Moradores da Maré fazem campanha para evitar violência policial

O lançamento da campanha “Somos da Maré e temos direitos”, uma iniciativa inédita da Redes da Maré, da Anistia Internacional e do Observatório de Favelas, mobilizou cerca de 100 moradores e integrantes das organizações envolvidas. A ação, que aconteceu na manhã de terça-feira (06) na comunidade Nova Holanda, tem o objetivo garantir o direito pleno dos moradores à segurança pública e prevenir contra abusos e ações desrespeitosas por parte de policiais,

De acordo com os organizadores, grande parte dos moradores da comunidade Nova Holanda aderiram. Esta é a primeira, entre as 16 comunidades que formam o Complexo da Maré, a receber a ação. Folders foram distribuídos de casa em casa e adesivos colados nas portas e muros.

A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), que vem divulgando um número de telefone para denúncias em caso de abusos, esteve presente na ação e aprovou a iniciativa -principalmente por se tratar de uma ação antes da entrada da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP0 na comunidade.

“Não sabemos quando a UPP vai entrar aqui na Maré, mas essa é uma ação que se antecipa e isso é muito positivo pois temos relatos de abusos depois que a polícia entra na comunidade nas ações de pacificação”, diz Renata Souza, moradora da Maré e assessora da comissão.

A orientação das instituições é para que os moradores acionem os serviços de denúncia de abuso policial, como a Corregedoria da Polícia Militar e a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado (Alerj). A Redes da Maré também está disponibilizando um número de apoio aos moradores: (21) 3105.5531.

Os adesivos estão nas portas e janelas das casas com autorização dos moradores. Neles, os dizeres: "Conhecemos nossos direitos! Não entre nessa casa sem respeitar a legalidade da ação. Em caso de desrespeito, ligue para a corregedoria da Polícia Militar: (21) 2725 9098 (24 h).

Até dezembro, 50 mil adesivos e panfletos serão distribuídos em 45 mil domicílios das 16 favelas da Maré.

Apoio dos moradores

Cleide Tavares, 31 anos, diz que reivindica os seus direitos e acha a campanha importante pois a comunidade ainda não está esclarecida. “A polícia tem que tratar o morador de favela da mesma forma que os moradores da zona Sul. Não somos bichos!”.

Já a mineira de 87 anos, Maria Nair Martins da Costa diz que a campanha é muito boa e que vai levar o folder junto com a sua bíblia. “Nunca tive problemas com a polícia e se quiserem entrar na minha casa tudo bem, porque não devo nada. Mas agora sei que sem o mandado não é certo”, comenta.

Quem já passou pela situação de ter a casa invadida por policiais afirma que é uma situação constrangedora e traumática. Doralice Soares, 41 anos, há seis anos teve sua casa invadida por policiais civis que buscavam drogas. “Foi pela manhã. Eu sai de casa, deixei meus filhos dormindo e fui na esquina consertar o ventilador. Um vizinho disse o que estava acontecendo e quando cheguei os policiais já tinham acordado meus filhos e estavam fazendo tortura psicológica com o mais velho”, conta.

“Foi humilhante. Eles tiraram as roupas do guardarroupas e quebraram a boneca da minha filha – que na época tinha seis anos e até hoje tem medo da polícia. Os policiais só foram embora quando meu marido, que trabalha como reciclador, chegou em casa todo sujo do trabalho e conversou com eles. Fiquei muito traumatizada e por três anos eu não podia passar perto da polícia, eu me tremia toda”, relata.

Sem enfrentamento

A campanha deixa claro, porém, que os policiais são funcionários públicos a serviço da população e devem ser apoiados, para que façam o seu trabalho da melhor forma possível. Toda a orientação das instituições responsáveis pela ação aponta para este sentido e se apoia no esclarecimento dos direitos e deveres dos moradores.

“Não queremos o enfrentamento. Estamos chamando a atenção para a necessidade de um planejamento para as ocupações policiais que leve em conta o morador, o que não acontece”, afirma Eliana Silva, coordenadora da ONG Redes da Maré.

“Nós sublinhamos que nossa ação não é contra a polícia, nossa ação é a favor do direito à segurança, que interessa a todas as pessoas. Para que a ação do Estado se sustente ao longo do tempo ela tem que envolver, desde o início e durante sua implementação, os próprios moradores, coisa que não está acontecendo”, disse o diretor da Anistia Internacional no Brasil, Átila Roque.

Conheça o material informativo distribuído

Fonte: Redes de Desenvolvimento da Maré – foto: divulgação Elisângela Leite/Campanha Somos da Maré