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Albano Nunes: Conselho Europeu, contradições e luta

As decisões do Conselho Europeu de 8 e 9 de dezembro são particularmente graves para Portugal. A sua consumação tornaria este um país tutelado. Trata-se de uma situação inaceitável que o Partido Comunista Português combaterá com energia, procurando unir e mobilizar quantos aspiram a um Portugal livre e soberano, um Portugal com futuro.

Por Albano Nunes*, no jornal Avante!

Como noutros momentos da nossa história a questão nacional está no primeiro plano do combate político. Os comunistas portugueses não permitirão que a bandeira do patriotismo, inseparável de tantos avanços libertadores do povo português, caia nas mãos da direita para ser instrumentalizada e alimentar o nacionalismo reacionário e fascista que está se alastrando na Europa.

Pela própria natureza de classe da UE e a profunda crise em que se debate, este Conselho Europeu não deu, nem podia ter dado resposta ao flagelo do desemprego ou à profunda recessão que se anuncia para o “espaço europeu”. A “resposta” encontrada foi uma vez mais a de prosseguir e intensificar as políticas de “austeridade” e “ajustamento estrutural” que, da Grécia à Itália, passando por Portugal, estão golpeando duramente os direitos conquistados pelos trabalhadores ao longo do século 20. É nesta dinâmica que se insere o “pacto orçamental” com a imposição, que se pretende constitucionalizar, de um limite de 0,5% para o déficit, e os mecanismos de controle e sanção que visam assegurá-lo. O fato de estarmos perante o desenvolvimento lógico de Maastricht e a concretização e institucionalização do Pacto Euro Mais, do Semestre Europeu, da chamada “Governação europeia”, só sublinha a sua gravidade.

Em torno deste Conselho desenvolveram-se movimentações políticas e diplomáticas de grande envergadura que não é ainda possível avaliar com segurança, mas que refletem sérias contradições entre os grandes potentados econômico-financeiros e as grandes potências capitalistas, contradições que a crise tende a agudizar. A Alemanha, com a França pela mão, afirma com arrogância as suas ambições imperialistas, o que é particularmente visível nos resultados da Cúpula. A Grã-Bretanha, com Cameron a braços com o crescimento do descontentamento popular e o tradicional “eurocenticismo” britânico, joga forte, criando novas complicações no processo de integração capitalista europeu, senão mesmo na (contraditória) articulação euro-atlântica. Os EUA desenvolvem frenética pressão sobre o Euro e a UE, com a ameaça da Standard & Poors de retirar o famoso AAA à própria Alemanha, as frequentes declarações de Obama sobre o que a UE deve ou não fazer, o périplo do Secretário do Tesouro norte-americano a Berlim, Paris, Roma e Madrid na véspera do Conselho.

Mesmo sem falar do papel da China e de outras “potências emergentes” ou da hiper-atividade do FMI (dominado pelos EUA) nas questões europeias, a verdade é que está em desenvolvimento um complexo processo de arrumação de forças com implicações inevitáveis na situação internacional. A compreensão deste processo é tanto mais importante quanto a tendência é para o aprofundamento da crise capitalista e se aceleram preparativos de guerra nomeadamente no Médio Oriente e Ásia Central. O adiamento de uma importante reunião França/Grã-Bretanha sobre cooperação militar (Le Monde, 3 de Novembro), cooperação que desde o Tratado de S. Malo é estreitíssima (veja-se a agressão à Líbia), não pode deixar de ter significado.

Nas notícias sobre o Conselho não há uma linha sobre a luta de massas contra a ofensiva do grande capital, sobre a persistente luta na Grécia ou em Portugal, as importantes ações na Itália, Espanha ou França, a maior greve na Grã-Bretanha desde 1926, ou as recentes manifestações na Bélgica. Mas ninguém acreditará que o crescimento do protesto popular não tenha pesado no ambiente da Cimeira. Certamente que pesou e pesará ainda mais no futuro. A situação é muito complexa e perigosa, mas a classe dominante não tem as mãos livres para a sua política exploradora e agressiva.

* Albano Nunes é membro da direção do Partido Comunista Português