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Michael Hudson: A política do engano de Obama

Duplicidade. As sementes da coletiva de imprensa demagógica do presidente Obama na quinta-feira (6) foram plantadas no último verão, quando ele designou os 13 membros de extrema-direita do Comitê encarregado de resolver o óbvio e inevitável impasse do orçamento no Congresso.

Por Michael Hudson

Obama forjou assim uma política anti-trabalho que corta a Segurança Social, o Medicare e a Medicaid, além de utilizar as poupanças para salvar bancos de ainda mais empréstimos que se tornarão ruinosos em resultado do programa de austeridade estilo FMI que democratas e republicanos concordaram em apoiar.

O problema enfrentado pelo sr. Obama é bastante óbvio: Como pode ele manter o apoio de moderados e independentes (ou, como os chama a Fox News, socialistas e anti-capitalistas), estudantes, trabalhadores, minorias e outros que fizeram forte campanha por ele em 2008? Ele enganou-os duplamente – suavemente, com um sorriso gentil e contemporizando com um conversa balbuciante, mas com uma determinação de ferro de manipular a política monetária federal e fiscal em favor dos seus maiores contribuidores da campanha eleitoral: a Wall Street e interesses especiais variados – o núcleo de operadores da Rubinomics e Clintonomics do Partido Democrata, mais suaves vestígios da administração Bush tal como Tim Geithner, sem mencionar quase-factotums de Cheney no Ministério da Justiça.

A solução do presidente Obama foi fazer o que faz qualquer político demagogo: Vir a público com discursos de campanha estridentemente populistas que não têm possibilidade de se tornarem a lei do Estado, enquanto silenciosamente dar aos seus contribuidores de campanha aquilo pelo que pagaram: dádivas para a Wall Street, cortes fiscais para a riqueza (eufemisticamente chamadas "isenções" fiscais e contabilidade por referência (mark-to-model accounting), mais um acordo em contar o seu rendimento como "ganhos de capital" tributado a uma taxa muito mais baixa).

Assim, aqui está o trato que a liderança democrata fez com os republicanos. Os republicanos lançarão alguém da sua gama atual de perdedores garantidos, permitindo ao sr. Obama concorrer como a "voz da razão", como se de alguma forma representasse as camadas médias dos Estados Unidos. Isto abrirá caminho na eleição de 2012 para um segundo mandato se ele adotar o seu programa – um conjunto de regras pagas pelos principais contribuidores de campanha a ambos os partidos.

As políticas do presidente Obama não têm sido a voz da razão. Elas estão mesmo mais à direita do que George W. Bush podia ter conseguido. Um presidente republicano teria pelo menos enfrentado um Congresso democrata que bloquearia a espécie de programa que o sr. Obama impôs. Mas os democratas parecem paralisados quando se trata de resistir a um presidente que concorre como um democrata ao invés dos Tea Parties de que ele parece estar tão próximo na sua ideologia.

Assim, eis o que o Comitê dos 13 porá em jogo. (1) Dado o acordo de que se os republicanos e democratas "não" concordarem com o estratagema da "criação de emprego" morto antes de chegar ao hospital; (2) e a declaração do líder republicano da Câmara, Boehner, de que o seu partido rejeitará a retórica populista que o presidente Obama está a apregoar nestes dias, (3) então o Comitê conseguirá a sua oportunidade para por em ação a sua tesoura e cortar despesas sociais federais em coerência com a ideologia que professa.

O presidente Obama assinalou isso com muita antecipação, no princípio da sua administração quando nomeou a sua Comissão para a Redução do Deficit chefiada pelo antigo republicano senador Simpson e Bowles, conselheiro da administração Clinton, destinada a recomendar como cortar a despesa social federal, enquanto dava ainda mais dinheiro à Wall Street. Ele confirmou suspeitas de uma traição ao renomear o lobista do sistema financeiro Tim Geithner para o Tesouro, e Ben Bernanke, com visão afunilada em túnel, como chefe do Federal Reserve Board.

Mas na quarta-feira, 5 de outubro, o presidente tentou mostrar o movimento OccupyWallStreet como se fosse um apoio dos seus esforços. Ele pretendeu aprovar uma lei a favor dos consumidores, a fim de limitar a fraude bancária, como se não fosse ele que tivesse rejeitado Elizabeth Warren a conselho do sr. Geithner – o qual parece estar enraizado como o homem do saco de dinheiro junto aos contribuidores de campanha da Wall Street.

Pode o presidente Obama escapar desta? Pode ele pular para a frente da procissão e apresentar-se como um amigo dos trabalhadores e dos consumidores enquanto os seus nomeados apoiam os bancos de Wall Street e o seu Comitê de 13 aguarda a ordem de executar sua função designada, de guilhotinar a lei de Segurança Social?

Quanto visitei o sítio OccupyWallStreet , na quarta-feira, ficou claro que o desgosto com o sistema político chegou a tal profundidade que não há qualquer conjunto simples de exigências que possa consertar um sistema tão fundamentalmente avariado e disfuncional. Ninguém pode remendar um regime que está a empobrecer a economia, a acelerar hipotecas, a empurrar orçamentos de estados e cidades para déficits ainda mais profundos e a forçar cortes em despesas sociais.

A situação é muito semelhante à da Islândia e da Grécia. Governos já não representam o povo. Eles representam interesses financeiros predatórios que estão a empobrecer a economia. Isto não é democracia. É oligarquia financeira. E oligarquias não dão voz às suas vítimas.

Assim, a grande questão é: para onde vamos nós a partir daqui? Não há caminho viável dentro do modo como a economia e o sistema político estão estruturados atualmente. Qualquer tentativa de proposta de um plano claro de "conserto" pode apenas sugerir ataduras para o que aparenta ser uma ferida político-econômica fatal.

Os democratas estão tão infectados pela doença quanto os republicanos. Outros países enfrentam um problema semelhante. O regime social-democrata na Islândia age como o partido dos banqueiros e a taxa de aprovação do seu governo caiu para 12%. Mas eles recusam-se a renunciar. Assim, no princípio da semana passada, eleitores trouxeram tambores para a sua própria Ocupação em frente ao Althing [parlamento] e rufaram quando o primeiro-ministro começou a falar, para abafar a sua defesa dos banqueiros (e dos banqueiros abutres estrangeiros, além disso!).

Tal como na Grécia, os manifestantes estão a mostrar aos bancos estrangeiros que qualquer acordo que o Banco Central Europeu faça para salvar franceses e alemães detentores de títulos à custa de aumentos de impostos sobre o trabalho grego (mas não sobre a propriedade e riqueza grega) não pode ser visto como democraticamente aprovado. Portanto, quaisquer dívidas que sejam reclamadas, e quaisquer imóveis ou empresas públicas dadas aos poderes credores para liquidação, sob condições de agonia, podem ser revertidas, uma vez que aos eleitores seja permitido exprimir de forma democrática se querem impor uma década de pobreza ao país e forçar a emigração.

Este é o espírito de desobediência civil que cresce neste país. É uma quadratura – ou seja, um problema sem solução. Tudo o que se pode fazer sob tais condições é descrever a doença e os seus sintomas. A cura seguir-se-á logicamente do diagnóstico. O papel de OccupyWallStreet é diagnosticar a polarização financeira e a corrupção do processo político que se estende até a Corte Suprema, à Presidência e ao Comitê dos 13 que dentro em breve, quando se acabarem suas aalegres pretensões atuais, será tristemente notório.

Fonte: Global Research