Augusto Vasconcelos: A superação do tripé perverso

O Comitê de Política Monetária do Banco Central acerta com o corte de juros da SELIC. Trata-se de medida coerente, porém insuficiente para alavancar os investimentos necessários para recuperação do crescimento econômico em patamares superiores.

Por Augusto Vasconcelos*

O Comitê de Política Monetária do Banco Central acerta com o corte de juros da SELIC. Trata-se de medida coerente, porém insuficiente para alavancar os investimentos necessários para recuperação do crescimento econômico em patamares superiores.

A coragem do governo Dilma em enfrentar o alto spread bancário verificado no Brasil, por outro lado, ainda não alcançou força suficiente para superar decisivamente outros aspectos conservadores de nossa política macroeconômica herdados do período FHC.

A implantação do Plano Real, com o argumento do controle inflacionário a qualquer custo, trouxe consigo um tripé perverso que detona a possibilidade de nos consolidarmos como país soberano. A indexação da dívida pública a juros estratosféricos utilizados para inibir o consumo, a supervalorização do Real frente ao dólar e o superávit primário compõem uma engrenagem que asfixiou a produção, vide a perda de importância relativa da indústria na composição do nosso PIB, bem como a crescente desnacionalização da economia.

Não há justificativa razoável para mantermos o contingenciamento de recursos do Orçamento da União em níveis tão altos, sob os aplausos de pequenos círculos financeiros e seus subordinados da grande imprensa.

Enquanto isso, greves eclodem no serviço público, cresce o número de importados e a indústria deixa de utilizar quase 20% de sua capacidade instalada, conforme dados recentemente divulgados pela Confederação Nacional da Indústria. Os espasmos de elevação do consumo, por conta da temporária redução tributária para alguns setores e aumento do crédito, enfrentam apenas a aparência do problema, sem tocar em sua essência.

Consolidar um ambiente de negócios que possibilite maiores investimentos exige melhoria de nossa infra-estrutura, o que só é possível com financiamentos de longo prazo e projetos estruturantes, que não podem ser realizados exclusivamente pelo Estado.

O sistema financeiro deve ser induzido a fomentar a produção nacional, especialmente a intensificação do uso de novas tecnologias que nos permitiria ter uma inserção altiva na divisão internacional do trabalho.

Todavia, tal movimento exige organização popular e parlamentar que dê sustentação a essas mudanças. Enquanto a imprensa nos desvia a atenção com a espetacularização de investigações e CPI’s, cerca de 44% do Orçamento da União é transferido para os bancos, principais detentores de títulos da dívida pública.

Está certo que os avanços obtidos nos últimos anos foram importantes e não podemos fazer coro com o retrocesso. Porém, não podemos nos inebriar com “cortinas de fumaça”: o que está em jogo é o futuro da Nação. A estrada vai muito além do que se vê!

*advogado, professor universitário, Vice-Presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia