Wall Street: Os barões ladrões

A perda de mais de três bilhões de dólares – se supõe que o prejuízo seja maior – declarada pela empresa financeira JP Morgan Chase, considerada por especialistas e até pelo presidente Barack Obama como a melhor administrada nos EUA, sacudiu a pequena credibilidade ainda existente de que os banqueiros de Wall Street são capazes de se comportar bem sem supervisão de algum adulto.

Por David Brooks

Dimon: Salário de 23 milhões ao ano. E erra…

Agora três agências federais realizam investigações preliminares sobre se houve operações ilegais e convocam os chefes do banco mais rico (em bens) do país para explicarem o que ocorreu. Por sua vez, críticos assinalam que isto demonstra a necessidade de maiores medidas de controle e regulação do setor financeiro, algo que este banco e seu principal dirigente, Jamie Dimon, querem limitar e derrotar, investindo para isso milhões em atividades de lobby e mostrando até recentemente sua própria empresa como exemplo de que se podiam comportar bem sem maiores supervisões externas.

Enquanto o Bureau Federal de Investigações (o FBI), a Comissão de Valores e outra agência chamada Comissão de Venda de Futuros de Produtos Primários, investigam as operações do banco com os chamados derivativos de crédito e outras coisas impossíveis de entender (de propósito) para as pessoas comuns, os banqueiros insistem em que foi somente um erro.

Pouco depois da divulgação do jogo especulativo inusitadamente arriscado, em 13 de abril, Dimon minimizou publicamente o assunto afirmando que se fazia uma tempestade em copo d’água. Três semanas depois, em 10 de maio, quando o banco divulgou a perda de pelo menos dois bilhões de dólares naquelas atividades (agora são três bilhões, e pode chegar a quatro bilhões), Dimon admitiu que houve erros e que aquela operação financeira foi mal construída e controlada. E é para isso que pagam a ele 23 milhões de dólares por ano!

A surpresa de tudo isto é que não é surpresa. Os bancos continuam fazendo o mesmo de sempre, e os políticos o permitem, apesar dos milhões de desempregados, mais altos índices de fome, maior pobreza, menos recursos para educação e saúde e outras consequências decorrentes da pior crise financeira desde a Grande Depressão. Ninguém – nem os grandes executivos nem os políticos – foi responsabilizado e muito menos fiscalizado por seus erros.

Tudo isso não é senão a prova de que este é um sistema a favor do 1%, do 1% e para o 1%, como o definiu o economista prêmio Nobel Joseph Stiglitz, e não tem nada de novo. De fato, a história deste sistema pode ser traçada usando apenas o nome deste banco tão prestigiado: JP Morgan.

John Pierpont Morgan (1837-1913) foi filho de um banqueiro. Começou vendendo ações de ferrovias e chegaria a exercer enorme controle sobre setores chaves e mais dinâmicos da economia estadunidense.

Um dos seus primeiros negócios ocorreu durante a Guerra Civil; ele comprou cinco mil rifles de um arsenal militar a 3,50 dólares cada um e os revendeu a um general a 22 dólares cada, embora os rifles fossem defeituosos e ao dispará-los os soldados perdiam seus dedos. Como outros filhos de ricaços, incluindo John D. Rockefeller, Andrew Carnegie e James Mellon, Morgan evitou o serviço militar durante aquela guerra pagando 300 dólares a um substituto. O pai de Mellon escreveu a seu filho: um homem pode ser patriota sem arriscar sua própria vida ou sacrificar sua saúde. Existe um montão de vidas menos valiosas, segundo relata o historiador Howard Zinn.

Morgan chegaria a ser um dos homens mais poderosos do país. De fato, o governo apelou a ele e seus colegas para resolver uma crise de reservas em 1895. Claro, com grandes lucros e favores por tal serviço. Mas seu objetivo principal, enquanto multiplicava sua fortuna, era gerar estabilidade para o sistema. Não queremos convulsões financeiras, afirmou, enquanto concentrava cada vez mais o controle sobre o setor de ferrovias, seguradoras e outros, tudo ligado ao eixo central dos bancos. Em 1900 ele controlava a metade da quilometragem de ferrovias nos EUA, enquanto três seguradoras controladas pelo grupo Morgan tinham mais de um bilhão em bens. Louis Brandeis, antes de ser nomeado para a Suprema Corte, escreveu num de seus livros que Morgan e seus colegas controlavam o povo com o dinheiro do próprio povo.

JP Morgan, um dos barões ladrões

Morgan fundou a US Steel Company, fundindo a empresa siderúrgica fundada por Carnegie com outras, e ajudaria a consolidar o que seria a General Electric. E estes monopólios, junto com os outros de Rockefeller, Carnegie, Jay Gould, Henry Clay Frick e outros, obtiveram vantagens e lucros com o apoio ativo do governo federal, que oferecia barreiras protecionistas e outras medidas para beneficiar a este grupo quase todo poderoso.

Estes magnatas foram chamados de barões ladrões por suas operações e manobras.

Dimon, um dos executivos mais proeminentes do setor financeiro entre os que apoiaram a eleição de Obama em 2008, e que chegou a ser apontado como eventual secretário do Tesouro em seu governo, supostamente se distanciou do ocupante da Casa Branca, embora para muitos Obama não tenha se distanciado o suficiente dos barões de Wall Street.

O influente filósofo político Cornel West, professor da Princeton University, promoveu a eleição de Obama com base nas grandes expectativas de que o presidente enfocaria aquilo que ele próprio considera a grande luta dos direitos civis no século 21: a pobreza e a desigualdade econômica. Em uma entrevista recente, no Financial Times, West expressou seu desencanto descrevendo Obama como um mascote negro para os oligarcas de Wall Street e um títere negro dos plutocratas empresariais.

A cúpula política e econômica dos EUA não mudou tanto desde os tempos de JP Morgan e os barões ladrões. Ainda existe uma realeza, chamada agora de 1%, que continua mandando sobre os EUA sem pedir licença e sem supervisão aos 99%. E os JPMorgan continuam gozando dessa prerrogativa um século depois.

Fonte: http://www.jornada.unam.mx/2012/05/21/opinion/021o1mun / Rebelion