Megaeventos trazem crescimento tecnológico ao país, diz Aldo

O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, esteve em Lisboa, Portugal, no dia 5 de julho para a abertura da 8º edição dos Jogos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), entre 7 e 15 de julho. Em entrevista ao jornal esportivo A Bola, daquele país, o ministro enfatiza a importância da competição e conta os desafios de organizar o Mundial de 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016. De mangas arregaçadas, diz que o Brasil caminha para a elite mundial, também no esporte.


Aldo Rebelo durante entrevista coletiva do Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo/foto: Ministério do Esporte

"Nós temos planos e sonhos para aproximar e intensificar a cooperação entre os países da comunidade de língua portuguesa. Pensamos que a nossa unidade e identidade, para além da história, cultura e laços de um idioma comum, devem ser um ativo importante para a presença dos países lusófonos num cenário mundial, comercial, econômico, geopolítico e diplomático. Tenho uma grande identidade com esse enorme desafio", sublinha Aldo Rebelo, que presidiu a reunião da conferência de ministros responsáveis pela Juventude e Desporto dos países de língua portuguesa.

Aos 56 anos, Aldo Rebelo é membro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), desempenhou vários cargos políticos e é reconhecido por ser um defensor da união dos povos da língua portuguesa. “Como deputado sempre trabalhei para aproximar os países de língua portuguesa, sempre vi essa plataforma comum como uma grande vantagem para todos nós. Acho que o Brasil poderia fazer muito mais do que faz, acho que a presença de Portugal é muito mais ativa e eficaz, tem instrumentos como a RTP ou o Instituto Camões, enquanto o Brasil deveria estar mais presente”, ressaltou o ministro.

Com relação ao Esporte, Rebelo enfatizou a cooperação entre os países. “No Desporto o que pudermos, vamos fazer. Tem de haver cooperação. Queremos que os Jogos sejam uma herança para o Brasil, para a América do Sul e também para a comunidade lusófona. Queremos mobilizar o voluntariado lusófono e estudaremos a forma de intensificar as relações com Portugal, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor. É muito importante para todos.”

Aldo lembrou da importância de Portugal para o futebol e citou alguns jogadores como Eusébio, que deve ser convidado em breve para visitar o Brasil, onde deve receber homenagens. “Portugal é um país importante no panorama futebolístico mundial. Ainda mais agora que o Europeu o demonstrou. E os grandes clubes, Benfica, FC Porto e Sporting, também têm muito peso.”

Aldo Rebelo enfatizou o caráter organizativo do Brasil, lembrando de eventos turísticos de grande porte como o Carnaval, e mais recentemente a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20.

“Creio que há outros eventos que testam muito mais o país, como o Carnaval do Rio, de Recife ou de Salvador. São muito mais exigentes em termos de infraestrutura, de logística. Ainda há pouco tempo falava com o ministro dos Desportos inglês que me disse que gosta de passar o Carnaval no Brasil e que vai voltar. Agora, no encontro da Rio+20, fizeram uma sondagem onde se constatou que 97% dos estrangeiros que participaram manifestaram o desejo de voltar ao Brasil. Com todos os problemas que podem existir e nós reconhecemos que é preciso corrigir muita coisa, temos infraestruturas capazes de acolher grandes eventos, como a Copa ou os Jogos Olímpicos.”

Acompanhe a entrevista:

A Bola: Que balanço faz do mandato quando o Brasil prepara a organização do Mundial de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016? Muitos problemas?
Aldo Rebelo: A Copa do Mundo de 2014 é a 20ª edição e o Brasil participou de todas. É o único país que conseguiu. O Brasil já sediou uma Copa do Mundo, em 1950. Logo a seguir à 2ª Guerra Mundial, a Europa vivia um período de crise, devastada pela guerra, não tinha como organizar a Copa e o Brasil organizou-a. Fez o Maracanã em menos de dois anos. Portanto, a Copa do Mundo não tem segredos. Nós temos muito trabalho, porque é uma competição que vai ser realizada em 12 cidades. O Brasil é um país muito grande e vamos ter Copa em Manaus, no extremo norte, na Amazónia, e em Porto Alegre, já no extremo sul.

A Bola: É um enorme desafio?
AR: Não vejo assim, não é o maior que já enfrentamos. Nós valorizamos muito a Copa, sabemos que é talvez o mais importante acontecimento do planeta. É uma grande oportunidade para o desenvolvimento do Brasil, para superar muitas deficiências que tem, como telecomunicações, mobilidade urbana, segurança, mas eu digo que o Brasil já fez coisas mais importantes e difíceis do que a Copa do Mundo. Organizaremos a Copa do Mundo de acordo com as expectativas do mundo e do Brasil.

A Bola: Têm havido algumas polémicas com a Federação Internacional de Futebol (Fifa), por conta das vistorias nas obras. Os prazos não foram cumpridos?
AR: Não. Divergências existirão sempre e é natural numa organização desta dimensão. As opiniões surgem até no ambiente familiar, quanto mais numa Copa. Mas sempre em função do interesse comum, do interesse superior. O governo brasileiro, a Fifa, os patrocinadores, todos estão interessados no sucesso da prova. Mas não há nenhuma grande divergência.

A Bola: Sofreram, contudo, duras críticas. O secretário-geral da Fifa, Jérome Valcke, chegou a dizer que o Brasil merecia “um pontapé no traseiro”?
AR: Todas as críticas foram respondidas no mesmo tom e no momento exato. Nada ficou sem resposta, mas considero que isso já foi superado. O secretário-geral da Fifa já esteve no Brasil duas vezes depois daquele episódio, eu já fui à sede da Fifa e creio que chegamos à conclusão que o melhor é ter como denominador comum a cooperação e a harmonia. As divergências vamos ultrapassá-las com maturidade.

A Bola: Qual a razão de Valcke ter sido tão duro com o Brasil?
AR: Isso tem de ser perguntado a ele. As críticas tiveram resposta. O Brasil está organizando a Copa com o mesmo espírito de trabalho, de dedicação que nos levou a construir um país que é continental, a dar a este país unidade, um idioma que o unifica, a construir metrópoles por todo o país, a ser a sexta economia do mundo, a ser uma das maiores potências do futebol mundial, que talvez não fosse o que é hoje sem a contribuição do Brasil. Temos o maior artilheiro de todas as Copas e o seu maior astro, que é o Pelé.

A Bola: No Brasil também são muitas as críticas…
AR: Temos na nossa herança cultural um certo pessimismo, uma certa descrença que herdamos de Portugal, dos velhos do Restelo. Mas nós também herdamos um espírito desbravador, realizador. Aqui no Tejo estava o velhinho do Restelo advertindo para os riscos e os navegadores partiram apesar disso…

A Bola: O Brasil vai também receber os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro. Ainda faltam quatro anos, mas acredita que o processo será mais pacífico ou também já há divergências com o Comité Olímpico Internacional?
AR: As Olimpíadas do Rio de Janeiro já renderam mais patrocínios do que os Jogos Olímpicos de Londres! Faltam mais de quatro anos e do ponto de vista comercial já são um êxito. O Rio de Janeiro é uma cidade habituada a receber grandes eventos. Recebeu o Congresso Internacional do Meio Ambiente, em 92, acolheu agora a Rio+20 e houve aeroportos, hotéis e transportes para todo o mundo. O Rio de Janeiro faz um Carnaval que recebe centenas de milhares de turistas do mundo inteiro e milhões de brasileiros. Creio que não haverá problemas em organizar as Olimpíadas, haverá sim muito trabalho.

A Bola: Está em marcha algum plano para preparar uma geração de campeões, que tenha o seu apogeu nos Jogos, como sucedeu em outros países, como a Espanha ou a China? Vamos ter campeões?
AR: Tomara que sim. Nós temos um plano especial, um plano-medalhas, para 2016. Não seria bom se o país tivesse um bom desempenho em organização, ganhar prêmios de arquitetura, transportes e no quadro de medalhas ter um desempenho baixo. Queremos ter um desempenho desportivo compatível com um país organizador. Estamos trabalhando com o Comité Olímpico Brasileiro e as federações para preparar os nossos atletas para terem um bom desempenho. Até porque o país-sede pode participar em todas as modalidades.

A Bola: Já definiram uma meta de medalhas?
AR: Não. Estamos ainda preparando o plano, estudar os atletas, a preparação, as competições, o corpo técnico e médico de acompanhamento, entre outros pontos.

A Bola: A crise econômica saiu dos trilhos na Grécia depois dos Jogos de Atena-2004. Aconselharia, por exemplo, Madrid a desistir da corrida aos Jogos de 2020 dada a crise atual?
AR: Copa do Mundo e Olimpíadas são oportunidades que se descortinam para os países. Pode ser uma grande oportunidade par o futuro, como aconteceu em Barcelona, ou se não se tiver cuidado pode transformar-se num fracasso. Pequim teve um bom resultado com os Jogos Olímpicos, Londres já está tendo um bom resultado. Para o Brasil será uma oportunidade para o desenvolvimento do país, não só desportivo, mas também científico, tecnológico e também para o desenvolvimento do Rio de Janeiro, que já é uma metrópole muito conhecida e querida, mas pode ganhar uma nova dimensão.

A Bola: Mas para um país menor, com economia mais frágil, não seria um grande risco? Por exemplo, aconselharia Portugal a se candidatar?
AR: Estive com um dos responsáveis pela organização da Euro-2004 e não o vi arrependido do que Portugal fez para organizar o Campeonato da Europa. Acho que da mesma forma a Polônia e a Ucrânia também se beneficiaram do Europeu. Pois há sempre muitos investimentos. No Brasil, para a Copa do Mundo, já se criaram mais de 300 mil empregos e até 2014 mais 300 mil serão criados.

A Bola: Não teme, depois, ficar com elefantes brancos, com os estádios praticamente ao abandono?
AR: Nós não temos elefantes na fauna brasileira. Temos outros bichos, como onças, mas elefantes não… Nós estamos construindo os estádios com um conceito multiuso. Com centros de convenções, com restaurantes, centros comerciais, alguns com hotéis, o de Recife com uma universidade e conjunto habitacional com 2.400 apartamentos.

A Bola: O Brasil aprendeu com os erros de outros países, como Portugal, que tem estádios que praticamente não utiliza?
AR: Aprendemos com os erros mas também os acertos. Algumas coisas são inevitáveis, nem sempre os locais onde se constroem os estádios têm movimento, atividades para absorver as pessoas e gerar benefícios. Nós não temos esse problema no Brasil porque são cidades grandes, metrópoles, destinos turísticos importantes.

A Bola: Há vozes muito críticas no Brasil, que dizem que é um erro tremendo o país organizar o Mundial e os Jogos Olímpicos. Seria uma festa de um mês e uma dor de cabeça de 10 anos…
AR: Se dependesse dessas pessoas nós acabaríamos com o Carnaval, que não dura nem um mês: é uma semana. E as pessoas fazem os carros alegóricos, luxuosos, belos que são para usar não durante uma semana mas em menos de uma hora, que é o tempo que dura o desfile.

A Bola: Mas os carros são descartáveis…
AR: Mas têm custos e as pessoas compensam-nos com patrocínios. Quando foi a Copa do Mundo no Brasil, em 1950, houve uma campanha para não construir o Maracanã. Não foi uma batalha de engenharia, de construção civil, foi uma batalha ideológica, política contra os descrentes.

A Bola: O mesmo acontece hoje?
AR: Claro. É como disse, trazemos essa imagem do pessimismo… Quem é que pode fazer uma Copa do Mundo? Só a Inglaterra, a França, os Estados Unidos, a Alemanha? Não concordo com isso.

Fonte: A Bola