Saul Leblon: Mídia joga a tolha e entrega Perillo à própria sorte

Tucanos e demos ainda esperneiam e se agarram à estaca fixada por José Serra, em abril: "Sinceramente, eu dou meu voto de confiança ao Marconi Perillo", disse então o ex-governador de São Paulo ao Estadão (14-04-2012).

Por Saul Leblon*, na Carta Maior

Os fatos diluvianos despejados esta semana na CPI do Cachoeira, porém, romperam o dique político demarcado por Serra, cujo objetivo era impedir que a água caudalosa vertida de Goiás dissolvesse o plano de utilizar o julgamento do mensalão, em plena campanha municipal de 2012, como alicerce aglutinador do udenismo antipetista, já de olho na disputa de 2014. Inútil. O vertedouro das evidências contra Perillo tornou-se incontrolável.

Um relatório da PF enviado à Procuradoria Geral da República, e publicado pela revista Época, elucida as etapas da triangulação – até agora tortuosa – da venda de imóvel do governador de Goiás ao contraventor Cachoeira. Fica claro que o dinheiro saído dos cofres do estado serviu a três senhores simultaneamente – e nenhum deles era o interesse público do povo goiano.

Em abril do ano passado, Perillo liberou cerca de R$ 9,6 milhões de pagamentos atrasados referentes a obras supostamente realizadas pela Delta no estado (cabe à CPI avaliar e identificar essas obras); ato contínuo a Delta depositou R$ 5,4 milhões na conta de empresas de fachada do bicheiro (o que reforça as suspeitas de que o ubíquo Cachoeira é sócio-proprietário da Delta, assim como fermentam sinais de que é uma espécie de dublê de governador no Palácio das Esmeraldas); das empresas do bicheiro migraram três cheques no valor total de R$ 1,4 milhão para uma confecção de um sobrinho de Cachoeira, que em seguida 'comprou' a citada casa de Perillo, teoricamente avaliada em R$ 900 mil e na qual Cachoeira foi preso.

Enfim, o dinheiro público viajou dos cofres do estado para os bolsos das diferentes instâncias do 'condomínio goiano', garantindo ainda um 'plus' a Perillo na venda do imóvel. Serra e Cia vão continuar falando grosso na tentativa de evitar a derrocada do dominó que tem em Perillo uma peça de posicionamento estratégico. Mas, sintomático do isolamento de Perillo, se ressentem da âncora midiática. Hoje, dois pilares do dispositivo conservador  – jornais O Globo e O Estado De S. Paulo – jogaram a toalha em notas editoriais nas quais entregam o tucano à própria sorte.

Os textos utilizam termos idênticos, como se fossem reciclagens de uma mesma matriz. Diz o Estadão: "Reduzido aos seus termos básicos, tratou-se de um acordo, intermediado por Cachoeira, pelo qual o governo de Goiás pagaria R$ 9,6 milhões devidos à Delta em troca de um pedágio de R$ 500 mil para o governador. Quase tão antigo como o Brasil, é o clássico esquema de criar dificuldades para vender facilidades. O alegado suborno de Perillo se materializou no bojo de uma transação imobiliária".

Reitera o Globo: "O relatório (da PF) desfaz a confusão, e dele não sai bem o governador. Em linhas gerais, na versão da PF, sustentada por sugestivos diálogos grampeados, Perillo vendeu a casa a Cachoeira, em cujo preço foram incluídos R$ 500 mil, pagos pela Delta e entregues ao governador para facilitar a liberação de pagamentos do estado (…) caso indiscutível de corrupção, com a criação de dificuldades para a venda de facilidades".

*Saul Leblon é colunista da Carta Maior

Título original: Perillo: mídia joga a toalha