Carlin Moura: Renegociação da dívida, o elo da mudança

Nos últimos 10 anos, o Brasil assistiu a um dos mais complexos processos de transição política de sua história. Em 2002, o presidente à época, Luís Inácio Lula da Silva, deu início à transição do modelo neoliberal, que imperou com muita força durante toda a década de 1990, para um projeto nacional e social de desenvolvimento.

Na década de 90 e início de 2000, havia a convicção de que o modelo ideal de financiamento do Estado Brasileiro se daria através do endividamento externo, que, segundo a ótica neoliberal, seria uma forma de financiamento menos nefasta que emissão de moeda e inflação.

A guinada no curso da história começou a partir do momento em que o presidente Lula optou por retomar a política de valorização do salário mínimo, incrementar o mercado interno brasileiro, estabelecer novos polos de relações comerciais fora do eixo EUA/UE e adotar fortes políticas sociais de renda-mínima que, diga-se de passagem, encaixaram como luva no fomento do consumo e desenvolvimento da produção nacional e geração de empregos.

A transição ganhou força política e contornos ainda mais nítidos por meio das fortes medidas adotadas pela Presidenta Dilma Rousseff em seus primeiros dois anos de governo. As ações de Dilma vêm refletindo em um índice cada vez mais alto de aprovação de sua forma de governar, que bate sucessivos recordes e supera qualquer antecessor. A título de exemplo, na última pesquisa divulgada pelo Ibope, em meados do mês de abril, Dilma alcançou a aprovação de 77% dos eleitores, um índice histórico.

As medidas adotadas por Dilma também ficaram evidentes em seu pronunciamento feito na televisão no Dia do Trabalhador, em 1º de maio. A Presidenta ressaltou a necessidade de o Brasil consolidar seu crescimento, equilibrar sua economia, diminuir as desigualdades sociais, proteger sua indústria e agricultura, desenvolver novas tecnologias e ser cada vez mais competitivo e soberano no mundo.

A grande novidade e ponto forte do pronunciamento foram, contudo, a coragem com que Dilma Rousseff trouxe à tona o assunto que até então foi mantido intocável ao longo de todos esses anos de transição: a política de juros altos praticados no Brasil. A Presidenta colocou o dedo na ferida: “a economia brasileira só será plenamente competitiva quando nossas taxas de juros, seja para o produtor seja para o consumidor, se igualarem às taxas praticadas no mercado internacional”, disparou.

Este esforço do governo para equilibrar a economia é que tem permitido a queda contínua da taxa básica de juros. Outra ousadia do governo é a posição firme assumida para que bancos e instituições financeiras diminuam as taxas de juros cobradas aos clientes nos empréstimos, nas taxas básicas e nos cartões de crédito.

Para a Presidenta, é inadmissível que o Brasil, um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos do mundo, continue com a taxa de juros mais alta do planeta. De fato, não há razão para que estes valores continuem tão altos. O Brasil de hoje não justifica isto. Os bancos não podem continuar cobrando os mesmos juros para empresas e para o consumidor enquanto a taxa básica Selic cai, a economia se mantém estável e a maioria esmagadora dos brasileiros honra com presteza e honestidade seus compromissos.

O processo de transição política iniciado por Lula e consolidado por Dilma agora caminha no sentido de culminar com a concretização do fato mais debatido atualmente pelas Casas Legislativas brasileiras: a negociação da dívida pública dos Estados – o elo que completa essa corrente de mudanças.

No início do ano, tive a iniciativa acertada de requerer a instalação da Frente Parlamentar em Defesa da Renegociação da Dívida de Minas, cujo fruto foi a criação de Comissão Especial homônima. Nos trabalhos dessa Comissão, passamos a conhecer o modelo de financiamento da dívida pública dos Estados, em especial a de Minas Gerais.

Em 1998, nosso Estado possuía dívida calculada em R$ 15 bilhões, que foi negociada com taxa de juros de 7,5% ao ano, mais a correção pelo IGP-DI. De lá para cá, Minas Gerais já pagou o equivalente a R$ 21,5 bilhões e, pasmem, ainda possui um saldo devedor de 59 bilhões de reais. Pelas projeções, até o ano de 2028, quando termina o contrato de 30 anos de financiamento da dívida, Minas terá pagado à União R$ 77 bilhões, e, mesmo assim, ainda haverá um saldo devedor de quase R$ 65 bilhões. Fica evidente o equívoco cometido na negociação realizada naquela época.

Com a retomada do debate pela renegociação da dívida, “a faca e o queijo” voltaram para nossas mãos. Há que se ter cautela para que a discussão não volte a ser emperrada por diferenças político-partidárias, a exemplo do que ocorreu quando nosso saudoso ex-governador Itamar Franco levantou o debate da moratória. A dívida dos Estados não é disputa entre PT e PSDB, mas uma disputa em favor do Brasil.

Estou certo, como deputado do PCdoB, que nossa Presidenta Dilma entrará para a história de nosso país como aquela que teve a ousadia e compreensão necessárias para repactuar a dívida dos Estados com a União, concretizando, assim, o elo que completa a grande corrente de mudanças iniciada 10 anos atrás.

Carlin Moura é deputado estadual pelo PCdoB-MG