Debate sobre terceirização confronta capital e trabalho 

A comissão geral para debater o projeto de lei que trata da terceirização no Brasil, de autoria do deputado-empresário Sandro Mabel (PMDB-GO), produziu muito bate-boca no Plenário da Câmara nesta quarta-feira (18). Os sindicalistas que se manifestaram contra o projeto foram reprimidos pela polícia e impedidos de acessar as galerias para acompanhar o debate. O auge da discussão ocorreu quando o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) chamou os trabalhadores de “bandidos”. 

Debate na Câmara da terceirização confronta capital e trabalho - Agência Câmara

Os deputados representantes dos trabalhadores exigiram a retirada, da ata da sessão, da palavra ofensiva aos trabalhadores e alertaram o deputado de que a fala dele poderia resultar em abertura de processo por quebra de decoro parlamentar. 

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Além dos deputados, falaram em Plenário representantes da Justiça do Trabalho e das centrais sindicais, revezando-se em um orador contrário e outro favorável ao projeto. Quem abriu os debates foi o autor do projeto, que alegou que a matéria regulamenta o trabalho terceirizado e que daria segurança jurídica aos 15 milhões de terceirizados no Brasil.

A fala de Mabel foi acompanhada de vaias dos representantes das centrais sindicais que conseguiram acessar as galerias da Casa após a interferência dos líderes partidários do PCdoB, PSB, PDT e PT, que se posicionam contrários ao projeto. E rechaçada pelo ministro do Superior Tribunal do Trabalho (TST), Maurício Delgado, que falou em seguida, contrário ao projeto. Ele é um dos signatários da carta aberta que apresenta o posicionamento de 19 ministros do TST sobre o projeto.

Ele destacou que a Justiça não pode ter opinião antes que o projeto se torne lei, mas que 73% dos ministros, com mais de 25 anos de atuação no julgamento de casos de terceirização – mais de mil processos por mês – acreditam que ao invés de regular e restringir, o projeto torna a terceirização universal.

Teoria e prática

Delgado disse que a opinião dos juízes está baseada na teoria – conhecimento do projeto – e da prática – reclamações trabalhistas de terceirizados nos tribunais da Justiça do Trabalho. E que demostra conhecimento da realidade do Brasil, os juízes do trabalho defendem que a terceirização seja regulamentada, mas que restrinja aquilo que provoca malefícios sociais, o que não ocorre no projeto de Mabel.

“Os malefícios devem servir de exemplo para restringir a terceirização”, alega o ministro, citando como um exemplo de malefícios sociais o rebaixamento da renda no trabalho em cerca de 30% de imediato, o que provocaria “um mal impressionante na economia e sociedade brasileiras”.

A exemplo dos oradores que o seguiram, como o deputado como Assis Melo (PCdoB-RS) e o sindicalista Wagner Gomes, da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), o ministro do TST disse ainda que com a aprovação do projeto, todas as empresas vão terceirizar suas atividades e haverá o desaparecimento das categorias profissionais, o que terá “um efeito avassalador sobre as conquistas históricas trabalhistas reconhecidas na Constituição Federal”.

Diferente e discriminatório

Assis Melo, em sua fala, disse que a bancada do PCdoB é contra o projeto, reafirmando que este produz empregos precários e transitórios, além de salários reduzidos e piora nas condições de saúde. “A terceirização produz tratamento diferenciado e discriminatório entre os trabalhadores”, disse o deputado, explicando que, em nota oficial, a bancada do PCdoB se posiciona pela busca da regulamentação e não pela liberalização da terceirização.

Wagner Gomes, da CTB (foto ao lado), em seu discurso, destacou que a terceirização está sendo usada para rebaixar os salários e retirar benefícios dos trabalhadores. E negou que o projeto vá proteger 15 milhões, ao contrário, vai permitir que todas as empresas possam terceirizar, prejudicando todos os demais trabalhadores que sejam terceirizados.

“O que está em jogo aqui é o interesse dos empresários e banqueiros, que não têm responsabilidade social no país. Enquanto lutamos para que o país cresça e seja um país solidário, aparece esse projeto que prejudica os trabalhadores”, avalia Gomes.

Ele explicou que atualmente somente os serviços de limpeza, segurança e alimentação são terceirizados e o projeto abre a possibilidade para que todas as atividades das empresas, inclusive as atividades-fim, possam ser terceirizadas, “para pagar menos e oferecer menos benefícios”, alertou o líder sindical.

Dignidade para todos

Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) queixou-se da Câmara produzir debate sobre o que prejudica os trabalhadores, ao invés de discutir o projeto de lei que reduz a jornada de trabalho, a regulamentação da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que estabelece negociação coletiva para trabalhadores do setor público e outros projetos que sejam essenciais ao desenvolvimento do Brasil.

E, respondendo ao autor do projeto, a quem se dirigiu como “o empresário dono de fábrica de biscoito”, disse que não fala a respeito da dignidade de 15 milhões de trabalhadores, mas da dignidade de todos os trabalhadores, “que devemos preservar”, destacou.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara já tentou votar o projeto de Mabel, mas a votação foi adiada após protestos de manifestantes das centrais sindicais. O debate em comissão geral foi proposto pelo presidente da Câmara, deputado Henrique Alves (PMDB-RN), na tentativa de buscar pontos de consenso que viabilizem a votação do projeto.

O projeto permite a contratação de serviços terceirizados nas chamadas atividades-fim de uma empresa. As centrais sindicais consideram essa medida uma precarização dos direitos trabalhistas.

De Brasília
Márcia Xavier