José Reinaldo: G20 é espaço de disputas e foco de ilusões

Começou nesta segunda-feira (18), na cidade turística de Los Cabos, México, a reunião de chefes de Estado e de governo dos países do G20, que se conclui nesta terça. Os líderes dos países-membros do grupo e de outras nações convidadas pretendem coordenar ações imediatistas sobre o funcionamento do sistema financeiro internacional.

Por José Reinaldo Carvalho, editor do Vermelho

Como a situação é complicada, em vista da crise profunda do sistema capitalista, sabe-se que a “resposta” não será abrangente. Não há grandes ambições na reunião de Los Cabos. Tudo indica que a recessão não é somente econômica. O repertório de medidas “anticíclicas” parece esgotado. Há, sim, como sempre, ilusões sobre o papel do grupo na situação internacional.

O G-20 foi criado em 1999, com o objetivo proclamado de contornar ou encontrar soluções imediatas para as crises das balanças de pagamentos das economias chamadas emergentes durante a segunda metade da década de 1990.

Supostamente, estabelecer-se-ia uma cooperação econômica e financeira ampla e abrangente, com base em critérios de objetividade, entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento. Entre 1999 e 2008 participavam do G20, alcunhado de “financeiro”, apenas os ministros das Finanças e os presidentes dos bancos centrais.

Reunião de líderes

A partir de 2008, com a realização da Cúpula de Washington, no ocaso da presidência de George W. Bush, em plena eclosão da crise econômico-financeira, o G20 passou a reunir também chefes de Estado e de governo.

A Cúpula de Washington foi, assim, a primeira do G20. Realizou-se entre 14 e 15 de novembro de 2008, por proposta da União Europeia. "Estamos decididos a aumentar nossa cooperação e trabalhar juntos para restaurar o crescimento global e aprovar as reformas necessárias nos sistemas financeiros mundiais", afirma o comunicado conjunto.

De lá para cá, tiveram lugar as cúpulas de Londres (abril de 2009), Pittsburgh (setembro de 2009), Toronto (junho de 2010), Seul (novembro de 2010), Cannes (novembro de 2011). Esta de Los Cabos é a 7ª cúpula do G20. Já está acertado que a próxima se realizará na Rússia, em 2013. A 9ª cúpula terá como país anfitrião a Austrália, em 2014, e a 10ª ocorrerá na Turquia. Isto se não ocorrerem maiores sobressaltos econômicos, financeiros e políticos que obriguem os alquimistas do neomultilateralismo a inventarem novas fórmulas de grupos de coordenação.

Fracasso do neoliberalismo

A crise econômico-financeira internacional que eclodiu em 2008 deixou patente o fracasso das políticas macroeconômicas neoliberais e conservadoras decididas no âmbito do G7 (Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Japão e Canadá). Saltava aos olhos o efeito deletério da desregulação dos mercados financeiros.

Foi nesse contexto que o G20 ganhou relevo, pois passou a ser considerado o principal foro para uma cooperação econômica internacional mais alargada, conforme se estabeleceu na Declaração de Pittsburgh, aprovada na cúpula de setembro de 2009.

Progressivamente, com a sucessiva realização das Cúpulas, criou-se um consenso, num jogo diplomático de aparências, de que as discussões e decisões relacionadas com a crise e a busca de medidas para a sua solução deveriam transferir-se de foros restritos, como o G7, para o G20.

Os países imperialistas, de economia desenvolvida, com posição dominante na economia mundial, sendo o epicentro da crise, perderam a legitimidade para ditar as normas da economia internacional. Isto coincidiu com a maior emergência de economias de países como China, Rússia, Índia e Brasil, entre outras.

Tendo como pano de fundo a interdependência econômica, comercial e financeira no quadro da globalização capitalista, tornou-se imperioso, para a própria sobrevivência do sistema, buscar uma maior cooperação entre os países desenvolvidos e os chamados emergentes.

Ilusões

Isto gera a ilusão de que o G-20 tem maior legitimidade e autoridade democrática, sendo uma espécie de manifestação de uma tendência à democratização das relações internacionais, o embrião de uma nova ordem multilateral. Surge também a ilusão de que com o G20 o mundo passaria a contar com um instrumento eficaz para coordenar uma resposta eficiente à crise econômica e financeira, evitando assim o colapso do sistema econômico internacional.

As ilusões são de tal ordem que de maneira mais disfarçada, renasce na boca de alguns a ideia do “ultraimperialismo”, de Karl Kautsky, a quem Lênin designava como renegado.

Os países considerados emergentes, entre eles o Brasil, usam o G20 como espaço de luta para alargar sua participação na economia internacional e defender-se de medidas dos países ricos que atentam contra sua soberania. Mas é ilusório imaginar que através do G20 seja possível mudar num sentido progressista, popular e patriótico a estrutura e a arquitetura do sistema financeiro e econômico internacional.

Já em novembro de 2009, logo após a Cúpula de Pittsburgh, o 12º Congresso do Partido Comunista do Brasil criticava como um dos aspectos salientes do quadro internacional, sobretudo na conjuntura de crise econômica e financeira, “a tentativa [do sistema imperialista] de fortalecer organismos de coordenação, nos quais não poucas vezes estalam também rivalidades e contradições interimperialistas, além de conflitos de interesse entre as potências dominantes e os países emergentes”. De acordo com o documento, aprovado por unanimidade no Congresso, “a ação desses organismos tem-se revelado um fracasso do ponto de vista das ‘soluções’ para a crise, da ‘regulação’ do mercado de capitais e da promoção do ‘desenvolvimento’ e ‘ajuda’ aos pobres”.

O documento advertia para o invariável objetivo do imperialismo de concentrar poderes e concertar posições tendo em vista o domínio econômico e político do mundo. O Congresso do PCdoB mencionou especificamente a nova articulação. “O G20 financeiro espelha uma nova realidade no mundo, em que as grandes potências imperialistas não podem decidir sozinhas e países emergentes como o Brasil, a China, a Rússia e a Índia, conquistam novos espaços, jogam novo papel, disputam em defesa de seus interesses nacionais e contribuem para a luta por uma nova ordem econômica e política. É falsa, porém, a tese sustentada por alguns chefes de Estado de potências imperialistas de que o G20 corresponde a uma ‘revolução’ e a uma ‘democratização profunda’ das relações internacionais.”

Uma posição coerente e que guarda toda a atualidade.