Joel Batista: Renovar a concepção e prática de Partido

Esse documento foi sistematizado para a Secretaria Sindical Nacional do PCdoB, em 16 de abril de 2012, e teve como base os documentos do 12º Congresso do PCdoB (2009) e do 7º Encontro Nacional sobre Questões de Partido (2011). Foi apresentado no 3º Encontro Nacional de Secretários Sindicais Estaduais do PCdoB nos dias 17 e 18/04/2012.

Por Joel Batista*

Política de Quadros e Formação

Em 2008 foi elaborado, por uma comissão especial do Comitê Central do PCdoB, um documento intitulado “Política de Quadros para um Partido Comunista Renovado”, para ser levado ao debate em todo o Partido com o objetivo de recuperar o rico legado da corrente comunista no Brasil e no mundo em forjar quadros políticos comprometidos com a causa da transformação social rumo ao socialismo. Tratou-se de atualizar esse legado em conformidade com o projeto político estratégico do PCdoB para o Brasil.

A atualização da política de quadros para a construção e estruturação partidárias foi tratada no 9º Congresso em 1997 e no 10º Congresso em 2001. Recebeu impulso com a nova situação política do país e do Partido após o novo ciclo aberto no Brasil a partir de 2002, na 9ª Conferência de 2003.

Em 2005, no 11º Congresso, o tema retoma com força ao lado do debate sobre a “estratégia dos comunistas para os tempos atuais”, com a síntese concentrada: “a chave para os futuros desafios do Partido é, agora, formar larga estrutura de quadros, de nível superior, intermediário e de base, assentada numa profunda compreensão da exigência da unidade de ação de todo o Partido”. O Congresso do PCdoB de 2005 também aprovou um estatuto inovador que definiu com precisão a condição de quadro partidário, dentro de um esforço de renovação de concepções e práticas de Partido, para assegurar o caráter do Partido e para a gestão da vida partidária.

O 12º Congresso, realizado em novembro de 2009, aprovou um documento intitulado “Política de Quadros para a Contemporaneidade” que formulou as principais diretivas para uma política de quadros “num momento em que se elevam os desafios da disputa pela hegemonia política e ideológica na atual etapa de desenvolvimento do capitalismo e da luta de classes”.

O 7º Encontro Nacional sobre Questões de Partido, realizado em abril de 2011, aprovou uma série de diretivas, tendo como destaque o novo modo de direção organizativa, no intuito de contribuir e dar resposta ao momento de atualização do pensamento programático e estratégico do nosso Partido.

Em março de 2012, realizamos o 1º Encontro Nacional dos Departamentos Estaduais de Quadros, com referência na seguinte consigna: “90 anos do PCdoB: garantir a implantação da política de quadros é cuidar do nosso maior patrimônio – os quadros do PCdoB”.
Nestes 27 anos de legalidade ininterrupta (desde 1985), acumularam-se defasagens nas formas e meios de lidar com o papel, funções e feições necessárias desta estrutura de quadros.

A atual política de quadros visa a fornecer um novo arcabouço a ser assimilado por todo o Partido: define a centralidade que tem a política de quadros, fixa a política geral para forjar os quadros partidários e a atitude que se espera deles perante o PCdoB e aponta para o desenvolvimento de políticas específicas para os distintos setores da atividade partidária.

Política de quadros para um período singular de lutas

Pensa-se o papel do Partido em função de um tempo determinado de luta, condicionado às lutas de classes do presente, como organização a serviço da ação política e por um projeto de poder nacional, com estratégia e táticas determinadas.

Não se aceita hoje a visão de modelo único de organização nem de modelo único de quadro ou de formas engessadas, padronizadas, de lidar com eles. Renovar a concepção e prática de Partido estende-se obviamente aos quadros e à política de quadros.

A trajetória vitoriosa do PCdoB desde a sua reorganização em 1962 em grande medida é devido à atenção dedicada à política de quadros. Notáveis quadros foram forjados nos tormentosos anos da ditadura e nos condicionamentos da luta de classes, em prolongada clandestinidade. No último dia 12 de abril, ao participar de sessão solene em homenagem aos 40 anos da Guerrilha do Araguaia, na Assembléia Legislativa de Minas Gerais, o secretário nacional de organização do PCdoB, Walter Sorrentino, quando se referiu aos 61 anos em que o Partido viveu na clandestinidade, sofrendo todo tipo de perseguições, disse: “Nessas condições, só prosperam os que têm convicções firmes e idéias próprias. É daí que nasce nossa força”, e resumiu lembrando que o Partido conta hoje com 350 mil filiados. O que é o PCdoB hoje se deve a essas gerações de incontáveis mártires e heróis.

As vitórias democráticas e a conquista da legalidade nos anos 1980 apresentaram outros tipos de exigências. Suportamos a extensa crise teórica e ideológica dos anos 1990, com a derrocada da URSS e do leste europeu, com a crise do socialismo e a ofensiva neoliberal. Foi em torno destes quadros que se alcançou o atual porte e influência dos comunistas na sociedade brasileira e em sua relação com organizações internacionais.

Superar condicionamentos

Passados quase trinta anos (desde 1985) hoje temos uma estrutura partidária e de quadros mais extensa. Nestes últimos poucos anos afluíram milhares de novos quadros, alargou-se nossa presença no terreno institucional e aumentou nosso trabalho em todas as esferas da luta e construção partidárias.

Portanto, hoje acumulamos defasagens na construção partidária. O conhecimento dos quadros, sua avaliação e controle, alocação, promoção e maior qualificação teórica e política precisam ser vistos com muita atenção pelos nossos órgãos dirigentes e auxiliares. É preciso superar a insuficiência de escala e meios materiais e humanos na política de quadros.
A necessidade de atualizar a política de quadros nos leva também a superar as visões dogmáticas e modeladas que ainda subsistem.

Respostas ao tempo

No contexto atual do nosso pensamento estratégico e tático, queremos quadros para este tempo, para que cumpram missão neste tempo, de forma não abstrata, não idealizada, escolástica ou com formas anacrônicas. Nesta nova luta pelo socialismo, extrair lições da experiência socialista do século 20, por um caminho brasileiro para o socialismo. Tempo de resistência ativa, de acumulação estratégica de forças, combinando reformas e rupturas para a superação do capitalismo, travando a luta em todas as suas dimensões, pondo em ação as forças sociais motrizes e a luta de idéias, forjando uma consciência transformadora a partir de bases marxistas e de um projeto de nação relacionado com o pensamento científico avançado de nossa época.

Lutamos para construir e consolidar um Partido de vanguarda nesse processo e ao mesmo tempo fazer parte do bloco de forças avançadas do país no rumo das mudanças. Partido para impulsionar a consciência de classe, ser representação política e social dos trabalhadores brasileiros, capacitados como classe a liderar um novo poder político e um projeto nacional avançado, rumo ao socialismo.

Aglutinar trabalhadores, juventude, mulheres e a intelectualidade avançada em um Partido Comunista de princípios, estruturado com feições modernas, de massas, voltado para a ação política, com vida orgânica à escala de centenas de milhares de membros. Partido com muita firmeza nos núcleos dirigentes. Quanto mais extensas forem nossas fileiras, mais necessário se faz termos quadros de direção coesos e compromissados. Trata-se de firmarmos quadros capacitados, temperados e disciplinados.

Renovação, qualificação, especialização, representação

Partimos do primado de um Partido marxista e revolucionário, que tem o centralismo democrático como princípio diretor, em sintonia com a realidade atual, com originalidade de formas e modelos organizativos, sem dogmatismos, apto a forjar nos quadros suas convicções e motivações, vontades e compromissos. Isso se dá sob o signo da renovação, qualificação, especialização e representação.

Renovação nos papéis e funções na estrutura de quadros. Qualificação no sentido de serem mais capacitados ao estudo, elaboração e sistematização. Especialização no sentido de que se destaquem em vários âmbitos do saber com inserção em todos os terrenos da vida política, econômica, social, cultural. Representação no sentido de expressarem as bases sociais fundamentais da presente luta e serem cidadãos e cidadãs influentes não apenas no Partido, mas também na vida pública, nas entidades representativas, respeitados no terreno onde atuam.

Confrontar quatro desafios

1. Dogmatismo – que pode levar a uma postura engessada ou defensiva frente às mudanças. Que tem dificuldades em compreender fenômenos novos na estratégia e tática atuais na luta de classes.

2. Liberalismo – que produz um afrouxamento dos compromissos com o Partido; no relaxamento com a organicidade

3. Corporativismo – que se restringe à mera luta social sem apontar o caminho para a classe alcançar o poder político nacional. Levado ao extremo, pode jogar água no moinho das correntes oportunistas que atuam no movimento sindical.

4. Pragmatismo – que leva a perder de vista os objetivos fundamentais em pról do imediato, que cede à pressão pela autonomização de grupos no interior do Partido, que perdem os referenciais estratégicos na atuação no seio das instituições vigentes, que caem na burocratização.

A Política geral de quadros

1. O Estatuto do PCdoB é a base da política geral de quadros. Seu artigo 7º define a condição de quadro partidário e as premissas organizativas, normativas e éticas que a norteiam. Todos podem ser quadros, dependendo da definição de responsabilidades que lhe são atribuidas. Temos no Partido quadros intermediários de distintos níveis de organização. O estatuto estabelece diversas modalidades de vida orgânica, conforme o grau de compromisso do membro do Partido e suas responsabilidades. Os quadros são a coluna vertebral da estrutura partidária. São os principais responsáveis pela unidade do Partido em torno de seus princípios e de sua orientação, bem como pela permanente construção política, ideológica e orgânica.

2. Adotar como a melhor escola de formação a designação de responsabilidades concretas de Partido, promovendo os quadros em suas funções, pois é na luta e na vida partidária coletiva que os quadros se vão educando e consolidando convicções.

3. Garantir que nenhum quadro permaneça sem projeto definido de atuação, nem haver espontaneismo na definição das responsabilidades designadas. A cada quadro deve corresponder um projeto político bem delineado, em condições de tempo e lugar determinados.

4. Instituir com ousadia uma política nacional de renovação dos órgãos dirigentes, tendo por linha geral a promoção de mais quadros oriundos dos trabalhadores, juventude, mulheres e intelectualidade.

5. Estimular ativamente a alternância de papéis e funções no Partido, com a política no posto de comando. Preparar conscientemente e com antecedência, novos quadros para novas funções.
6. No convívio partidário, valorizar a experiências dos mais antigos como também a energia dos jovens que trazem experiência e ímpetos novos.

7. Multiplicar o contingente de quadros intermediários, apoiando-os em seu papel de ligação entre a direção e a base.

8. Crítica e autocrítica como processo coletivo para melhorar e corrigir orientações e práticas, sem sectarismos, com o exame objetivo dos fatos.

9. A ênfase nos elementos de consciência teórica e ideológica é a forma de elevar convicções e motivações. Isso implica amplo estímulo ao estudo e formação sistemática, com as iniciativas da Escola Nacional e a Fundação Maurício Grabois.

10. O 12º Congresso, ao aprovar o novo Programa Socialista do PCdoB, maturou as condições para levar adiante a luta transformadora na atualidade em nosso país. A política de quadros atualizada é consentânea com essa perspectiva, constituindo um repertório renovado para a construção da força decisiva dessa luta, que é o Partido Comunista, no rumo de seu fortalecimento e pela sua hegemonia.

*Joel Batista, metalúrgico ferramenteiro, é membro da Secretaria Sindical Nacional do PCdoB.