Ex-PM justiceiro, o Cabo Bruno, é solto após cumprir 27 anos

Deixou ontem a prisão um dos matadores mais conhecidos do país, depois de cumprir 27 anos de prisão. Cabo Bruno, como ficou conhecido o ex-PM Florisvaldo de Oliveira, 53, foi condenado a 120 anos em sete processos diferentes. Apesar de ser suspeito de envolvimento em mais de 50 assassinatos na década de 1980, nem a Promotoria, o Tribunal de Justiça ou sua defesa sabem ao certo quantas mortes foram incluídas nas condenações sofridas na Justiça.

A liberdade foi concedida pela Justiça de Taubaté. Ele estava em uma penitenciária na vizinha cidade de Tremembé. Ele recebeu o "indulto pleno", o que significa que o restante da pena foi extinto. Segundo a Secretaria da Administração Penitenciária, foi liberado por volta das 15h.

Saiu escondido em um carro da Funap (Fundação de Apoio ao Preso) e escoltado pela PM. Segundo o advogado Fábio Tondati Jorge, iria para a casa de parentes, na cidade vizinha Pindamonhangaba.

O pedido de indulto -espécie de "perdão" judicial- recebeu parecer favorável do promotor Paulo José de Palma, com base em decreto presidencial de 2011, que permite libertar quem cumpriu mais de 20 anos de prisão e tenha bom comportamento. "Pedi ao diretor [da penitenciária] uma declaração sobre a conduta prisional dele, e ele fez muitos elogios", diz.

Preso em 1983, o ex-policial chegou a fugir três vezes. Foi recapturado pela última vez em 1991. No mesmo ano, ele tornou-se pastor evangélico. Depois, colaborou na construção de duas capelas no presídio e se casou com Dayse França, que fazia evangelização no local. Passou a pintar telas e fez exposições das obras. Na prisão, se tornou referência religiosa para os presos. Trabalhava na horta e era disciplinado.

Em 2009, a Justiça permitiu que cumprisse o resto da pena em regime semiaberto. Na última semana, foi liberado por cinco dias para passar o Dia dos Pais com a família.

Para o criminalista Paulo Iász de Morais, o indulto atende às necessidades do sistema e está de acordo com a lei. "Se há um bom preso, é mais proveitoso tentar reintegrá-lo do que manter preso", disse. "Independente da pena, ele só poderia ficar preso por 30 anos", diz Carlos Kauffman, professor de processo penal da PUC-SP.

Seu advogado, Fábio Tondati Ferreira Jorge, repete uma frase que, segundo ele, é dita pelo próprio ex-policial:  "É como ele diz: o cabo Bruno morreu há anos. O que restou é o Florisvaldo." Apesar disso e de ter se convertido à religião evangélica, a reportagem apurou que o ex-PM nunca fez questão de se desvincular do apelido de Cabo Bruno – pelo qual era chamado pelos presidiários.

Jorge diz que o ex-policial "tem consciência de que cometeu algum crime", mas afirma que também foi vítima do momento político, tendo em vista que a prisão ocorreu no final da ditadura militar, quando o país experimentava um movimento crescente por democracia e Justiça liderado por estudantes, sindicatos e partidos políticos.

Na década de 1980, Cabo Bruno era acusado de liderar um grupo de extermínio na zona sul de São Paulo. Com o tempo, ganhou fama e muitos mitos foram criados em torno de sua figura. Um deles, é o de que passeava com seu Maverick pelas ruas da Zona Sul escolhendo sua próxima vítima.

Recomeço

Moradora de Taubaté, pastora da Igreja Refúgio em Cristo e cantora gospel, a carioca Dayse, 45, é casada com Bruno há quatro anos. Ela o conheceu há sete, durante trabalho voluntário de evangelização na penitenciária.

Questionada sobre as mais de 50 mortes atribuídas ao marido, disse: "A gente sabe que nem cem anos pagariam o erro que ele cometeu. Deus e a Justiça estão dando outra chance a ele e a gente espera que a sociedade também dê."

Com Folha de S. Paulo