Sudão e Sudão do Sul, um ano entre diálogos e tensões
A falta de definição sobre as fronteiras entre o Sudão do Sul e o Sudão, esperada desde a separação de ambos os estados há um ano atrás, impediu que ao final de 2012 fosse saldada a outra dívida para chegar à paz: a distribuição da renda petroleira.
Publicado 22/12/2012 12:40
Ambos os propósitos foram vitais durante várias rodadas de negociação, mas a disputa por limites territoriais prevaleceu sobre a do petróleo, ainda que os dois fossem causa de vários combates entre suas tropas desde abril passado.
Para distribuir os ganhos do petróleo entre os dois países é imprescindível aliviar as tensões ao redor de seus limites fronteiriços, sobretudo mediante o estabelecimento de uma controversa região desmilitarizada para seus exércitos.
Cartum e Juba defendem com igual força seu direito sobre o petróleo, do qual 75% ficaram no novo país, enquanto o Sudão manteve em seu território as instalações do principal oleoduto para sua exportação.
O fato de a economia de ambos os países dependerem desse produto em mais de 90% (98% no caso de Sudão do Sul) é a origem da disputa histórica entre o norte islâmico e o sul, de cristãos e cultos tradicionais.
Os primeiros acordos efetivos durante o ano entre Cartum e Juba foram na Etiópia a fins de julho passado, um deles sobre a criação da citada região pacífica com a retirada dos exércitos para o interior de suas respectivas geografias.
O resultado, parcial por seu alcance e provisório no tempo, foi a aceitação do pagamento a Cartum de 9,48 dólares por cada um dos 350 mil barris diários exportados para o Mar Vermelho através do Sudão do Sul.
Juba pagará um total de três bilhões de dólares durante os três anos e meio que prevê o acordo, equivalentes a um terço das perdas econômicas do Sudão ao ficar sem os poços que explorava quando era um único país.
A terceira medida importante foi aprovada em 27 de setembro deste ano, também em Addis Abeba, pelos presidentes do Sudão, Omar Al-Bashir, e do Sudão do Sul, Salva Kiir, sobre a retomada das exportações petroleiras, postergada várias vezes.
Esse processo negociador tem contado, sobretudo desde meados deste ano, com a mediação da União Africana representada pelo ex-presidente sul-africano Thabo Mbeki, e com fortes pressões do Conselho de Segurança da ONU para ambos os governos.
Apenas dois meses após o último acordo, no entanto, em 21 de novembro, aviões sudaneses bombardearam regiões limítrofes depois de vários meses de recesso dos enfrentamentos, provocados pela paralisação de vendas por parte do Sudão do Sul a princípios deste ano.
Este dezembro serviu de palco, não obstante, para o anúncio sobre o reinício das vendas de petróleo, e para a solicitação de ajuda por ambos os governos à União Africana para retirar suas respectivas tropas de zonas limítrofes.
O Sudão do Sul divulgou em meados de dezembro a retomada dessas exportações, depois de negociações durante os últimos dias em Cartum que, no entanto, não contribuíram para desenhar a disputada região desmilitarizada.
Essa falta de definição com a qual os dois governos chegam ao fim de ano constitui, poderia dizer-se, uma nova versão do mesmo roteiro de outras conversas de 2012 para resolver questões tão vitais para suas economias.
Numerosos acordos entre delegações dos dois países desde a separação do Sudão do Sul em 9 de julho do 2011 foram descumpridos quase de modo sistemático, até os referidos acordos básicos entre julho e setembro passados.
O governo de Juba, que analisa há meses com Cartum medidas sobre a produção, estabilidade de relações e distribuição do petróleo entre os dois estados, assegurou que para o fechamento de ano seria possível carregar um primeiro barco.
Yuba Baqan Amun, representante da delegação sul-sudanesa, explicou depois de um encontro bilateral de dois dias em Cartum que este diálogo abriu o terreno para que os comitês técnicos criados viabilizem os acordos.
"Temos sido capazes de superar todos os obstáculos, mais do que eu pessoalmente esperava", comentou com inusual otimismo o porta-voz sul-sudanês.
Além desses avanços e retrocessos nas relações bilaterais, ainda ficam por resolver outros assuntos, que surgiram não só a partir da independência de Juba em 9 de julho, mas de outros momentos bélicos de quando o Sudão era um só Estado.
A região que agora integram os dois países, na antiguidade chamada de Nubia, sofreu com uma guerra civil de 46 anos entre sudaneses do sul e do norte, cuja origem flutua quase sempre ao redor do petróleo e de assuntos tribais.
Entre essas questões a serem resolvidas figura a atuação de grupos guerrilheiros em regiões de ambos os países, sobre cujo apoio os dois governos se acusam mutuamente, enquanto morrem insurgentes, soldados e civis sem que seja visível uma solução.
Outro assunto vigente é a volta de grande quantidade de sul-sudaneses emigrados ao Sudão, 350 mil dos quais voltaram desde outubro de 2010 e é difícil para Juba recebê-los dentro de sua nova sociedade, a mais jovem do mundo.
Prensa Latina