Escalada belicista agita Turquia
O massacre de 32 pessoas em Suruç, os bombardeamentos turcos no Iraque e na Síria, e a cedência da base aérea de Incirlik aos EUA fazem temer uma escala da guerra na região.
Publicado 30/07/2015 09:52
O massacre de Suruç é uma forma de impor aos povos da Turquia os planos de exploração do imperialismo e até mesmo de os empurrar para a guerra. Quem o afirma é o Conselho Mundial da Paz (CMP), num documento em que condena o massacre cometido pelo grupo extremista autodesignado Estado Islâmico (EI) na cidade de Suruç, na Turquia, no dia 20 de julho, que provocou a morte de 32 pessoas e centenas de feridos.
As vítimas, jovens pacifistas e progressistas da Turquia, planejavam participar nas obras de reconstrução da cidade síria de Kobane (Ain Al Arab), seriamente danificada pelos ataques do EI.
No documento, divulgado em Atenas na quinta-feira (23), o CMP manifesta a sua solidariedade para com o povo turco e condena duramente a “organização reacionária, fascista e terrorista EI, mas também os países imperialistas, nomeadamente os EUA e a União Europeia, que a criou, juntamente com os regimes reacionários do Oriente Médio que lhe fornecem armas e dinheiro”.
Na verdade, sublinha o CMP, o EI ora serve de “instrumento do imperialismo contra os povos da região, como aconteceu na Síria”, ora é apresentado pelos mesmos imperialistas como um “pretexto para legitimar a intervenção direta ou bombardeamentos, como sucedeu em regiões curdas do Iraque e da Síria”. O mesmo se aplica ao governo turco, na opinião do CMP, que acusa o executivo de Ancara de “anteriormente viver em simbiose com o EI” e considera o massacre de Suruç o “resultado direto da política belicista” turca. O EI tornou-se também um fator de desestabilização da Turquia, afirma-se no documento.
Manifestando a sua “profunda preocupação com o futuro próximo da região”, o Conselho Mundial da Paz faz notar que os “ataques assassinos intensificam as tensões existentes na Turquia” e empurram este país para os conflitos na Síria.
Ofensiva turca
A Turquia lançou entretanto duas “ofensivas antiterroristas” contra posições do EI na vizinha Síria e do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) no Norte do Iraque, a pretexto do massacre de Suruç e de posteriores ataques separados na fronteira comum que provocaram baixas entre os militares turcos, atribuídos às duas organizações. Em declarações à imprensa, citadas pela Lusa, o primeiro-ministro Ahmet Davutoglu afirmou que os bombardeamentos aéreos em curso podem “mudar o equilíbrio” da região.
O ataque ao PKK, acompanhado da prisão de dezenas de ativistas curdos por toda a Turquia, ocorre numa altura em que Ancara continua a debater-se com dificuldades para formar um governo de coligação. Nas eleições de 7 de junho, recorda-se, o Partido Democrático dos Povos (HDP), um partido pró-curdo e de esquerda, obteve 13 por cento de votos e elegeu 80 deputados, um resultado decisivo para retirar a maioria absoluta que o AKP detinha desde 2002.
Ao colocar no mesmo plano os ataques ao EI e ao PKK, as autoridades de Ancara dão sinal, como afirmou no início da semana o chefe da diplomacia turca, Mevlüt Çavusoglu, em entrevista à Lusa, da sua intenção de participar “de forma ativa” no conflito regional. Em aparente contradição com as declarações do primeiro-ministro, Çavusoglu diz que os “ataques aéreos não são suficientes” para travar o EI e “muito menos erradicá-lo”, pelo que a Turquia estará disponível para participar numa coligação internacional “caso exista uma estratégia global”.
Para já, a Turquia deu luz verde aos Estados Unidos para usarem a base aérea de Incirlik, próxima da Síria para, alegadamente, bombardearem o Estado Islâmico. O acordo para o uso da base surge após meses de difíceis negociações entre representantes turcos e norte-americanos. Na entrevista à Lusa, para além de garantir que a Turquia vai juntar-se de forma ativa aos ataques aéreos e no combate ao EI, o ministro dos Negócios Estrangeiros turco justifica a cedência da base como forma de abrir caminho à “estratégia global”. “Se alguns países da região e da coligação [internacional] se juntarem decidiremos em conjunto, e no futuro haverá uma muito melhor estratégia para combater o EI”.