Obama indica republicano controverso para Secretário de Defesa
Esta semana, o presidente Barack Obama nomeou um antigo senador republicano para o cargo de Secretário de Defesa, Chuck Hagel, em substituição do atual, Leon Panetta.
Por Moara Crivelente*, especial para o Portal Vermelho
Publicado 09/01/2013 16:41
O nome ainda tem de ser aceito pelo Senado, o que tem mostrado ser um desafio: muitos, entre republicanos e democratas, já criticaram algumas posições do ex-senador, inclusive uma suposta permissividade para com o Irã e outra suposta firmeza exagerada em relação a Israel, segundo os republicanos.
Obama justifica que a escolha se deve ao comprometimento de Hagel com o consenso, que lhe garantiu o respeito de líderes militares e da segurança nacional, e à disposição de defender suas opiniões, mesmo que contrárias às convencionais (o que também é motivo de críticas para os republicanos, que perefeririam alguém que mantivesse o “pensamento padrão” dos EUA em política externa).
Além das críticas republicanas, a nomeação de Hagel é alvo também das reivindicações de alguns democratas, que preferem que um dos seus seja nomeado para o posto. Hagel foi um soldado na Guerra do Vietnã, apoiou a Guerra do Iraque (apesar de ter criticado a forma com que a guerra foi conduzida e o aumento de tropas no solo, durante a administração Bush) e tem dado conselhos ao presidente Obama em matérias de segurança nacional, segundo Al Jazeera. Tem também criticado as sanções unilaterais contra o Irã, tomando-as por “contraproducentes” (mesmo que apoiando a tachação do país como “patrocinador de terrorismo”). Pergunta: “Como podemos doutrinar outros países para que não tenham armas nucleares, quando nós podemos, e nossos aliados podem? Não há credibilidade, não há lógica nesse argumento.”
Hagel está envolvido em conversações com o Hamas, que governa a Faixa de Gaza, o que vai de encontro à política oficial dos EUA; ao contrário, de acordo com o “pensamento padrão” e com essa política, Hagel deveria estar liderando as relações militares com Israel. Mas estes são apenas alguns dos desafios que o ex-senador enfrenta, já que terá de lidar também com as reduções de orçamento e com o desgaste causado por anos de guerras, desde o 11 de setembro.
Sobre Israel, Hagel havia dito que “o lobby judeu intimida muita gente por aqui”, em 2008, mas ainda assim apoiou a decisão de enviar bilhões de dólares em ajuda militar para o país. A tensão se enquadra em um período de completa estagnação do processo de paz (há quase duas décadas iniciado pela série de Acordos de Oslo) entre Israel e Palestina, reconhecida pela ONU como Estado não-membro mas ainda longe de ser efetivamente aceita como tal pelos israelenses. Ainda, centros de estudos sobre política externa, como o estadunidense Brookings, já haviam questionado a eficácia do Quarteto (EUA, ONU, União Europeia e Rússia) nessas negociações. De acordo com o relatório da instituição, o Quarteto “não funciona” porque as ações do grupo praticamente colidem com os interesses particulares dos seus membros: por exemplo, o relatório faz menção à reação contra a vitória do Hamas nas eleições de 2006, ao não reconhecer a legitimidade do episódio e excluir o partido das negociações, tachando-o de terrorista, em acordo com o governo de Israel. Já ficou constatada a consequência extremamente negativa da exclusão de um ator tão relevante como o Hamas das negociações para a resolução do conflito.
A preocupação de alguns críticos se refere principalmente à postura e à manutenção da relevância dos EUA na região, o que parece ser visto como garantido pelo mencionado “pensamento padrão” em matéria de política externa. Que tipo de “poder americano” procura-se manter é uma outra questão, já que as relações regionais não dão assim tantas amostras de melhoria quando envolvendo os EUA, não só com relação ao Irã mas principalmente na questão Israel-Palestina, em que os EUA certamente poderiam ter influenciado de forma producente, e há muito. Neste sentido, como bem lembrado em um programa da rede Al Jazeera, cabe ao presidente fazer política, e não ao secretário de Defesa.
Já na nomeação de um chefe para a CIA, Obama escolheu John Brennan, que já ocupava cargos importantes na central durante a administração Bush e que esteve envolvido em práticas controversas sobre a tortura (ou os “métodos avançados de interrogação”, como foram denominadas algumas práticas à época da polêmica, especialmente em redes de TV como a FOX, que seguia instruções republicanas). Atualmente, Brennan é o conselheiro de contra-terrorismo de Obama. O uso indiscriminado e irresponsável de aviões não tripulados (drones) em ataques no Paquistão, no Afeganistão, e no Iraque, por exemplo, é outro tema de polêmica.
A ex-oficial do Departamento de Estado dos EUA, Hillary Leverett, chama esse e outros temas de “desastres estratégicos” nas guerras conduzidas desde o 11 de setembro. Neste sentido, afirma que a nomeação de um secretário de defesa que pensa “fora da caixa” em política externa pode ser a tentativa de Obama de voltar à sua promessa de saída das guerras em que os EUA se envolveu, no Oriente Médio. Para os próprios países em que estabeleceram suas tropas ou para os países em que estabelecem a sua influência decadente, como Israel, porém, ainda não ficou muito clara a relevância de uma mudança de paradigma em política externa apenas baseada na nomeação de Hagel, já que, como lembrado antes, quem deve fazer política é Obama e, ainda, “o lobby judeu intimida muita gente”.
*Moara Crivelente é mestre em Comunicação dos Conflitos Armados Internacionais e dos Sociais pela Universidade Autônoma de Barcelona e cientista política.