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Itália junta-se ao clube da dívida

Um conflito de interesses levou a um aparente desentendimento o primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, e o seu ministro das Finanças, Giulio Tremonti, que defende a adoção de medidas draconianas como as tomadas na Grécia e em Portugal, para que o governo local "se livre" do enorme peso da dívida italiana.

Com efeito, não foram o deficit orçamental, relativamente modesto, nem a dívida privada, igualmente discreta, que levaram o ministro das Finanças, Giulio Tremonti, a propor um plano de redução da despesa calculado em 40 bilhões de euros e que levaram o Governo italiano a aprovar esse plano em 30 de junho.

Os calcanhares de Aquiles são, neste caso, o crescimento econômico anêmico (0,1% no primeiro trimestre) e uma dívida acumulada que, na escala europeia, fica logo atrás da grega: 120% do PIB. Com o plano, Tremonti visava equilibrar o orçamento até 2014 e escapar à degradação do rating italiano já explicitamente ameaçado pelas agências Moody's e Standard and Poor's.

A entrevista que fez estragos

A crise precipitou-se com uma entrevista do primeiro-ministro Silvio Berlusconi que publicamente admoestou o seu ministro das Finanças por não ter suficientemente em conta aquilo que constitui, segundo o mesmo Berlusconi, a essência da política: a luta pelo favor do eleitorado. E não hesitou em afirmar que ele, Tremonti, "julga que é um gênio e todos os outros são estúpidos".

Nas entrelinhas desta censura dirigida ao seu ministro, logo leram "os mercados" um sinal de que o plano de cortes orçamentais de Tremonti seria suavizado e diluído. Pouco importava que o plano viesse recolhendo veementes declarações de apoio nas instâncias internacionais e nomeadamente nessa instância para muitos suprema que é a chanceler alemã, Angela Merkel.

O fato é que os investidores, após publicação da entrevista, imediatamente deram sinais de insegurança quanto à aprovação do plano. E assim foi a passada sexta feira, na Bolsa de Milão, uma catástrofe para os títulos italianos.

Hoje, as medidas tomadas não impediram que os mesmos valores continuassem a cair cerca de 4% na bolsa de Milão. Por contágio ou por coincidência, outras bolsas sofreram perdas substanciais: à cabeça, a de Lisboa com uma desvalorização semelhante à de Milão, depois Paris com 2,71%, Frankfurt 2,33%, Nova Iorque 1,5%, Londres 1,03%.

Quanto às taxas de juro da dívida italiana a dez anos, essas tinham hoje subido para 5,4%.Também aí, o fenômeno assumia contornos internacionais: as taxas da dívida espanhola a dez anos atingiam hoje uns inéditos 6%.

Alarme na Itália

O economista Marco Vialli, do banco UniCredit, citado pela Agência France Press (AFP), dava voz a um receio generalizado: "Esta vaga especulativa toma a Itália como alvo quando emergem algumas dúvidas sobre os objectivos orçamentais". Vialli acrescentou ainda que o plano contém a contradição de ser proposto por este Governo, e de a a maioria das suas medidas ter de ser executada, em 2013 e 2014, pelo próximo.

Para piorar ainda mais o quadro de conjunto, o ministro Tremonti está agora envolvido em acusações de corrupção, que não o tornam um modelo de virtudes facilmente oponível ao contestado primeiro-ministro. Dando conta da profundidade da descrença semeada e colhida pela nomenklatura do Governo, o presidente da República, Giorgio Napolitano, apelou hoje à "coesão nacional".

A oposição do PD (Partido Democrático) respondeu a Napolitano pela voz de Enrico Letta, com a promessa de não obstruir a aprovação do plano antes das férias de verão. Mas o afã colaboracionista da oposição contrasta com as reservas ruidosamente manifestadas no campo do próprio Governo proponente do plano, nomeadamente na entrevista de Berlusconi.

Eurozona tenta contenção

Vários líderes europeus fizeram hoje menção à busca de uma solução aos problemas da dívida da Grécia, para impedir que a crise se estenda a outros países, como Itália e Espanha.

"Hoje, mais que nunca, precisamos de uma resposta europeia da Zona Euro", disse o presidente do governo espanhol, José Luís Rodríguez Zapatero, em uma entrevista coletiva dada em Madri.

Zapatero pediu aos principais responsáveis da União Europeia que se encontre uma solução rápida e precisa para evitar o contágio da crise, que, na opinião de especialistas, poria em perigo a união monetária.

A eurozona aprovou na semana passada um segundo plano de resgate para salvar Atenas da falência, mas o programa se encontra estancado, diante da ausência de um acordo para que os bancos e as empresas seguradoras paguem a parte da fatura da dívida grega.

A esta situação foi somada, na sexta-feira, a queda das bolsas na Itália, elevando os rumores de que o país possa sofrer também as turbulências financeiras.

Em uma tentativa de acalmar os ânimos, especialistas consideraram que a Itália "não corre" os mesmos riscos que Grécia, Portugal ou a Irlanda, porque a economica italiana pesa, por si só, mais que o dobro da dos três países resgatados. Entretanto, disseram que a situação pode ser considerada como "séria".

Da redação, com agências