Procon apura venda irregular de ingressos para Libertadores

Muitos associados do programa de compra de ingressos do Corinthians, Fiel Torcedor, não conseguiram adquirir ingresso para a final Libertadores entre Corinthians e Boca Juniors, na quarta-feira (4), no estádio do Pacaembu, São Paulo. Em muitos casos, o sistema caiu durante a compra, inviabilizando a aquisição. Enquanto isso, sites estão promovendo um verdadeiro leilão. A Fundação Procon instaurou, nesta sexta-feira (29), um procedimento administrativo para apurar o fato.

No site Ticketbis, por exemplo, o ingresso de uma cadeira chegou a custar R$ 31.304 por volta das 14h e para a arquibancada R$ 33.540 às 16h, desta sexta. “Constatamos inicialmente que se trata de um site que vende não somente ingressos para jogos, mas também para shows. Nos próximos dias enviaremos uma notificação para a empresa que registrou o domínio na internet”, explicou ao Vermelho Márcio Marcucci, diretor de Fiscalização em exercício, do Procon São Paulo.

A reportagem apurou que o domínio ticketbis.com.br está registrado em nome da empresa Toweb Brasil Ltda, uma prestadora de serviços em revenda de domínios na internet.

“Essa empresa de informática pode ser simplesmente uma prestadora de serviço e não estar envolvida na venda dos ingressos. É isso que queremos descobrir com a notificação. Se for preciso, pediremos o nome do cliente que administra o site de compra e venda de ingressos”, completou Marcucci, que orienta a não comprar ingressos no mercado paralelo de forma alguma.

“A nossa orientação é não comprar e denunciar ao Procon ou ao DPPC, ligado à secretaria de Segurança Pública”, salientou o diretor do Procon-SP. O DPPC é o Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania. Qualquer consumidor que se sentir lesado, tendo comprado ou não os ingressos, pode formalizar uma denúncia em qualquer posto de atendimento do órgão de proteção ao consumidor ou ao próprio DPPC, na Avenida São João, 1.247.

“Loucos” esgotam ingressos em três horas

O Sport Club Corinthians Paulista, responsável pela venda de ingressos, afirma que os  ingressos restantes para a partida foram vendidos na quinta-feira (28), em nove minutos. No total, 31.500 ingressos foram destinados aos corintianos. Dois mil e quinhentos foram destinados aos torcedores do time visitante e dois mil para a organizadora da Libertadores, a Confederação Sulamericana de Futebol (Conmebol).

O rápido esgotamento dos ingressos para a partida decisiva se deve basicamente a enorme procura natural por se tratar de uma final, e também a reserva de um setor, o do portão 21, normalmente comercializado pelo Fiel Torcedor, para a Conmebol, reduzindo a carga de ingressos para a venda online.

Atualmente, os “loucos” podem adquirir as entradas após ingressar no programa de sócio do clube, o Fiel Torcedor, cuja anuidade varia entre R$ 100 e R$ 1.200.

Cada titular pode ter até quatro dependentes que, juntos, podem comprar até cinco ingressos. No entanto, o clube explica que não é possível generalizar já que a venda prioritária é para quem acumula os 45 jogos, sendo titular e dependente. Portanto, o grupo de cinco pessoas pode não alcançar o número máximo de ingressos permitido pelo grupo de titular e dependentes.

Os lotes dos ingressos for liberados aos poucos, dando prioridade aos mais assíduos. Primeiro, compram os que têm mais de 45 jogos acumulados. Depois, ainda de acordo com o time, é aberta a venda para fieis torcedores com menos de 45 jogos e só então é aberta a venda para quem não é associado, na internet e no posto do Memorial do Corinthians (Rua São Jorge, 777, Tatuapé). No caso da final da Copa Libertadores, a procura foi tamanha que os torcedores não associados ao programa nem chegarem a ter a oportunidade de adquirir na internet e nem pessoalmente.

Diante das cifras alcançadas nos sites de compra e venda pelos ingressos, seria ingênuo afirmar que os mesmos ficaram somente na mão dos fieis torcedores. Se configura claramente uma situação de cambismo, onde ocorre influência do câmbio a partir da ação de um intermediário, explorando ao máximo a lei da oferta e da procura. Tal prática é considerada crime, previsto na lei 1521/51, que dispõe sobre os crimes e contravenções contra a economia popular. Mais recentemente, para enquadrar a contravenção, um artigo no Novo Estatuto do Torcedor (Lei 12299/2010), o artigo 41-F, que prevê pena de reclusão de um a dois anos e multa para quem vender ingressos de evento esportivo, por preço superior ao estampado no bilhete.

Além disso, o regulamento do programa Fiel Torcedor proíbe a revenda dos ingressos para terceiros: “O Participante será o único responsável por seu cadastro e por sua conta de acesso ao Programa sendo-lhe vedado sob qualquer hipótese ceder, vender, emprestar ou sob qualquer outra forma transferir sua conta de acesso, sob pena de cancelamento do cadastro.”

Mesmo assim, dezenas – centenas? – de ingressos estão sendo colocados à venda. O clube reconhece a existência da prática, inclusive, afirma punir imediatamente assim que descoberta a fraude, já tendo descredenciado torcedores, sem mencionar a quantidade de sócios excluídos. O Corinthians reforça que se trata de crime, portanto, um caso para a Polícia.

Escândalo

“É nessa hora que a gente vê o quão escandaloso é a administração de futebol no país. A venda de ingressos fica sempre sob responsabilidade do clube. E nesse caso, o Corinthians vendeu exclusivamente no site deles, o Fiel Torcedor. Quem comprou excedentes é quem está vendendo nesses outros sites. Talvez coubesse ao clube ou aos próprios torcedores questionar. Mas sempre um vai empurrar para o outro a responsabilidade. Fazem o que querem porque é um mercado que se movimenta pela paixão. Por conta disso, os preços estão cada vez maiores”, afirmou o colaborador do Vermelho Bruno Padron, do Blog Porpetta, especialista em esporte.

Além disso, Porpetta, como é conhecido, alerta para a seleção que esse tipo de prática acarreta. “Antigamente os torcedores do flamengo eram pobres, gente simples, humilde, hoje em dia só vejo nos estádios gente da zona Sul, bem vestida”, lamentou o blogueiro, que é flamenguista.

Questionado sobre a prática de venda ser concentrada pela internet, o Corinthians afirma que nunca houve reclamações dos torcedores. Pelo contrário, o número de associados chega a 60 mil, que supera o número de pagantes do Pacaembu e até os 48 mil da Arena Corinthians – 65 mil para a Copa do Mundo, já que haverão 17 mil cadeiras a mais montades especialmente para o espetáculo esportivo.

Deborah Moreira
De São Paulo

atualizada às 00:17h em 29/6/2012