"Eu e a UNE": relatos de quem ajudou a construir a história

Durante as comemorações dos 75 anos da União Nacional dos Estudantes (UNE), a entidade recebeu dezenas de emails com histórias de pessoas que ajudaram a construir a história do movimento estudantil e que de alguma maneira suas vidas cruzaram com a trajetória da UNE. Confira algumas dessas histórias selecionadas na campanha "Eu e a UNE 75 anos" promovida por conta da data.

“A UNE orgulha-se de estruturar a sua verdadeira história sobre um fantástico emaranhado de vidas, sonhos, casos, ideias e ações individuais de quem está ou já esteve no movimento”, diz a entidade em sua página.

Lucas, a exobiologia e a primeira bienal

Em 1999, a UNE iniciou o ousado projeto das Bienais, encontros de estudantes de todo o país para valorizar a produção cultural, de ciência e tecnologia dos universitários brasileiros. Atento e disposto a participar, o novato do curso de Geologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Lucas da Arcela inscreveu um trabalho na área de exobiologia (estudo dos efeitos de ambientes extra-terrestres em organismos vivos e do potencial da vida em outros planetas). Não imaginava que sua proposta seria selecionada e o quanto o encontro seria importante para o seu futuro profissional.

“Fui pego completamente de surpresa, durante uma celebração com amigos, ao receber uma carta da UNE me informando que meu trabalho havia sido aprovado. Quando abri e li a carta, em meio à festa, a comemoração foi muito euforica!!”, relata. Atualmente ele coordena grupos e páginas de ciência e de exobiologia no estado da Bahia.

Rosana enrolada na bandeira e as Diretas Já

Ela diz que fez parte da UNE por 20 anos, mas faz questão de lembrar-se de um, o ano de 1984. Naquele momento crucial para o futuro do país, a então estudante paulista Rosana Di Giácomo engrossava as fileiras das manifestações pelas Diretas Já no estado. Em seu relato, ela relembra os momentos tensos e de luta em um protesto na cidade de Bauru.

“Quando chegamos na praça Ruy Barbosa, ponto final do ato, o Romeu Tuma (então superintendente da Polícia Federal no estado) estava presente e o exército pronto para nos reprimir. Foi então que, a uma só voz começamos cantar o hino brasileiro e nos enrolamos na bandeira nacional para não sofrermos nenhum tipo de agressão. Os soldados recuaram.”, relembra.

Antônio, a direção provisória e a reconstrução da UNE

A força da unidade na diversidade sempre foi a grande marca da União Nacional dos Estudantes. Esse patrimônio moral e institucional da UNE, em abrigar democraticamente todas as inúmeras correntes organizadas da juventude foi colocado à prova em momentos extremos de sua história, como o seu congresso de reconstrução no ano de 1979 em Salvador.

O então estudante gaúcho Antônio Escosteguy, que estava presente, enviou um relato impressionante e competente sobre o esforço daquela geração em cumprir com todas as determinações democráticas e plurais do movimento estudantil, mesmo sob fortíssima repressão do regime militar ainda instituído. Houve, inclusive, a necessidade de constituir, antes da eleição da nova diretoria, uma direção provisória, da qual ele participou, para que o processo de reconstrução fosse o mais correto possível:

“Decidido que as eleições seriam diretas , e todos sabendo que este era um processo que levaria algum tempo para ser organizado , vinha a questão de como dirigir a entidade até lá. Foi deliberado, então, criar uma Direção Provisória (DP) , formada não por pessoas, mas por entidades, que indicariam seus representantes”.

Orgulhoso – com muita razão – dessa sua atuação, ele relatou as diversas dificuldades enfrentadas por esse grupo e enviou uma foto histórica do grupo reunido.

Ana Maria, geração Henfil e muitos congressos

Ana Maria de Almeida Ribeiro, técnica em Assuntos Educacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), foi diretora da UNE na gestão de 1987/88. Antes disso, esteve nos Congressos da entidade em 82, 83, 84 e 85. Ana Maria participou ativamente do movimento estudantil e tem muita história pra contar. Confira seu depoimento:

Como diretora da UNE – única mulher naquela gestão – tive a oportunidade de conhecer quase todas as universidades públicas do país, acompanhar as negociações e votações do capítulo de Educação da Constituição Federal de 1988. Acompanhei a organização dos estudantes em defesa da Participação Popular na Constituição, contra o Centrão e também o processo de aumento das mensalidades, normatizado pelo Decreto nº 95.720, de 11 de fevereiro de 1988, que estabeleceu o sistema de “liberdade vigiada”. Além disso, houve também o Decreto nº 95.921, de 14 de abril de 1988, que revogou o Decreto nº 95.720/88, criando novos critérios para fixação dos encargos educacionais.

Sem dúvida, foi um dos momentos mais marcantes da minha vida, tenho orgulho de manter muitos amigos. Tenho orgulho de fazer parte desta geração, que hoje conta com uma comunidade no Facebook. A Geração Henfil – 1987/1990 mantém viva a memória deste momento histórico em nossas vidas e nas vidas dos estudantes brasileiros.

Natanael, o 1º de sua família a ingressar na universidade

Em 1999, Natanael Firmino dos Santos, ainda no ensino secundário, conheceu o movimento estudantil e entrou na luta pela democratização do ensino superior. Após muitas passeatas, debates, panfletagens e atividades de todo o tipo, ele foi convencido de que mudar os rumos da educação brasileira era possível. Hoje, Natanael, morador da baixada fluminense, negro e estudante de escola pública, ocupa uma vaga no curso de pedagogia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e é o primeiro de sua família a ingressar numa universidade. O que possibilitou essa mudança? Natanel é cotista.

”O fato de ser o primeiro da minha família a cursar o ensino superior está longe de ser mérito meramente individual, é na verdade fruto da mobilização de muitos jovens que dedicaram uma parcela significativa de sua juventude na defesa de um país mais justo e menos desigual. É fruto da luta de uma geração liderada por uma entidade que daqui a alguns dias completa 75 anos de muita luta e de um grande serviço prestado a juventude e ao povo Brasileiro. Ou seja, se eu hoje estou na Universidade, UNE A CULPA É SUA! E me enche de orgulho saber que iguais a mim existem milhares de jovens com histórias parecidas espalhadas pelos quatro cantos do Brasil. Viva a luta dos estudantes Viva a UNE”.

Clarissa e Helena: ser mãe no movimento estudantil

A Clarissa Peixoto está entre as milhares de personagens que, assim como Honestino Guimarães, Edson Luíz e tantos outros, ajudaram de alguma forma, a construir a história da UNE. Presidente da União Catarinense dos Estudantes (UCE) em 2008, Clarissa descobriu que ia ser mãe. Ainda sim, viajou SC e o Brasil acompanhando eleições de DCEs, a reconstrução das cidades devastadas pelas chuvas de 2008, a luta pelo acesso à educação pública e de qualidade. Desse modo, a pequena Helena, ainda na barriga, acompanhou todas as atividades, assim como a caravana para o Coneb e Bienal. Com apenas quatro meses, já estavam mãe e filha no Congresso da UNE.

Confira o relato dessa preciosa estudante, mulher e mãe brasileira:

” O que há de mais sincero na minha história em intersecção com a UNE é representado por essa foto. Ela diz muito de quem é a UNE. A UNE somos nós: eu, você, jovens mães, estudantes, trabalhadoras, que acreditam em um mundo melhor para si, para seus filhos, suas filhas. Essa foi a minha última atividade de movimento estudantil. Dividi com a UNE o momento mais especial da minha vida: os primeiros meses da minha filha. Essa somos eu e Helena, no Congresso da UNE, em 2009, onde uma mulher também encerrava sua gestão como presidenta da entidade. Tenho muito orgulho dessa história. Da minha. Da UNE”

Fonte: Site da UNE