Movimentos repudiam eleição de Feliciano para Direitos Humanos
Na última quinta-feira (7), um fato inusitado tomou conta dos noticiários, das redes sociais e também das rodas de bate-papos pelo Brasil. Onze parlamentares votaram pela escolha do deputado federal e pastor Marco Feliciano (PSC-SP), conhecido por declarações homofóbicas e racistas, para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.
Publicado 11/03/2013 13:10
Este fato gerou uma mobilização popular que possibilitou o debate sobre preconceito, discriminação e se questionou a legitimidade dos representantes dos brasileiros no Poder Legislativo nacional, representado pela Câmara dos Deputados.
Após a eleição de Feliciano para a presidência da Comissão, representantes de vários movimentos sociais que tratam do tema Direitos Humanos se manifestaram através de notas de repúdio, nas redes e nas ruas, e estão de acordo que esta escolha significa um retrocesso das conquistas sociais que os movimentos têm alcançado até hoje.
Um exemplo disso é a nota publicada pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) que se manifesta avesso à ocupação da Comissão da Câmara por parlamentares que tenham manifestações públicas contrárias aos direitos humanos e que não possuam perfil condizente com a missão daquele colegiado.
Diversas outras notas públicas repudiaram a atitude do parlamentar eleito e conclamaram o Congresso Nacional para que realize esforços “para evitar esse retrocesso e que primem pelo restabelecimento e fortalecimento da Comissão como um espaço verdadeiramente comprometido com a luta pela defesa e promoção dos direitos humanos”, disse, em nota, a Unegro (União de Negros Pela Igualdade).
Edson França, diretor da Unegro, disse acreditar que a indicação de Marco Feliciano vai atrapalhar o entendimento correto das matérias relacionadas às igualdades. “Não há compreensão que uma pessoa que fala que negros são amaldiçoados possa coordenar com êxito uma comissão que defende estes mesmos negros. Ele não tem legitimidade. Disse depois que não tinha a intenção de falar aquilo, mas qual era a intenção dele? Isso ele não disse”, afirma Edson.
Movimentos LGBT
A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), que congrega 284 organizações em todo o território brasileiro, também publicou nota com indignação ao nome do pastor.
“O parlamentar indicado para presidir a mencionada Comissão [de Direitos Humanos] tem feito reiterados pronunciamentos públicos na contramão dos objetivos primordiais desta comissão. Sabemos que em mais de uma ocasião, teceu comentários depreciativos à população LGBT, mostrando-se totalmente refratário ao reconhecimento dos direitos destas pessoas. Na contramão do entendimento do Supremo Tribunal Federal, que através da aprovação da ADI 4277 e da ADPF 132, declarou publicamente a legitimidade da existência de pessoas LGBT em nossa sociedade, em face de princípios constitucionais pétreos, a saber: a liberdade, a igualdade, a isonomia e a não discriminação”, defendeu a entidade.
Em nota, os ativistas homossexuais se declararam surpresos com a indicação e repudiaram o nome escolhido para o comando da Comissão de Direitos Humanos. O movimento disse, em nota, que as críticas não se referem ao PSC, partido do deputado, nem tampouco à religião dele, mas ao político Marco Feliciano que tem registros em vídeo e nas redes sociais que atestam que ele tem posições contrárias aos anseios da comunidade LGBT.
Para o secretário de Educação da ABGLT, Toni Reis, “é como colocar lobo cuidando de ovelhas. Ele não tem sensibilidade nenhuma com este tema e usa uma argumentação esdrúxula”, disse indignado o ativista.
Existem outras ações contra a eleição do deputado Marco Feliciano, como as ligadas às comunidades quilombolas e ao combate ao trabalho escravo. O projeto de combate à tortura discutido pelo Executivo, por exemplo, está engavetado na Comissão de Direitos Humanos.
Sobrou até para o PT
Em outra ocasião, o parlamentar do PSC disse que a ex-senadora e atual ministra da Cultura, Marta Suplicy (PT) e a deputada federal Érica Kokay (PT-DF), defensoras do PLC 122 que prevê a criminalização da homofobia, são “mulheres com sexualidade distorcida”.
Estelionato e homofobia
O novo presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara é réu em uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) – por ter foro privilegiado – por crime de estelionato. Ele é acusado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul por não ter comparecido em um show gospel, evento pelo qual já havia recebido cachê, passagens e hospedagem. O deputado também é alvo de um inquérito por preconceito e discriminação no mesmo tribunal por causa de uma frase escrita em sua conta no microblog Twitter em 2011.
Manifestações
No sábado (9), atos de protesto foram marcados pela internet com a participação de organizações sociais que reuniram milhares de jovens em passeata nas ruas de pelo menos 16 cidades. Tais atos tiveram o objetivo de demonstrar a indignação da população com a escolha de um parlamentar supostamente racista e homofóbico para presidir uma Comisão que trata sobre o assunto.
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O bom debate
Uma parte positiva desta trama toda: Todo esse escândalo e a polêmica em torno deste assunto possibilitaram o despertar da consciência discriminatória que foi colocada como alvo de discussões e debates, até mesmo por meios de comunicação que geralmente debatem temas banais e artificiais.
Com isso chegamos ao ponto de acreditar que o racismo e a discriminação são abomináveis aos olhos da sociedade de hoje – infelizmente ainda não da maioria – mas reforça assim a busca da igualdade e respeito.
Outro fato que nos acalenta é que a Constituição Federal aponta que o racismo é crime inafiançável e imprescritível segundo o art. 5º inciso XLII, o qual ganhou efetividade através das leis nº 7.716/89 e 9.459/97 e do livre acesso à justiça.
Entretanto, neste caso, este tema não poderá ser tratado na Justiça comum, já que o deputado tem foro privilegiado, e assim voltemos ao debate que justiça seja feita, para todos. Entremos então em outra discussão.
Eliz Brandão, da Redação, para o Portal Vermelho