Uruguai inicia seleção de grupos para o Carnaval de 2013

Não há coração uruguaio que não carregue um sem fim de motivos para defender Montevidéu como a capital mais carnavalesca do mundo.

Carnaval uruguaio

Neste mês de novembro, desde o dia 12 e até o próximo dia 25, milhares desses corações se reúnem todas as noites no ginásio do clube Defensor Sporting e em várias ruas de bairros do centro velho e da periferia para acompanhar os ensaios e os processos seletivos do que será o Carnaval 2013 no Uruguai.

Outrora marginalizado, e censurado nos tempos da ditadura civil-militar (1973-1985), o carnaval vem se estabelecendo, desde a década de 1990, como a principal expressão cultural uruguaia, além de uma das mais importantes atrações turísticas do país.

Cada pôr-do-sol de novembro é um chamado para que os tambores ganhem as ruas e os bairros da capital uruguaia, que é invadida por mais de cem grupos carnavalescos, de diferentes comunidades da periferia de Montevidéu, divididos em cinco modalidades, entre as quais se destacam a murga e o candombe.

Negros e Lubolos

O candombe, estilo carnavalesco baseado essencialmente na força da percussão, é a principal expressão cultural das comunidades negras de Montevidéu. Tem a mesma origem do candomblé brasileiro, embora a versão uruguaia tenha perdido todo o seu caráter religioso.

Um dos grupos de candombe de Montevidéu é a Comparsa Integración, que surgiu há seis anos da fusão de três grandes bandas tradicionais do Barrio Sur. Héctor Suárez, maestro da bateria da Integración, tem 38 anos e conta que “o candombe é o elo mais forte que ficou entre a comunidade negra uruguaia e as raízes africanas, sobrevivendo a diversos tipos de perseguição”.

Por décadas, as comunidades negras viveram segregadas no centro velho da cidade, no setor sudeste, também chamado de “setor dos inquilinatos” (onde os negros viviam de aluguel), entre os bairros de Cordón, Palermo e Barrio Sur. Ali nasceram as primeiras agrupações de candombe. Durante a última ditadura no país, muitas famílias negras foram expulsas desses bairros e migraram para outras regiões da cidade, o que resultou na propagação dos grupos de candombe, também conhecidos como “comparsas de negros e lubolos”.

Os lubolos são pessoas de outras raças com rosto pintado de negro e que usam roupas características dos escravos, reproduzindo os primeiros brancos que, por vergonha de se exporem diante da sociedade, participavam clandestinamente dos desfiles de candombe nos tempos coloniais.

Há cerca de vinte grupos de candombe em Montevidéu, cada uma reunindo entre 150 e 200 componentes, que neste mês de novembro.

Murgas

A murga é o estilo mais tipicamente uruguaio de bloco carnavalesco. Cada grupo possui 17 pessoas (três percussionistas, um diretor de bloco e treze cantores), que realizam uma performance músico-teatral de pouco menos de uma hora, geralmente satirizando algum tema cotidiano ou do noticiário político nacional e internacional.

Diferente das comparsas, as murgas precisam passar por um processo seletivo que escolhe as que vão participar do concurso oficial do Carnaval de 2013. Estima-se que existam por volta de 130 agrupações de murga em toda a região metropolitana da capital uruguaia.

Um dos grupos mais antigos são os Asaltantes Con Patente, fundado em 1928. A rica história do agrupamento inclui excursões por Brasil, Europa e Estados Unidos, além de um triste período de censura de muitos dos seus temas durante a ditadura. O diretor dos Asaltantes, Martín Angiolini, diz que “o grupo ainda tenta recuperar a hegemonia que tinha antes da ditadura, embora nunca tenhamos deixado de ser um das que mais atrai público”.

Asaltantes con Patente, assim como muitos grupos de murga (sobretudo os mais antigos), é composto integralmente por homens, enquanto os mais novos também incluem mulheres no elenco. É o caso do Cayó La Cabra, grupo criado há seis anos e que participa do processo seletivo com uma murga que satiriza a legalização da maconha no Uruguai. Seu diretor, Emiliano Belmúdez, explica que “nunca houve uma proibição às mulheres na murga, mas antigamente se considerava como ´coisa de homem”. “Essas barreiras vão caindo com o tempo, por não terem razão de existir”.

Existe apenas uma agrupação de murga composta exclusivamente por mulheres, a Zero Bola, que não participa do processo seletivo porque já tem assegurado seu lugar no próximo carnaval, como uma das melhores apresentações na edição de 2012.

Cidade de Deus

Além das murgas e das comparsas de candombe, existem outros três tipos de agrupações carnavalescas no Uruguai: os humoristas, os parodistas e os revisteiros – que fazem humor, paródias e teatro de revista, respectivamente. São grupos geralmente de origem teatral e não comunitária, como as murgas e as comparsas.

Um dos grupos de parodistas deste ano é La Troupe, que apresenta uma paródia do filme brasileiro “Cidade de Deus” adaptada à realidade uruguaia para criticar o projeto de diminuição da maioridade penal no país.

O autor do roteiro da Troupe é o diretor teatral Ernesto Soca, que viu no filme de Fernando Meirelles “a metáfora ideal para apresentar as consequências daninhas que o aumento da maioridade penal poderia trazer para a sociedade uruguaia, e como é muito mais fácil combater os problemas da violência com mais educação, por exemplo”.

O carnaval uruguaio é um dos mais longos do mundo. Em 2013, serão 40 noites, entre a primeira semana de fevereiro e meados do mês de março, que reunirão 43 agrupações divididas nas cinco categorias. No processo de admissão deste ano, 38 grupos buscam um lugar entre as 20 selecionadas para acompanhar as 23 melhores do último carnaval, que já têm a sua vaga garantida para o próximo.

Fonte: Opera Mundi