Felipe Marra Mendonça: Os ouvidos indiscretos da tevê

A teletela tão bem descrita como parte da vigilância constante mostrada por George Orwell em 1984 parece ter se tornado realidade, mesmo que com três décadas de atraso. O site Daily Beast revelou que entre os dispositivos da política de privacidade da linha de televisores SmartTV, da coreana Samsung, consta uma frase indicadora de que o aparelho faz mais do que simplesmente aceitar comandos de voz.

Por Felipe Marra Mendonça*, na Carta Capital

Os ouvidos indiscretos da tevê

“Por favor, saiba que, se suas palavras contiverem informações pessoais ou sensíveis, essa mesma informação estará entre os dados capturados e transmitidos para terceiros”, diz o texto.

Isso quer dizer, resumidamente, que o melhor a fazer é pedir somente para mudar de canal ou dizer qual é o programa procurado e não falar absolutamente mais nada diante do aparelho. É importante ressaltar que a “escuta” só é ativada mediante um botão, mas mesmo assim nada garante que um hacker competente não consiga invadir a tevê e fazer dela uma espécie de microfone para o que acontece dentro de casa, como bem descrito pelo mesmo Daily Beast.

Em resposta, a Samsung garantiu que defende a privacidade de seus consumidores, incluindo salvaguardas como a criptografia para assegurar a inviolabilidade dos dados dos usuários, além de não permitir a coleta ou o uso indevido dos dados obtidos. Disse também que o dono da televisão pode desconectar o aparelho da internet, se assim o desejar. É uma solução rápida para o problema, mas também tira o elemento “smart” do aparelho em uma tacada só.

O caso lembra outro semelhante ocorrido em 2013, quando televisores da LG continuavam a coletar dados sobre os hábitos de seus donos, mesmo depois de os mesmos desligarem o monitoramento nos ajustes do aparelho. A companhia garantiu que o monitoramento era feito simplesmente para sugerir recomendações com base no que os usuários gostavam de assistir, sem outro objetivo.

De qualquer maneira, a controvérsia sobre o reconhecimento de voz abre uma discussão maior sobre a conectividade cada vez mais ampla dos aparelhos usados no dia a dia. É, certamente, um mundo mais confortável, mas a invasão de privacidade que o acompanha talvez seja um preço alto demais a ser pago.

*Felipe Marra Mendonça é colunista.