Cultura maia: três milênios de resistência 

“Para os mexicanos há uma continuidade do tempo. A colonização não é como para nós, que fomos descobertos em 1.500. Eles vivem a cultura maia até hoje”. Para Afonso Luz, diretor do Museu da Cidade de São Paulo, no Brasil tivemos que “forçar toda uma visão de mundo ocidental”, enquanto, para os mexicanos, a história correu de forma diferente. “Eles não são tão dependentes do ocidente e mantem até hoje hábitos e crenças dos antigos maias." 

Cultura Maia - Foto: Mariane Roccelo/Opera Mundi

A exposição "Mayas – Revelação de um tempo sem fim", em cartaz no pavilhão da Oca, no parque do Ibirapuera, até o dia 24 de agosto, trouxe para São Paulo uma coleção de objetos que remontam o passado das cerca de 30 etnias que constituíam o povo maia. A mostra é uma parceria entre o INA (Instituto Nacional de Antropologia do México) e o Museu da Cidade de São Paulo, responsável pela Oca.

Os maias habitaram o sul do México, desde a região de Chiapas até o norte da América Central, na Guatemala, em Belize, El Salvador e Honduras. No auge dessa civilização, de 250 a.C. a 900 d.C., a população chegou a ter milhões de habitantes, com língua e expressividade próprias.

Em 2012, a “profecia Maia” atraiu milhares de turistas para o México, no chamado “turismo apocalíptico”, graças às interpretações do seu calendário – uma roda calendárica com 18.980 dias, composta por ciclos de 260 (Tzol’in) e 365 dias (Haab) – que estabeleciam que no dia 21 de dezembro de 2012 ocorreriam eventos catastróficos que resultariam no fim do mundo. Entretanto, os maias interpretavam a morte de forma diferente das culturas ocidentais derivadas da colonização europeia. Segundo Afonso, eles tinham “uma visão muito cosmológica do tempo, em que todos os ciclos se completam, e um círculo volta ao outro. A morte não é uma ruptura com a vida, ela é um estado da vida“.

Uma das heranças que permanecem forte ainda hoje entre os mexicanos é a “consulta aos mortos” em algumas aldeias do país. Camponeses que habitam a região mexicana de Lacandona, em Chiapas, e o norte da Guatemala, mantêm vivo esse costume. “A gente tem hoje populações que tiram os ossos do antepassado e conversam com esses ossos para tomar decisões a respeito do cotidiano da vida, como no casamento de uma filha”.

Apesar de ter ocorrido uma mistura cultural com o cristianismo, ainda hoje mulheres tecem trajes típicos maias, além de produzir utensílios de barro para uso pessoal e venda turística. O grande respeito à natureza, típico das culturas de povos originários da América Latina, é expresso em rituais que acompanham atividades do dia-a-dia, desde tarefas agrícolas à corte de árvores para subsistência.

Se para os maias a morte é apenas um “estado da vida” e a passagem de um ciclo para outro, para os povos que herdaram essa crença, a sobrevivência dessa cultura comprova os dizeres de seus ancestrais. Segundo Afonso, “há regiões no sul, como Chiapas, que reivindicam uma continuidade maia, onde ainda hoje se fala a língua maia. Não se escreve como eles, mas ainda existe uma continuidade fonética da linguagem”.

Os maias possuíam linguagem escrita e tinham a tradição de registrar eventos singulares e do cotidiano. “Eles tinham consciência de que estavam fazendo história. É muito curioso porque a gente tem documentos históricos de uma civilização, que foram produzidos por ela mesma”, diz Afonso, ressaltando a importância da escrita da época.

No meio da década de 90, camponeses de origem maia que habitavam a região de Lacandona entraram para a guerrilha zapatista EZLN. O próprio líder do EZLN, o subcomandante Marcos, seguia a tradição religiosa maia em seus discursos políticos.

Apesar do domínio espanhol da região por volta de 1.500, parte da cultura maia sobrevive no mundo contemporâneo. Para Afonso Luz, “há uma América toda hoje indígena, que está sendo redescoberta”. Em junho deste ano, São Paulo recebeu pela primeira vez o ano novo andino. A atenção para as culturas originárias das Américas vem crescendo nos últimos anos. “Mesmo no Brasil, as pessoas vão para internet e colocam lá o sobrenome Guarani Kaiowá, defendem a causa dos índios, contra o extermínio e o conflito de terras”, diz.

Informações:
Local: Oca Ibirapuera – Av. Pedro Álvares Cabral – Portão 3
Preço: Entrada franca
Horário de Funcionamento: Terça a domingo, das 9h às 17h
E-mail: museudacidade@prefeitura.sp.gov.br 

Fonte: Ópera Mundi