Jeosafá: Ditadura militar, um cadáver adiado que procria

No debate entre os professores Reginaldo Moraes, cientista político (UNICAMP) e Murilo Leal (UNIFESP), no lançamento de 1964: o golpe que marcou a ferro uma geração, esteve em foco os momentos dramáticos da derrubada do presidente João Goulart (Jango).

Por Jeosafá Fernandez Gonçalves*, em seu Blog Nova Alexandria

Esse evento, agora na livraria Martins Fontes, da av. Paulista, dá continuidade àquele realizado no Espaço Cultural Nelson dos Reis, quando o autor de 1964 participou, com Roniwalter Jatobá, autor de A crise do regime militar, do pinga-fogo sobre os 50 anos do golpe militar de 1964.

Com o auditório completo, os professores traçaram o panorama dos acontecimentos da crise que lançou o país no mais longo período de ditadura de sua história, do papel da imprensa à Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em apoio ao golpe militar, passando pelo comício da Central do Brasil, em apoio a Jango.

A comparação entre aquele período e os dias de hoje foi inevitável, e coube às perguntas do plenário pôr em questão semelhanças e diferenças, principalmente quando está marcada para os próximos dias uma segunda edição dessa Marcha, convocada pelas redes sociais, que não só comemora o golpe como defende uma intervenção militar hoje.

O professor Murilo Leal considerou que o aprofundamento de mudanças sociais desperta resistência em setores que historicamente se beneficiaram do Estado. Segundo ele, esses setores, ao perceberem que dificilmente terão sucesso por vias eleitorais, enveredam pelo golpismo, tal como fez a UDN no período que desembocou no golpe militar – que todavia não a poupou, caçando o mandato de seu principal líder, Carlos Lacerda, e extinguindo-a junto com os demais partidos nos primeiros momentos da ditadura.

Para o professor Reginaldo Moraes, a forma como a ditadura saiu de cena no Brasil abre espaço para que saudosos do regime autoritário eventualmente se sintam estimulados à reincidência. Para ele, as manifestações de grupos que apregoam a volta do regime militar, nas ruas e nas redes sociais, demonstra que a ditadura é, parafraseando Fernando Pessoa, "um cadáver adiado que procria", cuja história precisa ser completamente dissecada e exposta, de maneira a não mais assombrar o presente e projetar sombras aziagas sobre o futuro.

*Jeosafá Fernandez Gonçalves é escritor e dirigente do PCdoB em São Paulo.