Nos 40 anos da Guerrilha do Araguaia, Câmara rende homenagem

O Vereador George Câmara (PCdoB) realizou hoje, 11 de abril, um pronunciamento na tribuna do Plenário Érico Hackradt na Câmara Municipal de Natal.

Cartaz Araguaia - CDM/Fundação Mauirício Grabois
George considerou fundamental rememorar um episódio fundamental para a história de lutas a favor da democracia em nosso país: a Guerrilha do Araguaia. Completados 40 anos (1972 – 2012) a heróica resistência à famigerada ditadura representada na luta de bravos guerrilheiros jamais deve ser esquecida. Ao discursar, George leu na íntegra o texto produzido pelo jornalista e também pesquisador da Fundação Maurício Grabois, Osvaldo Bertolino – do blog O outro lado da notícia.

Abaixo o texto na íntegra:



Araguaia 40 anos: ideais da Guerrilha vivem e vicejam
Por Osvaldo Bertolino
A passagem dos 40 anos do início dos combates no Araguaia, em 12 de abril, será lembrada em diferentes pontos do Brasil. Em São Paulo haverá um evento dia 14. O momento é de reflexão sobre o significado da heróica resistência dos guerrilheiros que lutaram nas selvas amazônicas em defesa da liberdade, da nação e dos direitos do povo brasileiro.

A Guerrilha do Araguaia representou um ponto de inflexão na história recente do Brasil. A partir dela, houve uma viragem na correlação de forças da conjuntura do regime golpista de 1964. Somados a outras ações ousadas de resistência democrática, os combates no Sul do Estado do Pará abriram caminho para que se formasse um movimento mais coeso e consistente de enfrentamento à ditadura. Ao mesmo tempo em que a repressão se manifestava de maneira bárbara, mesmo após o período mais sangrento do regime, as manifestações contra o arbítrio cresciam. Os assassinatos de Wladimir Herzog, Manoel Fiel Filho, Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Franco Drummond ocorreram já em meio a protestos destemidos contra o regime discricionário.

A crescente mobilização popular levou à decretação da Anistia em 1979, à derrota da ditadura em 1985 e à Assembléia Nacional Constituinte de 1988. Após um período de revés, quando triunfou o neoliberalismo, as forças políticas que expressam a resistência democrática abriram um novo ciclo no país com a eleição de Luis Inácio Lula da Silva para a Presidência da República — hoje continuado com a presidenta Dilma Rousseff. As bandeiras que mobilizaram a luta contra a ditadura estão nas mãos dos democratas e patriotas continuadores da luta dos que deram a vida no combate ao regime de 1964. Por outros meios, defendem os mesmos ideais, as mesmas aspirações, os mesmos princípios.

Quando se diz que o Araguaia vive e viceja, está se dizendo que as idéias que mobilizaram aquele grupo de bravos brasileiros estão nas raízes que formam o povo brasileiro. Em outros tempos, elas foram defendidas por heróis como Tiradentes, Frei Caneca e Luis Carlos Prestes — para citar alguns. Hoje elas se expressam em iniciativas como as que lutam por outro ciclo civilizatório, que pavimente o caminho para a superação do atual estágio da sociedade e a conquista de um regime avançado, verdadeiramente democrático e assentado nos princípios da justiça social. Em uma palavra: o socialismo.

Veios estratégicos

Esse fio histórico passou pelo Araguaia de forma marcante. Nas selvas onde ocorreram os combates estava condensado um dos veios estratégicos do país, que, no período republicano, passou pelos tenentes rebeldes que promoveram dois levantes e uma marcha histórica — a Coluna Prestes — na década de 1920 contra a República Velha. O acirramento das contradições históricas, no conturbado período pós-Revolução de 1930, levou o país ao regime de 1964 e ao seu antípoda: a resistência democrática, que adquiriu, em determinados momentos, a forma de luta armada, não só no Araguaia.

Esse período teve como impulsionador o Ato Institucional nº 5, o AI-5, que levou a ditadura a radicalizar o uso da violência contra seus opositores. Prisões, torturas e assassinatos se tornaram rotina. Para enfrentar esse regime de terror, os comunistas assumiram a linha de frente e saíram a campo para implantar núcleos de trabalho de massas que seriam pontos de apoio à luta armada. Vingou a área da região da Amazônia às margens do Rio Araguaia, situada no Sul do Pará e Norte do atual Estado do Tocantins.

O fluxo de militantes para a região do Araguaia aumentou a partir do início de 1969, devido ao agravamento da repressão política nas cidades. A maioria dos guerrilheiros era composta de jovens, dentre eles várias mulheres, que haviam participado ativamente do movimento estudantil. Ao lado destes, se encontravam antigos e experientes dirigentes comunistas, como João Amazonas, Maurício Grabois, Ângelo Arroyo e Elza Monnerat. Nas matas do Araguaia, várias gerações de comunistas se encontraram.

Guerra popular

No início de 1972, já havia 69 guerrilheiros e guerrilheiras que formaram três destacamentos e uma Comissão Militar, comandada por Maurício Grabois. O objetivo era criar as condições para a deflagração de uma “guerra popular prolongada” contra a ditadura. Para isto, passaram a viver junto ao povo, na condição de simples camponeses ou de pequenos comerciantes. Alguns eram médicos, professores e engenheiros. Utilizaram o seu conhecimento para ajudar os moradores locais. Lentamente, criaram vínculos e adquiriram a confiança dos camponeses.

Mas este trabalho foi abruptamente interrompido em 1972, com a entrada de tropas militares na região e o início da repressão. Os guerrilheiros enfrentaram três campanhas, que envolveram mais de dez mil soldados das três Armas. Entre a primeira e a segunda campanha, as Forças Guerrilheiras criaram a União pela Liberdade e pelos Direitos do Povo (ULDP) e apresentaram um programa de 27 pontos baseado nas necessidades mais sentidas do povo da região.

Em 25 de dezembro de 1973, a Guerrilha sofreu seu mais duro golpe com a queda da Comissão Militar e a prisão e morte de dezenas de militantes, incluindo a de seu comandante, Maurício Grabois. Em abril de 1974, transcorreram os derradeiros conflitos que culminaram com o fim da Guerrilha. Todos os prisioneiros desta última campanha foram torturados e assassinados. Cerca de 62 corpos permanecem desaparecidos.

Combate final

A repressão ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que organizou a Guerrilha, já havia se iniciado desde o primeiro dia do golpe de 1964, com o fechamento da sua imprensa e a perseguição a seus principais líderes. Antes do início das ações armadas, chegaram a ser presos e torturados Calil Chade, José Duarte, Lincoln Oest e Diógenes Arruda Câmara, entre outros. Em 1971, no Rio de Janeiro, foi brutalmente assassinado o jovem Joel Vasconcelos, no Rio de Janeiro.

A eclosão da luta armada no Araguaia levou a um aumento, sem precedentes, das perseguições aos comunistas. Entre o final de 1972 e o início de 1973, foram presos, torturados e assassinados quatro dirigentes nacionais: Carlos Danielli, Lincoln Oest, Luís Guilhardini e Lincoln Bicalho Roque. O Partido foi alvo, em vários Estados, de uma verdadeira caçada que provocou centenas de prisões e o assassinato de quadros valiosos. O objetivo da ditadura era isolar o Araguaia, impedir que a resistência recebesse apoio a partir das cidades. Era o início de uma operação cujo objetivo final era eliminar a direção do Partido que promovia a Guerrilha.

A Guerrilha do Araguaia, somada a outras ações democráticas, foi fundamental para a derrubada do regime dos generais golpistas. As forças militares mobilizadas para o combate final foram gigantescas. A reação avaliou a dimensão do movimento guerrilheiro e chegou à conclusão de que ele era resultado de um planejamento estratégico do PCdoB. Houve, no final das contas, um choque entre duas concepções para o país — uma mobilizou um ideal democrático e outra uma gigantesca máquina de guerra fascista. A história mostrou que o ideal democrático estava com a razão.