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Bruno Peron: Celac e a integração na América

Trinta e dois chefes de governo da América, com exclusão de Canadá e Estados Unidos, aprofundam os ideais de integração do “Grupo do Rio”, foro que existe desde dezembro de 1986, e da Cúpula da América Latina e o Caribe, que teve o primeiro foro em dezembro de 2008 na Bahia com o tema “Integração e Desenvolvimento”.

por Bruno Peron*

A Celac (Comunidade de Estados da América Latina e do Caribe) emergiu em fevereiro de 2010 durante um encontro de estadistas na Cúpula da América Latina e o Caribe em Playa del Carmen, México. Deste paraíso caribenho à dura realidade social de nossos países, o organismo intergovernamental recém-nascido pressagia mais uma ação a favor da reformulação das relações continentais e do sistema internacional.

Menciono intencionalmente “ação” em lugar de “projeto” porque finalmente reunimos elementos para transitar da proposta à prática dentro do conceito atávico de “integração”.

Este mecanismo integrativo mal nasce e há os que desqualificam sua missão como meramente declarativa, destituída de pragmatismo e fruto de projetos políticos particulares que pouco interessariam a nações de economias protuberantes, como Brasil e Chile. É mister começar pelos contras antes de enumerar os prós a fim de afirmar minha visão contrária a estas posturas prévias e meu otimismo em relação a estes organismos “nosso-americanos”.

Embora alguns dos estadistas da Celac se acanhem de reconhecer a finalidade do organismo devido a relações (por exemplo com tratados de comércio livre ou auxílio humanitário) que mantêm com países da América do Norte, a Celac surgiu precipuamente como alternativa às agendas e deliberações da OEA (Organização de Estados Americanos).

Precedentemente à criação da ALlba (Alternativa Bolivariana para os Povos de Nossa América), a Unasul (União das Nações Sul-americanas) e a Celac, a OEA havia sido a única organização intergovernamental de pretensão continental na América desde 1948. Nossos países estiveram, portanto, vulneráveis a discutir e acatar ditames oriundos de um organismo com sede em Washington, D. C.

Algumas tentativas de nomear a emergência dos organismos latino-americanos e caribenhos acompanham a dificuldade de institucionalização e aprofundamento das propostas. Há os que se arriscam aos neologismos do regionalismo como ao referir-se ao nosso processo como “pós-liberal” ou “pós-neoliberal”, no entanto alguns governantes adeptos do “Estado mínimo” apoiaram a criação da Celac.

Continua sendo difícil obter consenso nas definições programáticas e principalmente nos planos de ação destes organismos, o que não nos impede de reforçar os denominadores comuns na luta por uma inserção mundial mais autônoma e, já que o tema enfoca a América, a definição de agenda própria.

É fato que boa parte das reuniões entre estadistas no âmbito de organismos intergovernamentais redunda em discursos formais e declarações de boas intenções, porém vejo a Celac mais como continuidade de um projeto que um broto que surge do nada. A crise financeira mundial sinalizou para que a América Latina e o Caribe tenham cautela com a reformulação das estratégias continentais da América do Norte por perder espaço comercial com o Sul.

Apesar de o “bolivarismo” venezuelano ser um dos principais sustentáculos da Celac, a Venezuela mantém petro-relações proveitosas com Estados Unidos e não permite que os discursos oficiais firam o grande negócio que traz retorno orçamentário às políticas sociais. Cuba também depende dos investimentos de empresas estadunidenses e das remessas financeiras de cubanos que vivem na América do Norte.

A Celac não anula o papel da OEA, mas enfraquece a influência continental desta organização na medida em que descentraliza as discussões e as deliberações que antes só se faziam em seu âmbito. A recusa de Cuba em 2009 ao convite de ingresso à OEA reforça a importância de desenvolvermos organismos próprios e não incidir em falácias.

A crítica mais pertinente que se faz à Celac e aos demais organismos latino-americanos e caribenhos é a de como estimular a participação cidadã de modo que a sociedade envolva-se amplamente na definição de agendas regionais de debates e formulação de políticas.

É preciso reduzir a distância entre portadores de direitos cívicos e detentores do poder de deliberar em foros e reuniões de organismos intergovernamentais. O impasse reside em como despertarmos à participação direta e livre da crença em representantes, por mais que jurem promessa de fidelidade aos interesses da maioria.

Fonte: site WWW.brunoperon.com.br