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Filipe Diniz: o atoleiro e o fundamentalismo

O New York Times (NYT) dedica o editorial de 18 de fevereiro ao Afeganistão. Embora a intenção não seja necessariamente essa, cada linha desse editorial descreve o atoleiro em que o imperialismo ali se meteu. Em dez anos, 1700 americanos mortos (e quantas dezenas de milhares de afegãos?), 450 milhares de milhões de dólares enterrados.

Por Filipe Diniz*

Para o NYT o Nobel da Paz Obama portou-se melhor que o falcão George Bush. Obama enviou mais 50 mil militares para o Afeganistão, e intensificou o número de operações especiais (leia-se assassínios) que conduziram à morte de Bin Laden e de dezenas de "chefes Al Qaeda e taliban".

Ao fim destes anos uma realidade impõe-se: quando os EUA saírem, o Afeganistão implodirá. Nem existe governo, nem sistema bancário, nem serviços básicos, nomeadamente rede de distribuição de energia elétrica. A corrupção é generalizada. "Projectos de desenvolvimento"que envolveram enormes quantias fracassaram.

Dezenas de bilhões de dólares para a criação de um exército afegão e de uma polícia afegã. Hoje constituem 330 000 efetivos que "não merecem qualquer confiança" e custam 11 bilhões de dólares anuais. A Organização da Tratado do Atlânico Norte (Otan) e o Pentágono querem reduzi-los a 230 000. O que suscita um problema, que mostra bem o calibre desse "exército" e dessa "polícia": é que remeter para a rua 100 000 destes efetivos pode ser "desastroso".

O Afeganistão não tem condições para suportar essas forças, mesmo com dimensões mais reduzidas. O NYT acha que os EUA não devem suportá-las sozinhos, e considera que a administração Obama e o Pentágono devem aproveitar a cúpula de maio da Otan, em Chicago, para pressionar os aliados a comprometerem-se na partilha da fatura, "e a garantir que esse compromisso será cumprido". Logo se verá. 

Reconhecendo que não dispõem de condições para derrotar militarmente os taliban, negociarão com eles. As condições são poucas, incluindo a eventual deposição de armas e aceitação da Constituição afegã, com direitos para as mulheres.

A propósito: a afirmação de que "a função essencial da mulher é a educação dos filhos" não foi proferida por um taliban. Foi proferida por um novo cardeal da Igreja católica.

*Filipe Diniz é jornalista.

Fonte: Jornal Avante!