"Israel prende 900 crianças palestinas por ano", afirma ativista

Neste domingo (30), a Palestina comemora o Dia da Terra, data que lembra a greve geral realizada em 1976, quando o governo de Israel anunciou um plano para confiscar terras. Os palestinos resistiram, mas foram reprimidos pelo exército ocupante. O Vermelho, que está na Cisjordânia e acompanha a Missão de Solidariedade ao Povo Palestino, ouviu relatos de ativistas sobre alguns dos abusos que os palestinos ainda sofrem por parte dos israelenses.

Por Théa Rodrigues, de Ramallah para o Portal Vermelho

Dia da Terra: Palestinos ainda sofrem com violações de Israel - Théa Rodrigues/Portal Vermelho

Em 1976 o governo israelense divulgou um plano de apropriação de territórios árabes para a construção de novos assentamentos judaicos. No dia 30 de março do ano referido, o povo palestino realizou uma greve geral e várias passeatas em resposta àquilo que estava sendo justificado como "medida de segurança". Por sua vez, o exército israelense enviou tropas a três aldeias (Sakhnin, Arraba e Deir Hanna) a fim de reprimir as manifestações. A presença das forças militares transformou a greve em protesto e, pouco depois, em revolta. O confronto resultou em 6 árabes mortos, além de 96 feridos e 300 presos.

Exatos 38 anos depois, os palestinos continuam a reiterar a demanda pelo fim da divisão dos territórios palestinos e da ocupação israelense na Cisjordânia e em Jerusalém. O Portal Vermelho está em Ramallah, na Cisjordânia, onde acompanha a delegação da Terceira Missão de Solidariedade ao Povo Palestino (organizada pelo Comitê Pela Criação do Estado da Palestina e que traz representantes de diversas entidades brasileiras), e entrevistou alguns ativistas e defensores dos direitos humanos que também lutam pela causa na região.

Brasileiro relata frequentes violações das leis internacionais

Entrevistado pelo Vermelho, um jovem ativista brasileiro, que acompanha as situações de vulnerabilidade dos direitos humanos pela organização Cristian Peacemaker Team, preferiu não se identificar para evitar problemas nos check-points (postos militares de controle sionista) – isto porque Israel faz um controle minucioso daqueles que entram e saem dos territórios palestinos e, como já é sabido, dificultam o trânsito dos que oferecem qualquer tipo de ajuda à Palestina.

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O brasileiro contou que sua organização registra com frequência diversas violações das leis internacionais por parte dos sionistas. “A própria ocupação, como é organizada e a maneira como está presente na fragmentação dos territórios palestinos é a mais gritante dessas violações”, afirmou. De acordo com o ativista, “há postos de controle em locais onde as pessoas precisam passar diariamente e ali sofrem todo o tipo de assédio moral. Isso é um ponto de humilhação para o povo palestino”.

Em alguns lugares, as crianças precisam passar por um posto de controle para chegar à escola. O brasileiro afirmou que elas têm suas mochilas revistadas todos os dias e muitas são impedidas de passar. Segundo o defensor dos direitos humanos, nesses lugares os confrontos também acontecem todos os dias e os jovens além de conviver com a violência acabam se envolvendo nesses episódios.

Ele lembrou ainda que há uma dura repressão dos militares israelenses a qualquer manifestação pacífica. “Pessoas são presas porque na lei militar israelense que rege esses territórios, não há direitos políticos. Proferir um discurso político pode ser considerado ilegal. Até mesmo carregar bandeiras palestinas pode ser considerado ‘ameaça’. Os israelenses utilizam a questão da ‘segurança’ como desculpa para tudo”, disse.

A lei militar para os territórios palestinos é diferente da lei israelense que protege os colonos. De acordo com o ativista, os militares podem prender crianças a partir dos 12 anos de idade. Em março do ano passado, 27 jovens foram presos de uma vez. Além disso, elas são interrogadas, muitas vezes vítimas de maus tratos e de reações desproporcionais por parte do exército israelense, o que configura uma clara violação aos direitos das crianças. “Uma criança joga uma pedra contra um posto de controle e o exército responde com bomba de gás lacrimogêneo”, relatou ele.

Os israelenses alegam que crianças podem ser utilizadas como “homens-bomba”, o que configura crime de terrorismo. De acordo com o brasileiro, houve 9 casos desses registrados durante a Segunda Intifada (revolta civil dos palestinos contra a política administrativa e a ocupação Israelense na região da Palestina a partir de setembro de 2000) e mais nenhum desde então. Por outro lado, dados mostram que 900 crianças palestinas são presas por ano pelo exército de Israel.

Um israelense contra a ocupação

Ben Ronen é israelense, vive em Tel Aviv, mas há 10 anos atravessa a fronteira para participar dos protestos chamados de “demonstração” – uma forma de resistência pacífica, que marca a presença palestina e chama a atenção para o aumento da capacidade de anexação do território – que acontecem tradicionalmente às sextas-feiras.

Ronen contou ao Vermelho que o circulo social que ele frequenta é formado por pessoas solidárias à causa palestina, contudo, no bairro onde mora, a maioria pensa de maneira bem diferente. “Tenho várias acusações contra mim, estou sendo submetido a vários julgamentos e já passei alguns dias na prisão por participar dos protestos de apoio aos palestinos”, disse o ativista israelense.

Segundo ele, seus pais já praticavam esse tipo de solidariedade e quando foi morar em Tel Aviv conheceu jovens que estavam na militância política a favor da causa palestina e foi a convite deste grupo de amigos que Ronen veio a primeira vez à Cisjordânia. “Quando cheguei, senti que tinha um compromisso aqui, então venho cumprindo sistematicamente o meu dever”, afirmou.

“É muito difícil se aproximar das pessoas com um discurso diferente do discurso do Estado, porque este controla não somente a mídia, mas também o sistema educacional. Ou seja, desde cedo as crianças são orientadas para que entrem no serviço militar e defendam Israel das provocações palestinas”, comentou.

Ronen não acredita em uma solução em curto prazo para o conflito, por isso ele optou por exercer uma política prática de militar em favor dos palestinos e de construir alianças muito pontuais, entendendo que “a luta se faz a cada dia” em uma perspectiva de longo prazo.

De acordo com o ativista, um dos principais problemas é que o governo israelense coloca os cidadãos de seu próprio país como “reféns do medo” e com todas as políticas de “segurança” fica muito mais difícil abordar uma mudança de mentalidade. Ronen também falou que as pessoas são incapazes de associar os problemas que a sociedade israelense vem enfrentando – ele citou as dificuldades econômicas como exemplo – com os gastos militares da ocupação.

Fotos: Théa Rodrigues/ Portal Vermelho