Escritor paraibano parabeniza Mujica por condenação de militar

O general uruguaio Miguel Dalmao foi condenado a 28 anos de prisão por homicídio, com agravantes na morte de uma prisioneira comunista, Nibia Sabalsagaray, torturada na prisão em 1974. O advogado de Dalmao, Miguel Langón, recorreu da sentença. Diante da condenação, feita pela Suprema Corte de Justiça do Uruguai, o escritor Agassiz Almeida endereçou ao presidente do Uruguai José Mujica uma mensagem parabenizando a decisão. Abaixo, a íntegra da carta.

Não vamos produzir rebanhos humanos e sim formar homens.
Que vergonhosas páginas da nossa história vamos legar às futuras gerações!

Na atual conjuntura política-econômica em que se debatem os países sul-americanos na busca pela consolidação democrática, a nação presidida por Vossa Excelência se afirma no cenário mundial com a decisão da Suprema Corte de Justiça do seu país condenando o general Miguel Dalmao à 26 anos de prisão por crimes de lesa-humanidade praticados durante a ditadura militar que desabou sobre o Uruguai de 1973 a 1985.

Com esta atitude, a sua nação pontua respeito à Justiça e à História, imperativos do próprio Estado Democrático de Direito.

Na Argentina, um emblemático protótipo do terror militarista, general Rafael Vilela, morreu nos cárceres cumprindo prisão perpétua. Nos países democráticos, europeus e latino-americanos, os tiranos de crimes de lesa-humanidade são arrastados às barras da Justiça.

No Brasil, apoiados numa lei de anistia editada, em plena ditadura, por um Congresso castrado, pacto entre certa elite política e a corporação militar, os torturadores e genocidas desfilam o cinismo e a arrogância.

No Brasil a que se assiste? Que o país está ajoelhado no banco dos réus perante órgãos internacionais, como a ONU e a OEA. Que os criminosos de lesa-humanidade estão envelhecidos e que eles receberam o passaporte da impunidade.

Criam-se comissões da verdade e justiça para se alcançar que objetivos ? Tudo isto salta à consciência livre da nação que se encena uma ópera bufa, no final da qual abjetos delinqüentes dos porões da tirania se autoglorificam.

O que se procura à sombra de interesses vis? Fazer crê que as torturas e os crimes de sequestro e desaparecimento dos assassinados estão prescritos e amparados por uma caolha lei de anistia.

A história de uma nação democrática não pode conviver com um passado de 21 anos de autoritarismo em que o terrorismo de Estado violentou infamemente os direitos básicos da cidadania, e que não se pode compatibilizar com uma anistia a cara nauseabunda do torturador e a dor infinita que violenta a nação e os familiares das vítimas, com os desaparecimentos de centenas de jovens executados; tipologia criminosa desconhecida nos anais dos séculos como decisão de Estado.

Uma nação que silencia diante de aberrações criminosas que sangraram o seu povo, está condenada a produzir rebanhos humanos, e não homens; estes carregam ideais e indignações, aqueles apetites e subserviências.

Que vergonhosas e oprobriosas páginas da nossa história vamos legar às futuras gerações. O que elas dirão? Que fomos cúmplices dos criminosos que infestaram os desvãos da tirania fardada.

Os vencedores do autoritarismo impuseram a sua razão pelo terror e pelas armas; a história abre as suas páginas à verdade dos fatos, apontando como agiram os bufões que se investiram de valentes, e os heróis que não se curvaram ao poder da força.

Por que devemos continuar a nossa luta, Senhor Presidente, que vem de anos longínquos? Para que num amanhã dos tempos não sejamos cúmplices, pelo silêncio, dos genocidas de lesa-humanidade.

Como olhamos a história? Monumento erigido para honrar e exaltar os heróis e os revolucionários, e marcar com o ferrete da ignomínia os réprobos e os tiranos.

Saudações latino-americanas

Agassiz Almeida

* Agassiz Almeida é escritor e ativista dos direitos humanos, ex-deputado federal constituinte. Autor de obras consagradas sobre o militarismo e o elitismo. Recentemente, lançou o livro “ O fenômeno humano. Reais objetivos da viagem de Charles Darwin no HMS- Beagle,” no qual desvenda a farsa montada pelo Império Britânico, no século XIX, para usurpar as riquezas dos países sul-americanos.

Fonte: Centro de Referência em Direitos Humanos do Agreste da Paraíba