Caso Assange: Um teste para o Equador
A solicitação de asilo político de Julian Assange fez os olhos do mundo voltarem-se para o Equador, não só pelo interesse que desperta o homem que desafiou os Estados Unidos, ao revelar seus segredos de guerra e a dupla moral em sua relação com os demais países.
Por Yurién Portelles*, para a agência Prensa Latina
Publicado 12/07/2012 19:18
A pergunta que se repete é: como este pequeno país resolverá o caso pela via diplomática e política depois da entrada na Embaixada em Londres do fundador do Wikileaks, numa tentativa de se salvar da extradição da Suécia aos Estados Unidos e condenado à pena capital?
Assange teria tomado a decisão de refugiar-se no prédio pertencente a território equatoriano quando considerou que não tinha outra ferramenta, ao ser negada a reabertura de seu processo judicial no Reino Unido.
Dali pode evitar ser levado à Suécia e evadir às pressões a Estocolmo para sua entrega a Washington, além de por fim a um cativeiro que cumpriu durante mais de 500 dias sem outro requerimento que não fosse o sueco, por supostos delitos sexuais.
Além de seus temores de ser processado por delitos políticos nos Estados Unidos, Assange expressou que as autoridades britânicas aproveitariam os Jogos Olímpicos como cortina de fumaça para enviá-lo à Suécia e que o caso não se sobreporia ao contexto noticioso do encontro esportivo mundial.
Destino Equador
Embora não fosse previsível essa determinação do jornalista australiano, deste país sul-americano tinham sido estabelecidas diversas pontes de maneira direta ou indireta, que provavelmente influíram para que ele recorresse a suas autoridades para proteger sua existência.
Os advogados explicaram seus motivos alegando a certeza de seu defendido de que o governo do Equador não negociaria seu caso com os Estados Unidos, onde a presidenta do Comitê de Inteligência do Senado estadunidense, Dianne Feinstein, já demandou que seja processado por espionagem.
O fundador do Wikileaks disse que precisava de um lugar onde pudesse continuar seu trabalho e, de fato, da Embaixada equatoriana em Londres ele mesmo aprovou a recente difusão de telegramas sobre a Síria que, disse, ajudariam a compreender o conflito.
Entre os antecedentes de sua solicitação ao Equador, em 2011 vários meios nacionais publicaram aqui relatórios obtidos por essa rede digital e que conduziram à expulsão da então embaixadora dos Estados Unidos, ao se negar a dar explicações a respeito.
Também houve outra aproximação ao tema depois que no final de 2010 o então vice-chanceler Kintto Lucas se pronunciou a favor de uma visita de Assange ao país e declarou a possibilidade de lhe conceder a residência, se este a tivesse requerido.
Mais recentemente o jornal El Telégrafo realizou uma entrevista exclusiva com Assange, além de publicar todos os telegramas relativos ao Equador.
Por sua vez, Assange em seu programa "O mundo de amanhã", transmitido pelo Russia Today, escolheu Correa entre seus convidados, a quem perguntou por que seu governo aceitou publicar os telegramas vazados pelo Wikileaks.
"Quem nada deve, nada teme", respondeu o presidente ao falar de sua relação com a imprensa privada opositora, a qual tem tido que enfrentar em cinco anos de governo, e a qual se teria posto de acordo para não publicar mais telegramas vazados para não causar danos a eles mesmos.
Compasso de espera
O Equador usa seu tempo buscando não errar em sua decisão, após avaliar os envolvimentos legais e jurídicos para o país, ainda mais em um ano pré-eleitoral.
O Chanceler Ricardo Patiño assinalou que usarão todo o tempo necessário para analisar a situação do australiano, já que neste caso o tempo não é perecível, por isso uma resposta poderia demorar inclusive anos.
Correa, por sua vez, afirmou que se analisa seriamente a solicitação de asilo e que qualquer decisão seria soberana, conforme a tradição de proteger os direitos humanos daquelas pessoas que o requeiram.
O presidente considerou estranha a natureza das acusações impostas a este e disse que seu país lhe dará proteção enquanto são realizadas conversas ao mais alto nível.
"Todo mundo sabe que ele é um lutador pela liberdade de expressão sem limites", afirmou em umas de suas intervenções, nas quais pôs em dúvida que Assange seja requerido na Suécia por delitos que este nega ao alegar que foram relações consentidas.
Disse também que o Equador recusa a pena de morte, por isso não poderia arriscar uma pessoa que solicitou asilo, mais ainda por delitos políticos, a que enfrente essa possibilidade.
"Não podemos aceitar que haja uma perseguição política pelas ideias expressadas por Assange e, se cometeu uma infração legal quanto ao Wikileaks, que sejam apresentadas essas acusações", enfatizou.
A julgar pelas declarações de Patiño e Correa, não seria difícil inferir que o governo do Equador aceitará o pedido de asilo; no entanto, o labirinto diplomático parece fazer demorar a decisão final.
Labirinto diplomático
A qualquer momento, segundo o direito internacional, o Equador teria a potestade de emitir sua resposta sobre o pedido de asilo, decisão que, segundo Patiño, seria argumentada suficientemente, inclusive com várias centenas de páginas se fosse necessário.
Entre os fatores para esta demora poderia estar o fato de que se trata de um cidadão australiano, retido no Reino Unido com prisão domiciliar, requerido na Suécia por delitos sexuais e almejado por Washington.
Os especialistas em diplomacia assinalam que, embora se conceda o desejo de Assange, faltaria que Londres estenda uma salva conduta para permitir o translado do jornalista até este país.
Assegura-se que a Polícia Metropolitana de Londres permanece cercando o prédio diplomático na espera de que o refugiado ponha um pé do lado de fora para prendê-lo com o argumento de que violou as condições de sua prisão domiciliar no Reino Unido.
As autoridades equatorianas têm sustentado diálogos com a contraparte britânica sem que até agora se tenha informações sobre o estado das negociações, dada a hermeticidade com que as partes têm mantido o assunto.
Orlando Pérez, diretor de El Telégrafo, assinala que se abre uma gama de possibilidades jurídicas e políticas, todas elas sob um signo de fundo: os Estados Unidos, "país que terá um papel não público mas sim muito indireto em qualquer das saídas que se dê ao caso".
Também, diz, conta muito até onde a comunidade internacional e os líderes de opinião possam contribuir, e de fato importantes personalidades e organizações do mundo têm expressado seu apoio, entre eles o Fórum de São Paulo e o cineasta estadunidense Michael Moore.
Como quer que seja, este caso é uma prova de fogo para o governo do Equador na arena internacional, enquanto Assange protege sua vida, depois de ter revelado ao mundo certas pretensões dos Estados Unidos.
*Correspondente da Prensa Latina no Equador