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Irã elogia declarações de Nobel de Literatura contra Israel 

O governo do Irã elogiou neste sábado (7) o Prêmio Nobel de Literatura alemão Günter Grass por ter denunciado, em um poema, o direito atribuído a Israel de atacar militarmente o polêmico programa nuclear iraniano.  

Em uma carta dirigida ao "distinto escritor Günter Grass", o vice-ministro da Cultura Javad Shamaqdari homenageia o alemão por ter "dito a verdade" e manifestou a esperança de que isto "despertará a adormecida consciência ocidental".

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Grass provocou fortes reações na Alemanha e em Israel depois de dizer, em um poema publicado no jornal Süddeutsche Zeitung, que o Estado hebreu ameaça a paz.

"Li seu poema de advertência, que manifesta magnificamente sua humanidade e seu senso das responsabilidades", escreve Shamaqdari na carta. "O fato de dizer a verdade não pode deixar de despertar a consciência ocidental adormecida e silenciosa. Os escritores, com sua única pena, podem impedir as tragédias melhor que as armas", completa o texto.

Alemães apoiam Günter

As tradicionais "marchas de Páscoa", manifestações pela paz organizadas em toda a Alemanha, reuniram neste sábado (7) milhares de participantes, alguns dos quais expressaram seu apoio ao poeta.

"Günter Grass tem razão" ou "Obrigado, Günter Grass" diziam alguns cartazes exibidos em manifestação em Bremerhaven (norte). "Foram feitos discursos (em apoio a Günter Grass)" como em Stuttgart, onde se reuniram mil pessoas, declarou Willi van Ooyen, porta-voz da célula de coordenação das "marchas de Páscoa".

Mil pessoas desfilaram em Berlim, 400 em Munique e uma centena em Leipzig (leste), segundo os organizadores. "Ameaças e preparativos de guerra criam um ambiente político contaminado", explicou Ooyen. Ataques preventivos, como os que Tel Aviv se reserva o direito de realizar diante da ameaça que o programa nuclear iraniano representa, em sua opinião, "são crimes" e, por isso, desprezíveis.

Conheça o poema de Günter Grass, traduzido da versão espanhola.

O que deve ser dito

Günter Grass

Porque guardo silêncio há demasiado tempo
sobre o que é manifesto
e se utilizava em jogos de guerra
em que no fim, nós sobreviventes,
acabamos como meras notas de rodapé.

É o suposto direito a um ataque preventivo,
que poderá exterminar o povo iraniano,
conduzido ao júbilo
e organizado por um fanfarrão,
porque na sua jurisdição se suspeita
do fabrico de uma bomba atômica.

Mas por que me proibiram de falar
sobre esse outro país [Israel], onde há anos
– ainda que mantido em segredo –
se dispõe de um crescente potencial nuclear,
que não está sujeito a nenhum controle,
pois é inacessível a inspeções?

O silêncio geral sobre esse fato,
a que se sujeitou o meu próprio silêncio,
sinto-o como uma gravosa mentira
e coação que ameaça castigar
quando não é respeitada:
“antissemitismo” se chama a condenação.

Agora, contudo, porque o meu país,
acusado uma e outra vez, rotineiramente,
de crimes muito próprios,
sem quaisquer precedentes,
vai entregar a Israel outro submarino
cuja especialidade é dirigir ogivas aniquiladoras
para onde não ficou provada
a existência de uma única bomba,
se bem que se queira instituir o medo como prova… digo o que deve ser dito.

Por que me calei até agora?

Porque acreditava que a minha origem,
marcada por um estigma inapagável,
me impedia de atribuir esse fato, como evidente,
ao país de Israel, ao qual estou unido
e quero continuar a estar.

Por que motivo só agora digo,
já velho e com a minha última tinta,
que Israel, potência nuclear, coloca em perigo
uma paz mundial já de si frágil?

Porque deve ser dito
aquilo que amanhã poderá ser demasiado tarde [a dizer],
e porque – já suficientemente incriminados como alemães –
poderíamos ser cúmplices de um crime
que é previsível,
pelo que a nossa cota-parte de culpa
não poderia extinguir-se
com nenhuma das desculpas habituais.

Admito-o: não vou continuar a calar-me
porque estou farto
da hipocrisia do Ocidente;
é de esperar, além disso,
que muitos se libertem do silêncio,
exijam ao causador desse perigo visível
que renuncie ao uso da força
e insistam também para que os governos
de ambos os países permitam
o controle permanente e sem entraves,
por parte de uma instância internacional,
do potencial nuclear israelense
e das instalações nucleares iranianas.

Só assim poderemos ajudar todos,
israelenses e palestinos,
mas também todos os seres humanos
que nessa região ocupada pela demência
vivem em conflito lado a lado,
odiando-se mutuamente,
e decididamente ajudar-nos também.

Com informações de agências