Dandara Lima: Não há concessões na disputa ideológica

Não consigo entender o espanto dos companheiros de esquerda com o poder de fogo da Rede Globo neste último domingo (15). A emissora em breve completará 50 anos. São 50 anos a serviço do imperialismo e da opressão às minorias, e não conquistou seu lugar como a principal emissora do país sendo ingênua.

Por Dandara Lima*, no portal da UJS

Capas de jornal O Globo em 1964 e 2015 - Reprodução

Aos poucos a Globo vem se apropriando, muito de leve, das nossas pautas de luta nos seus produtos. Relacionamentos LGBTTs vêm ganhando espaço não porque seus executivos e produtores são progressistas, mas porque não dá mais para ignorar esse grupo. Colocar três personagens femininos fortes como protagonistas, entre eles uma mulher negra, na nova novela principal também.

A Globo reservou o domingo para exaltar a marcha conservadora, frisando que era um ato de “família”, ato de fundamentalistas contra a “ditadura gayzista”, a favor da redução da maioridade penal, de intervenção militar, contra programas sociais, e até mesmo contra a lei de feminicídio.
A emissora não enfrentou a família tradicional brasileira nessa segunda-feira (16) [ao exibir um beijo gay entre duas personagens idosas], ela defendeu seus interesses de mercado, já que vem perdendo audiência.

A emissora surgiu quando a Ditadura Militar completava um ano e serviu como um forte aparato ideológico daquele regime, após a redemocratização continuou a serviço da elite dominante.

Fazemos o possível e o impossível para desconstruir o discurso golpista da linha editorial dessa emissora, fazemos campanha e disputamos espaço nas redes para no mesmo dia aplaudi-la?
E isso se estende para outros veículos do PIG (Partido da Imprensa Golpista). Não podemos partir para o enfrentamento quando o PIG nos desagrada e bater palmas quando fazem algo que aprovamos.

Assumir a bandeira da Democratização da Mídia é se posicionar em uma guerra ideológica e, além disso, se posicionar do lado desfalcado da trincheira.

Somos o lado desfalcado da trincheira porque a população ainda enxerga o PIG como defensor da liberdade de expressão, e nós como censores quando tentamos dialogar sobre Democratização da Mídia (diálogo este que não recebe apoio governo federal, é importante ressaltar).

Confiamos demais no contraponto que podemos fazer na internet, e esquecemos que esse contraponto não atinge todo o país. O ideal seria uma TV estatal forte, tanto em informação quanto em entretenimento.

É muito conveniente o principal produto da Rede Globo, a “novela das 9”, trazer parcialmente algumas pautas progressistas no atual momento do país. E de acordo com a própria emissora, essa novela foi especialmente preparada para coincidir com o seu cinquentenário. E na sua estreia ela mostrou que consegue mobilizar os dois lados.

Outros veículos do PIG também conseguem essa mobilização. Jornais como Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo contam com colunistas progressistas para poderem vender a imagem de plurais. E por falar neles, Folha, Estado e O Globo amanheceram nesta segunda-feira (16) comparando a manifestação do dia 15 com as Diretas Já. Inclusive a Globonews, durante sua cobertura ao vivo, teve a capacidade de questionar o número de manifestantes nas Diretas e afirmar que o dia 15 foi maior.

As capas desses jornais nessa segunda-feira (16) eram assustadoramente semelhantes às de 1964. Nós perdemos a disputa ideológica em 1964, perdemos (e feio) em 2013, e não podemos perder em 2015.

A campanha do ódio que estamos enfrentando foi cuidadosamente preparada por esses veículos, e não podemos, nem por um segundo, nos esquecer disso.

Representatividade importa, e muito! No entanto, como minoria, não vou aceitar ver as minhas bandeiras de luta sendo usadas por essa emissora golpista.

*Jornalista, integra a equipe de comunicação da UJS