de CartaCapital. A versão completa de sua coluna é publicada semanalmente na revista. [email protected]