Governo gaúcho propõe democracia direta e constituinte

A combinação de instrumentos e práticas de democracia direta com a representação política clássica deve ser uma das respostas do Estado às crescentes críticas e insatisfações, por parte da sociedade, ao atual modelo de representação política vigente no país. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, reafirmou essa posição na abertura do Seminário “Crise da Representação e Renovação da Democracia”, na tarde desta quinta-feira (5), no Palácio Piratini.


Manuela D’Ávila recebeu resultado da consulta popular sobre Reforma Política | Foto: Caco Argemi/Palácio Piratini

O diagnóstico do esgotamento desse modelo foi um consenso entre os participantes do painel de abertura do encontro que apontaram também a eleição de uma Assembleia Constituinte exclusiva para a Reforma Política como medida indispensável para dar resposta ao que vem se ouvindo nas ruas de todo o país.

Durante uma entrevista coletiva com blogueiros do Rio Grande do Sul, acompanhada por jornalistas e convidados de outros estados, o chefe do Executivo gaúcho bateu nesta tecla com insistência, assinalando que seu governo vem tentando implementar uma série de práticas combinadas para enfrentar essa crise da representação política. “Acredito que estamos fazendo algo inédito no Rio Grande do Sul. Esse ineditismo vem justamente da combinação de várias formas de participação: plenárias do Orçamento Participativo nas cidades que já reuniram quase 100 mil pessoas este ano, participação por meio do Gabinete Digital, debates do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, consultas à população”, citou Tarso. “Esses mecanismos ainda não estão azeitados de maneira acabada, mas tem tido um resultado altamente positivo no sentido de quebrar as barreiras burocráticas que separam o Estado do cidadão comum”, acrescentou o governador.

Tarso destacou a utilização de mecanismos digitais para fazer os questionamentos que interessam à população, como ocorreu no caso da consulta popular sobre a Reforma Política, cujo resultado foi entregue oficialmente a deputada Manuela D’Ávila (PCdoB), representando a bancada federal gaúcha. “Esse ato político simboliza um pouco o processo de Reforma Política que o Brasil precisa. Talvez o governo do Rio Grande do Sul tenha sido o que mais conseguiu se aproximar das ruas nas recentes manifestações de junho e julho, por meio das ferramentas do Gabinete Digital. Precisamos ampliar essas práticas para todo o país”, disse Manuela ao receber o documento.

A Reforma Política, como era de se esperar, foi um tema central na abertura do Seminário. Houve um consenso também no diagnóstico do esvaziamento da esfera da política e da ação dos partidos hoje no Brasil. “Para enfrentar essa crise da legitimidade, precisamos quebrar as barreiras que separam o Estado do cidadão comum. Há um desconforto e uma inconformidade evidentes com a atual ordem política. A democracia representativa não é mais suficiente para dar conta desse cenário”, defendeu o governador do RS.

O caminho entre o diagnóstico e a solução do problema, porém, está minado de contradições. Na coletiva, Tarso Genro foi questionado por blogueiros sobre algumas contradições de seu governo como a ação da Brigada Militar durante as manifestações e a destinação da maior parcela das verbas de publicidade para a chamada grande mídia. O governador admitiu que essas são, de fato, contradições de seu governo, mas ressaltou que elas, as contradições, são intrínsecas ao ato de governar:

“Eu costumo perguntar a militantes de partidos de ultraesquerda o que fariam se estivessem no governo. Eles são sinceros e respondem que não querem chegar ao governo, mas sim destruir o Estado. Acho que é uma posição equivocada, mas é uma posição política. Nós temos que governar, lidando com as contradições. Essas contradições só existem para quem governa. No caso das cotas de mídia, não podemos fazer uma distribuição equitativa desses recursos hoje pois seríamos penalizados pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Contas, que exige uma distribuição segundo critérios de audiência. Para mudar isso, precisamos de uma lei. Estamos tentando enfrentar esse tema, diversificando mais a distribuição de recursos, mas ela ainda é desigual.

Questionado por um jornalista italiano, Tarso voltou a defende o projeto de refundação do PT, proposta lançada por ele em 2005, quando ocupou a presidência nacional do partido por um período. “O projeto de refundação está apenas hibernando. Hoje ele é representado de forma mais significativa pelas forças políticas que compõem a Mensagem ao Partido. E a história está nos dando razão. O PT ainda é a grande esperança de uma esquerda democrática e socialista do país, mas há um risco inegável de tradicionalização do partido muito grande, como ficou evidente no recente caso da substituição do deputado Henrique Fontana pelo deputado Vaccarezza na condução do debate da Reforma Política na Câmara Federal. Esse caso deixou claro que a proposta da refundação precisa ser retomada”.

O seminário sobre a crise da representação propõe o debate sobre como a atuação do Congresso Nacional hoje pouco tem a ver hoje com as questões fundamentais do país. “É um acordo permanente de representação de retalhos e interesses regionais e corporativos. Se esse Congresso não for profundamente renovado nas eleições de 2014, e acho que não vai ser, creio que se colocará na ordem do dia a proposta da Constituinte livre, soberana e originária para a Reforma Política. A resposta dada à proposta do plebiscito popular é mais uma evidência de que o Congresso hoje é um instrumento de representação politicamente superado”, concluiu o governador gaúcho.

Fonte: Sul21