Suspenso, juiz espanhol critica vitória da impunidade
O juiz Baltasar Garzón, suspenso ontem por 11 anos do exercício da profissão pelo Supremo Tribunal espanhol, divulgou um duro comunicado em que desacredita todo o sistema judicial do país. Ele disse que vai utilizar todas as vias legais possíveis para contestar a sentença.
Publicado 10/02/2012 12:26

O magistrado, mundialmente conhecido por ter prendido o ex-ditador chileno Augusto Pinochet, declarou recusar o julgamento que o puniu por autorizar escutas telefônicas durante uma investigação de corrupção.
Garzón, de 56 anos, qualificou a decisão do Supremo de "injusta e predeterminada". "Este julgamento impede a investigação de casos de corrupção e de outros delitos relacionados, abre espaço à imunidade e viola a independência dos juízes da Espanha", diz um comunicado enviado por Garzón à mídia. "Meus direitos foram sistematicamente violados", completou.
A sentença do Supremo espanhol não dá margem a recurso, mas seu advogado disse que pode recorrer ao tribunal europeu, em Estrasburgo. Além da suspensão que praticamente põe fim à carreira do juiz, o magistrado foi condenado a pagar multa de 2.500 euros, cerca de 5.700 reais.
Garzón também é julgado em outro processo sobre vítimas do franquismo. Dois grupos de extrema-direita denunciaram o magistrado por ele ter tentado investigar o destino de mais de 114.000 desaparecidos durante o franquismo, ao final da Guerra Civil espanhola (1936-1939), apesar de uma lei de Anistia aprovada em 1977. Para Garzón, nenhuma anistia pode acobertar crimes contra a humanidade. A sentença sobre este caso será divulgada na semana que vem.
Ontem, após o anúncio da suspensão, centenas de pessoas saíram nas ruas de Madri em solidariedade a Garzón. Já se esperava que a condenação seria dura, mas a decisão tomada por unanimidade dos juízes provocou indignação nos partidos de esquerda.
Muitos manifestantes carregavam cartazes com frases como "Tribunal Supremo, suprema impunidade", "Temos memória, queremos Justiça" e "Os crimes do franquismo não prescrevem".
Em defesa de Garzón também saiu sua filha María, que tornou pública um carta aberta. No texto, ela pede uma "Justiça de verdade" e diz esperar que a decisão não se volte contra a sociedade.
"Aqueles que durante anos insultaram e disseram mentiras sobre meu pai conseguiram seu objetivo, seu troféu", escreve María, de 26 anos.
Carreira
O juiz Baltasar Garzón construiu uma sólida reputação por ter desarticulado o grupo terrorista basco ETA, ter desmantelado redes de narcotráfico e de corrupção como o chamado caso Gurtel, o maior escândalo de financiamento ilegal de partido político na Espanha.
Escutas telefônicas autorizadas pelo juiz, que levaram à sua condenação agora, demonstraram que políticos do Partido Popular espanhol, hoje no governo da Espanha, manipularam recursos ilícitos. No exterior, Garzón ficou conhecido por ter prendido Pinochet, em Londres, e ter desmascarado crimes contra a humanidade cometidos pelas ditaduras latino-americanas.
Uma pesquisa divulgada hoje revela que 61% dos espanhóis consideram que Garzón é vítima de perseguição.