Cláudia Pires: Cultura – os desafios da nova gestão municipal

 Apostando que coerência e probidade acompanharão o prefeito eleito, manifesto a crença na construção democrática de uma cidade cada vez mais inventada por sua cultura. Pra começar, temos de onde partir

 Em tempos de conexões em redes, o fazer de corriqueira pergunta do presente cotidiano surge pertinente se aciono a memória e vem um evidente traço de gestões culturais na esfera pública local, especialmente na esfera estadual. É pra apontar desafios para a nova administração do município e me ocorre o que considero talvez um dos maiores na área em que atuo. No que você está pensando? Eis a questão. Penso num histórico de descontinuidade que temos acumulado. E não se trata de visualizarmos um não assujeitamento ao que se tem de passado, porque assim teríamos configurado um promissor processo de continuidade produzindo fluidez, avanços. É simplesmente a ação imprópria da ânsia narcísica de afirmação pessoal e, com ela, a desqualificação do acumulado. Não ao tempo zero, diria eu sem pretensões arrogantes, ao novo gestor. Pra começar, temos de onde partir. E muito a consolidar.

Nos últimos tempos frequenta os discursos políticos a defesa do acesso pleno à cultura como possibilidade estratégica de desenvolvimento. Independente das polêmicas geradas pelo que traz esse modo de intervenção convém reafirmar que junto às políticas culturais devem vir estruturas que viabilizem a execução plena das mesmas. Organização inclusive para potencializar o que não cabe regulamentar. Aqui um outro desafio. Na rotina cultural percebemos em geral que as pastas designadas para dar conta do campo cultural têm sido castigadas pela inconstância, carência de pessoal qualificado, insuficiência de recursos e até mesmo pela ausência de projeto. Não é de todo o quadro de Fortaleza, mas cabe atentar para o que temos inaugurado na cidade. É tudo muito recente e por isso mais suscetível a solavancos e desmanches.

Um projeto de cidade deve entender o campo cultural numa abrangência tal que ouse, a partir dele, expandir vitalidades, alargar interesses e necessidades. Partindo disso e considerando o que expressa o prefeito eleito com relação à Fortaleza que recebe no âmbito cultural, tenderemos ao otimismo. Há o compromisso de não tratar a cultura como ônus para a administração. O fortalecimento do Sistema Municipal de Cultura, o repasse integral do percentual garantido por lei ao Fundo Municipal de Cultura, a permanência de projetos como Vila das Artes e Cuca’s, integração de políticas, aperfeiçoamento dos editais, conclusão dos projetos Casa da Fotografia e Teatro São José, disposição para dialogar, manutenção dos eventos já parte do calendário cultural da cidade, para citar algumas das menções explicitadas ainda na campanha eleitoral.

De certo que o furor da disputa traz pra junto dos candidatos as não tão confiáveis promessas. Ainda assim, apostando que coerência e probidade acompanharão o prefeito eleito, manifesto a crença na construção democrática de uma cidade cada vez mais inventada por sua cultura. Pra começar, temos de onde partir.

Cláudia Pires é bailarina

Fonte: O POVO

 Opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as opiniões do site.