CPI do Carf colhe informações para avançar nas investigações

O presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), Carlos Barreto, afirmou nesta terça-feira (2) à CPI criada pelo Senado para apurar suspeitas de manipulação de julgamentos realizados pelo órgão que o Ministério da Fazenda está orientando uma “reestruturação” no conselho a fim de impedir novos desvios. Segundo Barreto, que era secretário da Receita Federal até o ano passado, o suposto esquema criminoso investigado pela Polícia Federal é uma “anormalidade”.

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No fim de março, a Polícia Federal deflagrou uma operação para desarticular um suposto esquema criminoso que envolveria ao menos 70 empresas dos ramos bancário, siderúrgico, automobilístico e da construção civil.

Estamos tratando [o suposto esquema] de anormalidade. E, como anormalidade, precisa ser corrigido. Mas não é da vocação, nesses 90 anos de Carf, que isso seja uma prática corriqueira, uma prática comum. Estamos diante de uma anormalidade que precisa ser apurada com todo rigor.”

As investigações da Operação Zelotes apontam que conselheiros suspeitos de integrar o esquema criminoso passavam informações privilegiadas de dentro do Carf para escritórios de assessoria, consultoria ou advocacia. Esses escritórios, de acordo com os investigadores, procuravam empresas multadas pela Receita Federal e prometiam controlar o resultado dos julgamentos dos recursos. Pelo menos 24 conselheiros, ex-conselheiros, advogados e lobistas são investigados pela PF.

“Ainda não temos conhecimento de todos os fatos, de toda a investigação. Isso ainda está em segredo de Justiça, e o pouco que sabemos deve ser o que saiu na imprensa. Esses fatos nos deixaram bastante estarrecidos com esse desvio ocorrido dentro da instituição”, disse Barreto. “Conhecendo fragilidades que levaram, que possibiltiaram os desvios, o Ministério da Fazenda tem orientado uma reestruturação do Carf no sentido de que essas atividades tenham maior segurança jurídica e impossibilitem novos desvios”, afirmou.

Segundo o presidente do Carf, a reestruturação do órgão, com uma área específica para a gestão dos processos, proporcionará uma melhoria no funcionamento da instituição. Ele explicou que, atualmente, o Carf tem cerca de 110 mil processos em discussão entre o contribuinte e a administração tributária, “o que, todos sabem, envolve algo em torno de R$ 550 bilhões”, estimou.

Barreto explicou que, por orientação do Ministério da Fazenda, haverá uma área específica no Carf para fazer a gestão e a distribuição dos processos em análise. Assim, as câmaras de julgamento deixam de ser responsáveis pelos sorteios, de modo a minimizar risco de eventuais interferências na distribuição, explicou.

Relatoria

Segundo a relatora, senadora Vanessa Grazziotin “hoje recolhemos informações fundamentais para avançar nas investigações, ajudar a PF e o MP e também para a construção de uma nova legislação”.

“Os depoimentos que a CPI do CARF ouviu nesta terça mostram a gravidade e a amplitude dos crimes detectados pelas investigações, segundo a PF foram verificados crimes de advocacia administrativa, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e corrupção” destacou a senadora.

O Carf é a última instância de recursos de processos administrativos que envolvem tributos federais administrados pela Receita Federal. Isso significa que o órgão pode, inclusive, anular multas aplicadas a empresas.

A Polícia Federal aponta que, além de promover tráfico de influência, o grupo investigado corrompia conselheiros envolvidos com o julgamento dessas multas e manipulava o andamento dos processos, com a venda de pedidos de vista ou alteração da pauta de julgamentos.

Muitas dessas consultorias, ainda conforme as investigações, tinham como sócios conselheiros e ex-conselheiros do Carf. A PF suspeita que, em troca dessas facilidades, empresas multadas pagavam propina. Segundo os investigadores, boa parte dos supostos honorários pagos pelas empresas a título de consultoria era, na verdade, repasse de propina.

De acordo com as investigações da Operação Zelotes, a quadrilha que atuava no Carf pode ter gerado um prejuízo de R$ 19 bilhões à Receita Federal a partir da anulação ou redução indevida de multas aplicadas pelo órgão, dos quais R$ 5,7 bilhões estão comprovados.

Para o presidente do Carf, o suposto esquema criminoso não é algo “corriqueiro” nos 90 anos em que o conselho atua e é tratado pela direção do órgão como uma “anormalidade”.

“Estamos tratando [o suposto esquema] de anormalidade. E, como anormalidade, precisa ser corrigido. Mas não é da vocação, nesses 90 anos de Carf, que isso seja uma prática corriqueira, uma prática comum. Estamos diante de uma anormalidade que precisa ser apurada com todo rigor”, afirmou.

Durante a sessão da CPI, o procurador da República Frederico de Carvalho Paiva, que coordena a força-tarefa que apura as supostas irregularidades no julgamento administrativo de processos fiscais pelo Carf, afirmou que a atuação do órgão identificada pelas investigações é “anacrônica, ineficiente e nem um pouco transparente”.