Secundaristas chilenos reacendem luta por educação

Ocupações de colégios e greves de fome, feitas por vários estudantes, esboçam os ânimos dos estudantes. Um micro-ônibus com carabineros ocupou o principal colégio público do Chile, uma imagem que recordou a ditadura e irritou ainda mais os estudantes.

Depois que por vários meses o movimento estudantil chileno – que dominou os noticiários, em nível mundial, em 2011 – esteve quieto, foram os secundaristas que reavivaram a luta reivindicativa que aponta para a gratuidade e a qualidade da educação pública, como a coluna vertebral de suas exigências.

Agosto deu lugar às ocupações de estabelecimentos emblemáticos de Santiago, que somados aos discursos frontais de seus dirigentes, com as abusivas desocupações pelas forças especiais de carabineros, conquistaram o efeito desejado pelos jovens: o de recolocar o assunto na agenda (a ponta de paus, batalhas e detenções) e deixar claro para os cidadãos que concretamente o governo de Sebastián Piñera fez pouco para melhorar o sistema educativo. A repressão contra os “pinguins” – que no ano passado custou a vida do menor Manuel Gutiérrez – continua aí, muito próxima de alunos que apenas passam dos quinze anos, no caso de muitos que foram presos.

Uma das coisas que mais teve impacto sobre a cidadania e que encheu os ânimos dos secundaristas foi a ocupação, pelos carabineros, do principal colégio público do Chile: o Instituto Nacional, que há pouco completou 199 anos, e de onde saíram numerosos presidentes do país (Allende e Lagos, entre outros). Um micro-ônibus de efetivos pernoitou em seu interior, impedindo que os alunos tentem tomar o estabelecimento. A imagem traz à memória os melhores anos de Pinochet.

Na segunda-feira, uma batalha campal entre os meninos e os carabineros permitiu que, por algumas horas, os alunos ingressassem no colégio. Mais tarde, os ousados jovens foram fortemente retirados pela polícia, que deteve mais de 10 garotos e alguns representantes e professores, tudo a poucos quarteirões do La Moneda. Não foi tudo. A alguns metros dali, os alunos da Universidade do Chile tomaram a Casa Central e começaram uma votação interna, por faculdade, para determinar o apoio ou não a essa radical medida. Ao final desta edição, uns 20 cursos estavam parados à espera do que decidiriam as assembleias.

Sempre no centro de Santiago, diversos alunos do Instituto Superior de Comércio começaram uma greve de fome em frente ao seu colégio, muitos dos quais se acorrentaram aos portões de entrada. Somente a intervenção dos carabineros conseguiu dissuadir o protesto, que culminou com vários detidos na manhã de terça. Mais tarde, as alunas do Liceu 1 (onde estudou Michelle Bachelet) enfrentaram fortemente os carabineros.

Esse clima incendiado pelos pinguins ganhou força nos universitários, que reconhecem como um erro não terem se organizado melhor no ano passado. Também está claro que o nível de adesão cidadã ao movimento caiu. Por isso, diversas atividades pretendem rivalizar com as pitorescas performances de 2011. Ao protesto com roupa íntima, de segunda-feira, somou-se uma “bicicletada” massiva que aconteceria nesta quarta em Santiago. Hoje haverá diversas marchas com destino às municipalidades e, no sábado, ocorrerá a mais emocionante: uma homenagem na passarela onde há um ano morreu o adolescente Manuel Gutiérrez, devido aos disparos feitos por um carabinero.

“Faremos uma vigília no lugar onde Manuel morreu. Completa-se um ano do assassinato impune de um jovem num protesto, cometido pelos carabineros, nós não esqueceremos isso”, disse ontem Gabriel Boric, presidente dos alunos da Universidade do Chile. Nesse sentido, voltou a criticar o governo por sua pouca capacidade de diálogo. “O ministro da Educação (Harald Beyer) engana, disse que está disposto a dialogar no Congresso as margens de sua proposta, cujas modificações são muito complicadas. Ao final do dia, os projetos se estagnam e o governo se defende dizendo que apresentou sete projetos que ainda não foram discutidos conosco”, disse.

Neste sábado, em Iquique, ao norte do Chile, a Confederação de Estudantes do Chile terá uma plenária que definirá os passos a seguir. Não são descartadas mobilizações mais radicais, como as de 2011, que duraram quase nove meses. Diversos presidentes, de diferentes universidades chilenas, com a Católica, Conceição, Austral e de Santiago, disseram para o jornal Página/12 que não está descartada nenhum tipo de mobilização, inclusive a ocupação dos campus, “sobretudo pelo nulo espaço de diálogo que o governo oferece e pela necessidade de voltar a dar intensidade ao movimento. Estamos preocupados com um governo que não quer arredar o pé de uma agenda privatista da educação”, disse Noam Titelman, da Universidade Católica. Enquanto isso, os secundaristas prosseguem com as ocupações de colégios.

Fonte: Página/12